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Deputados cearenses apoiam a anistia aos golpistas (Foto: Reprodução/Instagram) |
O presidente da Câmara, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), tem dado sinalizações de que o tema não é prioridade. A posição tem feito aliados de Bolsonaro se mobilizarem, obstruindo trabalhos em comissões temáticas em temas diversos e articulando com outros deputados para garantir o número mínimo de assinaturas (257) para pedir urgência do texto. Movimentos recentes reacenderam o debate sobre a viabilidade do projeto. Última atualização de líderes da oposição aponta que o número foi atingido e que pelo menos 259 assinaturas foram recolhidas, sendo oito de parlamentares cearenses.
Dados do Portal da Câmara dos Deputados mostram que, pelo menos, sete projetos de anistia foram protocolados e estão apensados ao PL 2858/22. O texto, de autoria do ex-deputado federal Major Vitor Hugo (PL-GO), inicialmente previa anistiar quem participou de atos após a derrota eleitoral de Bolsonaro para o então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), à época ocorriam protestos em rodovias e em frente a quartéis do Exército. Entretanto, mudanças no texto incluíram também os manifestantes do 8 de janeiro.
Neste ano, duas manifestações convocadas por Bolsonaro, uma no Rio de Janeiro e outra em São Paulo, tiveram a anistia no centro da pauta e contaram com a presença do ex-mandatário. Embora tivessem a temática pela anistia, o tom eleitoral também esteve presente nos discursos de Bolsonaro que, mesmo inelegível, ainda se nega a apontar apadrinhados. O POVO ouviu especialistas sobre os motivos que levaram a essas mobilizações e sobre as chances que a anistia tem de sair do papel.
Fernandes Neto, advogado e especialista em Direito Eleitoral e Constitucional, entende que o momento político no Brasil é pouco propício à anistia. "Principalmente daqueles que realizaram tentativa de golpe, depredação e abolição do Estado Democrático. Talvez não seja politicamente viável, mas ocorre porque é uma pauta de união do bolsonarismo”, diz.
Neto destaca ainda uma dupla finalidade do atual PL da anistia: “Ele tenta prenunciar uma possível anistia a Bolsonaro e a outros que se tornaram réus no Supremo Tribunal Federal (STF) por tentativa de golpe. Então, tem suas finalidades, a da união política (mobilização) desse grupo e a de possibilitar, a partir do Congresso, uma anistia a Bolsonaro e aliados, como ocorreu em 1964 para militares que exerceram o poder à força, a ferro e fogo”.
O advogado diferencia a atual cobrança por anistia da concedida à época da Ditadura Militar e que englobou tanto opositores, quanto militares que praticaram perseguições. “Não há como comparar com a anistia que é requerida agora, visto que são fatos e situações distantes e distintos”, argumenta.
Ele aponta uma correlação de causa e efeito: “A anistia pretendida agora é consequência daquela dada antes. O movimento atual deve-se muito ao fato da anistia concedida na ditadura não levar culpados a pagarem. A opção histórica da anistia de 1964 teve influência direta na repetição da tentativa de golpe em 2022”.
Já Paula Vieira, cientista política vinculada ao Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia da Universidade Federal do Ceará, (Lepem-UFC), destaca a escolha de Bolsonaro por não se dissociar das mobilizações pró-anistia, mesmo após tornar-se réu no STF por suspeita de participação em uma trama golpista.
“É curioso ele não buscar uma estratégia de dissociação daqueles acusados de tentativa de golpe e de optar por seguir nessa busca por anistia. Ele faz isso, também, para utilizar o movimento como forma de continuar como liderança e porque confronta o STF e os critérios de Justiça. Está buscando reforçar-se como ‘antissistema’, uma parte da identidade bolsonarista. Se ele optasse por se dissociar, talvez perdesse capacidade de mobilização”.
Sobre os atos de rua, a professora destaca que são uma forma de manter a polarização nas bases do bolsonarismo. “Toda mobilização dos atos foi feita por Bolsonaro e seus aliados, não há separação de movimentos pró-anistia e do bolsonarismo. Essas duas pautas andam lado a lado. Quem são os líderes do movimento de anistia? É um ato pró-Bolsonaro, que pretende manter a mobilização desses possíveis aliados e eleitores”, completa.
Para
os especialistas ouvidos pela reportagem, a pauta, portanto, tornou-se uma
forma de teste de força do ex-mandatário nas ruas, mas também no Congresso.
