6 de agosto de 2024

No Chile, Lula cobra "diálogo" entre Maduro e oposição

Lula esteve com o presidente do Chile, Gabriel Boric, para uma reunião bilateral (Foto: Ricardo Stuckert)

Em discurso conjunto em Santiago ontem (05/04) ao lado do presidente do Chile, Gabriel Boric, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva falou rapidamente sobre o impasse eleitoral na Venezuela. "Expus [para Boric] as iniciativas que tenho empreendido com os presidentes Gustavo Petro [Colômbia] e Lopez Obrador [México] em relação ao processo político na Venezuela", relatou Lula sobre a reunião com Boric no Palácio de La Moneda esta manhã.

"O respeito pela tolerância, o respeito pela soberania popular é o que nos move a defender a transparência dos resultados. O compromisso com a paz é que nos leva a conclamar as partes ao diálogo e a promover o entendimento entre governo e oposição." 

No início da agenda, pela manhã, Lula foi recebido com a cerimônia de oferenda floral no monumento a Bernardo O'Higgins e depois seguiu ao lado de Boric para o Palácio de La Moneda, a sede do Executivo chileno.

Os presidentes se reuniram de forma privada e, depois, com os ministros de ambos países, ficando cerca de três horas reunidos, no total.

A visita havia sido agendada para maio mas, com as inundações no Rio Grande do Sul, foi cancelada e reagendada para agosto.

O encontro bilateral prevê a assinatura de cerca de 20 acordos e memorandos em várias áreas. Por isso, a comitiva que veio com o presidente brasileiro é grande: 14 ministros estão aqui, além do assessor especial da Presidência, Celso Amorim, que esteve na Venezuela na semana passada.

O Brasil segue em negociações, na tentativa de mediar uma solução para a crise venezuelana, após a anunciada reeleição do presidente Nicolás Maduro sofrer contestações da oposição e de outros países, como Estados Unidos, Argentina e nações da União Europeia.

Segundo um diplomata que atua nas negociações ouvido pela BBC News Brasil, a aposta principal da diplomacia brasileira é a articulação com Colômbia e México para abrir diálogo entre governo e oposição.

Os dois países têm governos de esquerda que mantêm relações com a Venezuela. Com o Brasil, divulgaram na sexta-feira (2/8) uma nota se oferecendo "para apoiar os esforços de diálogo e busca de acordos que beneficiem o povo venezuelano", mas sem detalhar como isso se daria.

A intenção, disse a fonte ouvida pela BBC News Brasil, é promover um encontro de alto nível, entre os chanceleres dessas nações, ou mesmo entre os presidentes. Nesse segundo caso, o encontro poderia ser virtual.

A principal dificuldade, porém, é convencer Maduro a participar desse diálogo, reconhece o diplomata. Já a oposição está mais aberta a negociar.

"É um trabalho longo, não há resposta rápidas", ressalta.

Apesar da resistência de Maduro, o Itamaraty entende que é fundamental manter a posição de equilíbrio, para preservar canal aberto com o governo venezuelano.

Na visão dessa fonte, reconhecer a vitória do candidato da oposição, Edmundo González, como fizeram os Estados Unidos, "não ajuda" a resolver o impasse que se instaurou após a eleição realizada em 28 de julho.

Horas após o término do pleito, o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) anunciou a vitória de Maduro, mas não divulgou as atas eleitorais (resultados por mesa de votação), informação que permitira checar se o saldo geral anunciado estava correto.

Segundo a contagem mais atualizada divulgada pelo CNE, com 96,87% das urnas apuradas, Maduro estava com 51,95% dos votos contra 43,18% de Edmundo González.

Já a oposição fez sua própria contagem, que teria base em atas eleitorais coletadas no fechamento das urnas. Na Venezuela, há impressão desses comprovantes ao final da votação, o que serve para conferir os dados transmitidos ao CNE.

Dizendo ter por base 24.384 boletins de voto, cerca de 81,21% do total de urnas, a oposição afirmou que González venceu com 67% dos votos, contra 30% de Maduro.

Em meio a essa disputa, o governo brasileiro não reconheceu a vitória de Maduro nem as acusações de fraude pela oposição. A postura brasileira tem sido de cobrar pela divulgação das atas detalhadas pelo CNE, assim como México e Colômbia.

O pedido pela transparência dos votos veio primeiro em uma nota oficial do Itamaraty, no dia seguinte ao pleito.

Depois, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva também cobrou as informações.

"É normal que tenha uma briga. Como resolve essa briga? Apresenta a ata", disse Lula em entrevista exclusiva à TV Centro América, afiliada da TV Globo em Mato Grosso, na semana passada.

Já o CNE diz que a demora em divulgar teria sido provocada por ataques hackers ao seu sistema. No entanto, não houve até o momento apresentação de provas desse suposto ataque.

'Sem atas, Brasil não reconhecerá Maduro'

Enquanto importantes países rechaçam a vitória de Maduro, o presidente venezuelando teve sua reeleição reconhecida por grandes potêncais, como China e Rússia, dois fortes aliados do governo da Venezuela. O atual presidente também recebeu apoio de Irã, Turquia e Bolívia.

Segundo o diplomata ouvido pela BBC News Brasil, não há qualquer perspectiva de o Brasil reconhecer a reeleição de Maduro sem apresentação de atas e comprovação do resultado.

Na sua avaliação, caso não haja mudança nesse cenário e Maduro continue no poder, o Brasil deve manter uma relação pragmática com o governo da Venezuela, mesmo sem reconhecer a reeleição, numa relação de "ambiguidade criativa".

A fonte reconhece que hoje há pouca esperança de que as atas serão divulgadas.

"Quanto mais demora, menos você acha que vão entregar", resume.

No mais recente desdobramento nesse tema, Maduro recorreu na sexta-feira (2/8) ao Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) venezuelano solicitando uma auditoria para esclarecer "a verdade" sobre o pleito.

A Corte é vista como aliada do atual governo venezuelano, por isso, a oposição vê o recurso de Maduro como uma tentativa de ganhar tempo e receber uma chancela judicial para sua suposta vitória.

Após o recurso, o TSJ determinou que o CNE envie, no prazo de três dias, as atas de escrutínio das mesas eleitorais a nível nacional, a ata de totalização final do processo eleitoral, a ata de proclamação do resultado, além de evidências do suposto ataque cibernético ao sistema eleitoral.

Brasil assume oficialmente embaixadas de Argentina e Peru

A postura de equílibrio do Brasil tem gerado desgaste para Lula, num cenário em que o governo Maduro desperta fortes críticas de parte do eleitorado brasileiro. Esse desgaste foi intensificado pela nota oficial do PT parabenizando Maduro por sua reeleição.

Apesar disso, diplomatas brasileiros têm insistido na importância de manter o canal aberto com o governo venezuelano, para preservar interesses brasileiros.

"Não interessa ao Brasil ficar sem representação em Caracas, como ocorreu com a Argentina", destaca outra fonte do Itamaraty.

Após a Venezuela romper relações com os governos argentino e peruano, devido às contestações à anunciada vitória de Maduro, o Brasil assumiu a representação diplomática dos dois países em Caracas.

A decisão foi oficializada nesta segunda-feira (5/8), com um comunicado conjunto dos governos de Brasil e Venezuela.

Com isso, o Brasil assume "a custódia dos locais das Missões Diplomáticas da República Argentina e da República do Peru, incluindo seus bens e arquivos, bem como a representação de seus interesses e de seus nacionais em território venezuelano".

Com informações Correio Braziliense

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