29 de março de 2024

Bonecos para "Malhação do Judas" em Fortaleza

Opções de Judas enfileirados próximos ao viaduto da Raul Barbosa (Foto: Aurélio Alves)

Quem passa pela rotatória das avenidas Raul Barbosa e General Murilo Borges não deixa de reparar nas roupas grandes, tamanhos diversos, pinturas características e um toque de brincadeira nos bonecos expostos na parte de baixo do viaduto. Estes são usados na tradicional Queima de Judas, no Sábado de Aleluia.

Na Capital, os bonecos ganham tamanhos e formas inusitadas que vão desde personalidades políticas — como Jair Bolsonaro, Lula, Donald Trump, Nestor Cerveró, Sergio Moro, Michel Temer e Alexandre de Moraes — até os famosos “caipiras”.

José do Judas, um dos artesãos que produzem os bonecos, conta que há 23 anos está em sua oficina, localizada na Murilo Borges, e que como material ele usa tecido, madeira parafusada, retalhos finos e arame para o corpo e a cabeça é feita de papel machê. Segundo ele, neste ano o mais vendido é o "Judas" do ex-presidente Bolsonaro.

“A gente faz bonecos de acordo com o que o cliente pede, faz também com a cara dos políticos, faz os caipiras. Eu estou aqui desde a semana passada e fico aqui até o sábado de Aleluia”, relata.

Juan Pedro é outro artesão que fica no local e todos os anos está por lá produzindo os bonecos do Judas. “A gente faz bonecos de todos os estilos, fazemos bonecos personalizados, de acordo com o que o cliente quer. Nós temos vários bonecos encomendados e o que mais estão saindo são os políticos”, contou.

Os preços dos bonecos são a partir de R$ 250 e serão comercializados até o fim da tarde do sábado de aleluia.

Mas, afinal, o que é a Malhação do Judas?

A tradição consiste na queima do boneco que representa o discípulo Judas Iscariotes, que, segundo a tradição cristã, teria entregado Jesus Cristo ao sinédrio por 30 moedas de prata — traição que teria sido selada com um beijo. A malhação do boneco seria uma forma de “vingança” contra Judas.

Conforme o professor de Direito Constitucional Comparado da Universidade Federal do Ceará, Emmanuel Furtado Filho, segundo o folclorista Câmara Cascudo a prática teria origem na península ibérica, tendo chegado ao Brasil desde o período colonial.

Ele conta ainda que o folclorista Ernesto Veiga de Oliveira, que tratou do rito em Portugal — onde é conhecido como “Queima do Judas” —, a personagem e sua queima seriam originárias da celebração de outro fato, um rito de vegetação, tendo, portanto, origem em cultos proto-históricos assimilados pelo Cristianismo.

“A associação do rito à Páscoa cristã teria ocorrido em meados do século XVIII. No Brasil, por exemplo, o rito da 'Malhação de Judas' associado à Páscoa consta em relato do artista plástico francês (Jean-Baptiste) Debret (1768–1848), que participou da missão artística ao Rio de Janeiro, ainda no período de dom João VI”, explica.

Ele conta ainda que existe a análise de Ático Vilas-Boas. Este enxerga o rito como um resíduo folclórico da prática da “punição da efígie”. “Essa penalidade era utilizada pelo Tribunal do Santo Ofício, durante a Inquisição portuguesa. Consistia em queimar em praça pública a representação de um condenado que tivesse morrido antes da aplicação da pena”, ensina.

Furtado fala ainda que, no que diz respeito à simbologia da festa, não é incorreto associá-la a um ritual de remissão do mal na comunidade, a ideia de um recomeço, de renovação.

“O boneco de Judas seria a personificação do mal; em suas origens remotas, o boneco seria representado por uma divindade da vegetação. Por meio do fogo, haveria uma renovação da vida vegetal, o que poderia ensejar numa boa colheita”, complementa.

Com informações portal O Povo +

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