1 de janeiro de 2024

Ressaca moral: o que fazer quando bate a culpa

 Pesquisa revela que ressaca moral é pior do que a ressaca física (Foto: Reprodução/Stock)

Às vezes, a calourada é ótima. O after também. O problema é o dia seguinte, quando a culpa bate. Talvez a pessoa tenha bebido demais e, por causa disso, perdeu um compromisso: faltou a aula de espanhol, se atrasou para o trabalho e por aí vai.

Pode ser até pior. Tem gente que já vomitou em cima do ficante, fez comentários desagradáveis a um amigo, se relacionou sexualmente com alguém que não deveria — é complicado. Mas, enfim, a semelhança entre todos os casos é a culpa no dia seguinte.

O sentimento é popularmente chamado de ressaca moral. “Nada mais é do que a culpa, o julgamento que a própria pessoa tem em relação a ela mesma. Geralmente, depois de ter comportamentos reprováveis, vamos dizer assim. [Comportamentos] que a própria pessoa reprovaria [quando sóbria]”, explica a psicóloga Elisângela Borges.

A ressaca moral tende a ser considerada mais traumática do que a própria ressaca física, de acordo com a pesquisa lançada em julho, “Álcool e a Saúde dos Brasileiros: Panorama 2023”, do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (Cisa). Quase todos os 1.983 participantes do estudo citam as mesmas questões: a vergonha e o dano à imagem e à autoestima. Dados foram

A psicóloga Elisângela acredita que a situação pode, inclusive, causar danos psicológicos “se a pessoa ficar remoendo aquele sentimento ou [se] não conseguir se libertar”. De acordo com ela, a vítima pode desencadear sintomas psicossomáticos: ansiedade, depressão, insônia etc.

“Eu acho que a gente se preocupa mais com a moral mesmo, com os amigos, se eu dei muito vexame”, disse um dos entrevistados aos pesquisadores da Cisa. Ele é um homem com idade entre 18 e 25 anos, de São Paulo, das classes A/B e que faz parte do grupo de consumidores abusivos de álcool. “Particularmente, não penso muito no que vai acontecer com o organismo depois, não. Só a ressaca moral mesmo.”

Outro entrevistado, com idade entre 26 e 34 anos, de Salvador, da classe C e que também faz parte do grupo de consumidores abusivos, acredita o mesmo. Que a ressaca moral é bem pior do que a física. “É mais complicado, é ruim, não pega legal, pega mal. A ressaca física passa rápido, a gente toma um analgésico, toma uma água de coco e uma hora ela passa, passa mais rápido.”

O panorama ainda aponta que os consumidores abusivos de álcool e os grupos mais jovens são os principais afetados pelo problema. Não que os moderados e os mais velhos sejam imunes. O que acontece é que os jovens e abusivos tendem a exagerar com mais frequência e, consequentemente, acabam fazendo mais besteira.

“Ainda bem que eu não tive tantas ressacas morais”, cita um consumidor moderado, com idade entre 26 e 34 anos, de Salvador e de classe A. “Na minha situação, eu diria que a ressaca física é pior porque acho que eu só tive ressaca moral uma vez assim e não foi algo tão grave.”

No caso dos jovens, a socióloga e coordenadora do Cisa, Mariana Thibes, explica que, como eles ainda não sentem os prejuízos relacionados ao álcool, que podem aparecer mais tarde na vida, como a hipertensão e alguns tipos de câncer, eles tendem a exagerar. “Isso faz com que as preocupações deles sejam mais voltadas para o curto prazo e para questões sociais.”

Ela ainda ressalta que “o consumo de álcool faz parte da sociabilidade dos jovens e dos seus rituais sociais, principalmente para não serem excluídos de um grupo". "Com efeito, beber demais traz temores relacionados ao que pode acontecer na vida social dos jovens”, acrescenta ela.

Como se livrar da culpa?

“Eu acho que, primeiro, a pessoa deve refletir sobre si mesma, porque ela teve aqueles determinados comportamentos, que reprova quando sóbria”, aconselha a psicóloga Elisângela Borges. “Ela não deve fazer disso um fator de sofrimento”.

“Geralmente, as pessoas que lembram do que fizeram vão começar a se sentir muito mal. Vão ficar se questionando: ‘Porque eu fiz isso? Porque eu sai com fulano? Porque eu transei com fulana? Porque eu usei aquela droga? Porque eu exagerei daquele jeito?’. Mas, você também tem que se perguntar o porquê de quando você está nessa situação você se excede dessa forma”, adiciona.

Uma outra dica para aliviar a culpa, de acordo com ela, é conversar com alguém. Caso tenha dito algo desagradável a um amigo, por exemplo, a opção é falar se desculpar. “Essas coisas são uma porta de entrada para você se sentir melhor.”

Segundo ela, é possível ainda fazer disso uma oportunidade para aprender com os próprios erros. “Tem gente que pega como aprendizado? Tem, mas [também] tem outros que não, que vão continuar errando. Tem que ver se essa pessoa também não tem uma predisposição genética para essas substâncias, o que faz com que ela não consiga parar”, complementa.

Ainda sou eu quando estou bêbado?

“Eu acredito que, na verdade, o álcool ou a droga só te dá a coragem”, diz a psicóloga Elisângela Borges. “A pessoa acaba fazendo o que ela já queria fazer, mas que não faz porque tem a questão da inibição. Muita coisa a gente tem vontade de fazer, mas quando a gente está alcoolizado fica mais fácil.”

Assim como a psicóloga, a socióloga e coordenadora do Cisa, Mariana Thibes, afirma que beber demais não é desculpa. “Se a pessoa perceber que tem feito coisas das quais se arrepende quando bebe, é hora de refletir sobre o papel da bebida em sua vida e rever seus hábitos”, diz. Caso o comportamento se torne frequente e passe a afetar a vida pessoal do indivíduo, ele deve procurar ajuda profissional.

Principais causas de arrependimento da ressaca moral:

Falar algo que não devia aos amigos ou colegas de trabalho, ou ser excessivamente sincero e magoar alguém;

Perder dinheiro ou objetos, como um telefone celular;

Ligar para um(a) ex namorado(a) durante o momento de embriaguez;

Estar namorando uma pessoa e beijar outra em uma festa, por exemplo;

Não comparecer a um compromisso de trabalho no dia seguinte após embebedar-se na noite anterior.

Com informações portal O Povo +

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