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27 de outubro de 2024

É o que temos para hoje, por Jocélio Leal

André Fernandes (PL) e Evandro Leitão (PT) são os candidatos no segundo turno das eleições municipais de 2024 em Fortaleza (Foto: Reprodução/Jornal O Povo)

É hoje. Toda a minutagem de rádio, TV e rede social, todas as linhas escritas para demonstrar prós e contras de lado a lado, todas as ideias ao vento da campanha neste segundo turno e, sobretudo, todo o vazio de ideias revolucionárias para as demandas da quarta maior capital do País serão postas à prova a partir das 8 da manhã, com encerramento às 17 horas. André Fernandes (PL) e Evandro Leitão (PT) os dois mais bem votados no primeiro turno estão longe de ser aquilo que a Cidade clama como respostas para uma agenda tão complexa. Mas foi o que a Cidade escolheu. E é olhando para estes dois nomes que Fortaleza precisa ir às urnas de maneira racional. Assim, a Coluna propõe ao (e)leitor examinar o pacote que cada um deles carrega, embora nem sempre exiba.

André Fernandes (PL)

O garoto de Iguatu, notório como produtor (e produto) de vídeos para redes sociais, decerto, não imaginava ir tão longe. Caso fosse um projeto político, as marmotas cometidas talvez nunca tivessem acontecido. E o tutorial da depilação íntima sobre um espelho não haveria. Ou ainda a cena infeliz de esfaquear uma caixa como se o papelão fosse uma mulher. Um papelão. Ou ainda tantas outras traquinagens de adolescente em busca de curtidas.

André é filho desse meio, um universo alheio ao público adulto médio, saudosista de LP, cassete e CD. Um público para quem a vida real da Cidade começou há muito tempo, quando ainda pegava (e/ou ainda pega ônibus lotado), trafegava de bicicleta sem ciclovia ou ciclofaixa, penava na antiga Assistência Municipal e ainda pena no IJF também lotado, lida com o lixo nas calçadas, por falta de um sistema mais ousado e de educação, ou ainda que, não sendo de classe média para cima, depende do ensino municipal e quer vê-lo melhorar.

O garoto desenvolto com as palavras não sabe muito bem do que se trata uma fachada ativa (aquilo que nossos edifícios mais altos não têm). Tampouco entende muito de finanças públicas. Alguém o viu falar de modo consistente sobre isso? Qual foi a grande ideia dele para o nosso crítico sistema de transporte? Sobre educação, falou em uma "reformulação do sistema educacional" e citou parcerias com universidades e centros de pesquisa para "fomentar a inovação e a transferência de tecnologia", dentre outras respostas de laboratório.

A seu favor, o talento para se comunicar e encarnar o papel do enfant terrible. Aquele capaz de encarnar o contraponto a um grupo pego no contrapé. Ao mirar na irreverência de Fortaleza e ao abarcar um contingente importante de quem não está muito interessado no conteúdo, mas na forma, chegou lá. Para não sair da personagem, deixou Bolsonaro e Waldemar da Costa Neto à distância.

Evandro Leitão (PT)

O candidato do PT é um neopetista. Até hoje ainda soa estranho vê-lo falar o vocábulo "companheiros". Ou mesmo fazer o L. É aquela mesma imagem esquisita de Ilo Neto (no Iguatu), Aníbal Filho (em Granja), Julinho (em Maracanaú) e tantos outros aderentes ao poder de convencimento de Camilo Santana.

Lá nos primórdios, Evandro se tornou uma figura pública focada apenas em um público, a torcida do Ceará Sporting Club. Foi do Porangabuçu, presidente de 2008 a 2015, que ele voou para a Assembleia. Primeiro perdeu, virou secretário do Trabalho no Governo Cid Gomes e depois se elegeu folgadamente. Aliás, nada mais abjeto do que patrulha de candidato pelo time de futebol. Virtudes e limitações de Evandro independem do clube.

Evandro ganhou a confiança de Camilo, foi líder do Governo na Assembleia e chegou a presidente. Conseguiu unanimidade. E isto é virtude e pecado ao mesmo tempo. Quem tem é porque tem habilidade. Mostra que consegue trafegar, ouvir, ceder. Mas também pouca disposição para rupturas com o que está posto. E assim foi presidente duas vezes.

Embora do parlamento, parlar não é o forte dele. Suas atitudes erráticas nos debates, aquele momento em que não há edição, deixavam seus apoiadores e correligionários roendo as unhas. Havia um aparente desconforto com o papel de candidato, embora experiente como político de bastidores. Acontece. Na sexta-feira, no último debate, na TV Verdes Mares, até surpreendeu.

Tal qual o oponente, não houve de Evandro qualquer grande ideia para as pautas da Cidade. Na mobilidade urbana, sobre o grave quadro dos motociclistas, o plano fala na intenção de investir na educação dos motociclistas e em uma tal política de convivência e segurança dos usuários e profissionais de motocicletas, como os entregadores de aplicativo. Quanto aos ônibus, indica criar pontos de parada e terminais de transportes públicos mais seguros, acessíveis e acolhedores.

Certamente, contra Evandro pesa enfrentar um jovem de 26 anos que se comunica mais fácil. Incide muito a dificuldade petista de conversar com uma sociedade bem diferente daquela donde foi gerado, uma geração CLT e sindicalizada. Recai enfrentar o discurso da mudança, sendo integrante de grupo tão hegemônico. E, ao mesmo tempo, ajuda ter como oponente um candidato sem aprofundamento nos temas e com histórico tão controverso.

É o que temos para hoje.

Publicada originalmente no portal O Povo +

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