6 de março de 2025

"Ainda estou aqui" traz esperança para familiares de vítimas da ditadura

Família Paiva em imagem de arquivo pessoal na década de 1970

Com o impacto causado pelo longa "Ainda estou aqui", reconhecido na conquista do Oscar de Melhor Filme Internacional, familiares de desaparecidos na ditadura militar contam ao Correio sobre a expectativa de verem avanços na luta para provar a responsabilidade do Estado na morte de seus entes queridos.

A retificação das certidões de óbitos dos desaparecidos políticos está entre as principais ações em curso na Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, ligada ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.

Representante dos familiares na comissão, Diva Santana afirma que estão previstas para serem entregues 334 certidões retificadas. Ainda não foi decidido se serão realizadas cerimônias nos estados para a entrega dos documentos ou um grande evento em Brasília. Também não há previsão de quando deve ocorrer, pois os cartórios de todo o país precisam fazer os trâmites.

Diva luta pelo reconhecimento das mortes da irmã, Dinaelza Santana, e do cunhado, Vandick Pereira, que integravam a Guerrilha do Araguaia — movimento contrário à ditadura, que ocorreu na região amazônica entre 1960 e 1970. O casal foi visto pela última vez em 1973.

"Acho que o filme trouxe luz às mentes e corações do povo brasileiro de que, num passado bem recente, houve repressão ao ponto de prender, executar e ocultar cadáver. O filme não diz isso, mas ele mexe com a cabeça das pessoas, provoca toda uma discussão que está acontecendo", declara a ativista, que atua desde a adolescência na causa.

Ela também relembra a sensação que reviveu ao assistir às cenas: "Na minha cabeça, passava um outro filme, aquele isolamento da família, que nós vivemos. O isolamento das pessoas terem medo de se aproximar da gente, por medo da repressão".

Para Léo Alves, a vitória do filme no Oscar relembrou a história da avó Dilma Borges. "Olhando ali naquele momento, senti como se fosse a minha própria avó recebendo um prêmio. Minha avó era como Eunice (Paiva), uma esposa na busca incansável pelo marido", contou. Mario Alves, jornalista e dirigente do Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR), foi preso em 1970, no Rio de Janeiro.

"Esse prêmio e tudo o que o filme vem angariando, acho que deve ser a ferramenta de disputa de memória mais poderosa que já tivemos desde sempre. Não é estatístico, mas a gente vê que começa a reverberar até nas instituições", avaliou o neto de Mario Alves. Ele também relembrou que a mãe e a avó se mudaram 40 vezes para fugir das perseguições políticas.

Lula e Walter Salles

Na terça-feira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ligou para o diretor do filme, Walter Salles, para parabenizá-lo pelo Oscar. "Querido Walter, a gente não tem muito o que falar quando percebe que um brasileiro é capaz de se superar numa arte que, até então, me parece que só americano ganhava. Então, eu quero te dizer que foi uma noite de ouro", afirmou. "Acho que você já fez outras coisas muito importantes, mas, desta vez, você conseguiu lavar a alma do povo brasileiro e do cinema brasileiro e recuperar, de uma forma muito, mas muito importante, a história do Rubens Paiva."

Lula prosseguiu: "Você conseguiu dar a seriedade e a leveza necessárias ao comportamento da Fernanda Torres para representar a Eunice Paiva".

O chefe do Executivo também convidou a equipe do filme para comemorar a vitória do Oscar. Ao Correio, a assessoria da Presidência afirmou que ainda não há data prevista para o encontro ocorrer em Brasília.

Publicado originalmente no Correio Braziliense

Leia também:

Fernanda Torres atuou como "embaixadora da cultura brasileira", diz especialista

Nenhum comentário:

Postar um comentário

A Administração do Blog de Altaneira recomenda:
Leia a postagem antes de comentar;
É livre a manifestação do pensamento desde que não abuse ou desvirtuem os objetivos do Blog.