O discurso antivacina é o mais ruidoso, audacioso e irresponsável movimento em defesa da morte que o Brasil já conheceu (Foto: Andre Penner) |
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), devolveu o projeto, com o justo argumento de que não cabe ao Poder Legislativo revogar nota técnica do governo. Zanatta recorreu, obteve vitória na CCJ e agora o plenário decidirá sobre o recurso.
Mistura
de obscurantismo com politicagem
Na semana passada, o Senado aprovou o Programa Nacional de Vacinação nas Escolas Públicas. É uma medida para que escolas públicas passem a receber equipes de vacinação. A aprovação foi simbólica, mas houve quatro votos contra.
O Brasil é exemplo para o mundo em tradição vacinal. O Plano Nacional de Imunização (PNI) tem mais de 50 anos. O Sistema Único de Saúde (SUS) é a mais bem concebida política pública dessa abrangência. O País tem um sistema de vacinação sólido resultado do trabalho de gente comprometida, competente e obstinada. E as famílias confiam na vacina porque viram a transformação. Quem conheceu a realidade por volta da década de 1940, antes da disseminação das vacinas, sabe como eram as condições de vida e viu a transformação acontecer. Aquela geração vacinou os filhos e transmitiu a importância daquele momento. Na pandemia de Covid-19, muitos viveram a emoção de levar para vacinar quem os tinha levado na infância.
Nos anos 1940, a mortalidade infantil chegou a atingir 212 a cada mil crianças nascidas. Em 2019, a taxa havia sido reduzida para 14 por mil. A expectativa de vida da população era de 45 anos em 1940. Em 2022, chegou a 75 anos. Não foi só a vacinação, mas ela foi protagonista.
Por dia, mil crianças eram acometidas de paralisia no mundo nas décadas de 1940 a 1960, antes da vacina contra poliomielite. Por dia. O dado é da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas).
Quem viveu o mundo antes da disseminação das vacinas sabe como era comum a morte de crianças. O quanto era recorrente filhos não chegarem à adolescência. A credibilidade das vacinas foi construída salvando vidas. E é maior no Brasil porque muito mais pais perdiam os filhos aqui do que no Reino Unido ou nos Estados Unidos.
A vacina contra Covid-19 foi desenvolvida de forma rápida porque houve esforço internacional sem precedentes. Mas, fases não foram suprimidas. Foi feito tudo que era necessário. E elas seguem sendo aprimoradas.
O antivacinismo é movimento obscurantista importado dos Estados Unidos, numa mistura sinistra de oportunismo, má-fé, ignorância e exploração eleitoreira. Porque muita gente se projeta lá fora. Não é a tradição brasileira. Felizmente, poucos caem na lorota anticiência. Mas, é suficiente para reduzir as coberturas vacinais infantis. Para as várias vacinas, o problema não está só na Covid-19.
O discurso é alarmista leviano, inconsequente. Dissemina o medo. As vacinas são consenso científico — o fato de haver vozes destrambelhadas e isoladas não elimina esse fato, só cria confusão.
Não se vacinar não é um direito individual, porque significa dar o direito de contaminar os outros — as vacinas reduzem muito os riscos, mas nem sempre têm 100% de eficácia. Quanto mais não vacinados houver, maior a brecha para surtos.
O
discurso antivacina é o mais ruidoso, audacioso e irresponsável movimento em
defesa da morte que o Brasil já conheceu. Terá lugar garantido na história — no
esgoto.
Publicado
originalmente no portal O Povo +
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