Hugo Motta manifestou-se solidário com relação a penas mais duras determinadas
pelo STF, mas não sinaliza que não pautará o texto.
O que dizem os deputados cearenses
André Figueiredo (PDT)
Presidente nacional interino do PDT, o deputado disse ao O POVO que sua posição pessoal é de que o projeto não deveria, sequer, ser pautado. "Não é momento de entrarmos em projetos que gerem divisão na Casa. Temos que nos atentar, inclusive saímos há pouco de uma reunião sobre a PEC da Segurança Pública, temos outros temas muito importantes".
Sobre a anistia em si, afirmou: "Crimes contra a democracia, do jeito que foi feito naquele fatídico 8 de janeiro, precisam ser exemplarmente punidos. Anistia, da maneira como está proposta, nós somos contrários".
Matheus Noronha (PL)
Deputado em primeiro mandato, Noronha disse ser a favor da anistia pleiteada pela oposição. Seu nome aparece na lista dos que assinaram o pedido de urgência.
"Principalmente pela desproporcionalidade das penas com casos parecidos. A anistia seria um modo de corrigir injustiças e os exageros do caso em questão. Acho que (os envolvidos) já pagaram o que tinham que pagar". Sobre o andamento da pauta na Casa, o parlamentar disse ao O POVO: "Se a matéria for pautada na Câmara dos Deputados, ela será aprovada. A maioria é a favor".
José Guimarães (PT)
O líder do governo Lula na Câmara dos Deputados escreveu recentemente nas redes sociais que a tentativa de pautar a anistia "enfraqueceu de vez". Guimarães destacou pesquisa DataFolha que mostrou que 67% da população prefere que Bolsonaro abra mão da candidatura em 2026 e aponte outro nome para a disputa.
"Esse resultado demonstra que a população quer a democracia como regime civilizatório e quem praticou crimes contra o Estado democrático de direito deve prestar contas à justiça e ser punido com o rigor da lei. Esse parece ser o recado. Sem anistia!", pontuou.
Dr. Jaziel (PL)
Aliado do ex-presidente, Dr Jaziel esteve presente em ato pró-anistia na Avenida Paulista, em São Paulo neste mês. "Ao ver o tamanho dessa manifestação, tenho absoluta certeza: o presente pode até ser deles, mas o futuro é nosso. Anistia já!", escreveu em defesa da pauta.
André Fernandes (PL)
O deputado também acompanhou Bolsonaro no ato da Paulista. Ele publicou vídeos e fotos no trio que o ex-presidente estava. "Fico feliz porque o Brasil está tendo oportunidade de acompanhar pessoas tentando transformar estilingue, bolinha de gude, algodão-doce, Bíblia e batom em tentativa de golpe", escreveu. Ele também assinou pedido de urgência.
José Airton (PT)
Deputado tem demonstrado ser contra o projeto. Em vídeos e publicações, ele tem criticado o avanço da pauta. "Foi um atendo contra a democracia brasileira, contra as instituições. Por isso, nós não concordamos com a anistia", disse.
O que diz o projeto?
1 A anistia é prevista no Código Penal brasileiro, sendo uma forma de extinção da punibilidade de um crime. Na prática, é a concessão de um perdão a um delito cometido por um brasileiro ou grupo de brasileiros
2 No caso do projeto, a anistia perdoaria quem praticou crimes políticos ou eleitorais, sendo manifestantes, caminhoneiros, empresários e todos os que tenham participado de manifestações nas rodovias nacionais ou em frente a unidades militares ou em qualquer lugar do território nacional do dia 30 de outubro de 2022 até a data em que a lei entrar em vigor
3 O texto original também perdoa multas relacionadas às condenações de quem participou do 8 de Janeiro. Concederia também anistia para quem ajudou no financiamento, organização ou apoio de qualquer natureza aos atos. Quem fez publicações de endosso nas redes sociais ganharia também
4 O projeto está travado desde o fim de outubro de 2024, porque horas da votação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), o então presidente da Câmara, Arthur Lira (PP), definiu que o projeto deveria ser encaminhado para outras comissões
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Na prática, Lira travou o projeto. Isso porque o regimento da Câmara prevê que
proposições destinadas a mais de cinco comissões devem ser analisadas por uma
comissão especial a ser formada para a ocasião. A comissão especial nunca foi
instalada e o projeto estava parado
Publicado
originalmente no O Povo+
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