Tela de Antônio Parreiras retratando o julgamento de Frei Caneca (Foto: Reprodução/Domínio público) |
Era um tempo re revoluções na Europa e nas Américas — nos Estados Unidos, no Haiti e na América Espanhola. No que na época eram chamadas "províncias do Norte", o atual Nordeste, havia insatisfação de longa data, muito pela perda de prestígio e relevância para o Rio de Janeiro desde a chegada da família real, em 1808. Elites locais apoiaram a independência em 1822, mas não aceitaram quando o imperador dom Pedro I decidiu dissolver a Assembleia Constituinte em 12 de novembro de 1823. A data ficou conhecida como “a noite da agonia”.
“Dom Pedro não gosta do resultado porque claramente o documento a princípio é que o entendimento reduzia sua influência até mesmo seu poder político e ele manda dissolver a constituinte e não aceita o projeto de Constituição. Esse episódio chega às províncias do Norte, sobretudo no Ceará, Piauí, Pernambuco, como um forte impacto negativo”, disse Weber Porfirio, membro do Grupo Sociedade de Estudos do Brasil Oitocentista da Universidade Federal do Ceará (Sebo/UFC).
As províncias tinham eleito deputados para representá-las na elaboração da Carta constitucional. A assembleia conseguiu reunir 84 de seus 100 deputados, de 14 províncias. Estava representada a elite política e intelectual da época. As províncias do Pará, Maranhão, Piauí e Cisplatina (hoje Uruguai) não se fizeram representar por estarem envolvidas nas guerras de independência.
"Os republicanos diziam: qual o pais mais rico das Américas? Os Estados Unidos da América. O que fazem eles serem unidos é serem estados independentes. O México, que nasceu república, nunca se separou", explicou o professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Marcus Carvalho.
Ele destaca também que há uma simbologia na escolha da bandeira do Brasil Imperial, com um ramo de café e outro de fumo, enquanto no Nordeste a economia era movida pelo açúcar e o algodão. Até 1832, dez anos após a independência, o açúcar ainda valia mais financeiramente que o café.
A situação se agravou quando, em 25 de março de 1824, foi outorgada uma Constituição imposta pelo monarca. Em 14 de abril, chegou ao Ceará o primeiro presidente da província enviado por dom Pedro I, em substituição ao governo provisório liberal: Pedro José da Costa Barros. Mas, haviam retornado ao Ceará Tristão Gonçalves e Pereira Filgueiras, após combaterem no Piauí e no Maranhão contra os adeptos de Portugal e em favor da independência, na defesa do trono de Dom Pedro. As tropas de Filgueiras marcharam sobre Fortaleza. Em 28 de abril, Costa Barros renunciou e foi deportado. Tristão Gonçalves assumiu o cargo na época chamado de presidência do Ceará.
A agitação no Recife era ainda maior. Polo econômico e político das províncias ao norte da Bahia, era o principal foco de rebeldia contra a corte no Rio de Janeiro, com ecos da Revolução Pernambucana de 1817 muito vivos. A cidade sofreu bloqueios navais, suspensos em 1º de julho diante do temor de ataque português ao Rio de Janeiro, o que demandou o regresso de todas as embarcações. Livre da pressão naval, em 2 de julho de 1824, Francisco Paes Barreto proclamou o manifesto, redigido por Frei Caneca, da Confederação do Equador.
O projeto era criar uma república confederada, a República do Equador. No Ceará, durou 54 dias. A revolta não foi homogênea, diferentemente do que aparentam os livros, conta Weber Porfírio, membro do Sebo/UFC. Em alguns casos, vilas das mesmas províncias ficaram umas contra as outras: de um lado as que aderiam ao movimento; do outro, as favoráveis ao imperador. O mesmo aconteceu em outras regiões pelo Norte.
Para impulsionar as ideias da revolução, foi criado e começou a circular o primeiro jornal do Ceará: o Diário do Governo do Ceara. Ele é considerado o primeiro órgão de imprensa publicado no Estado, em 19 de abril de 1824, sob a direção de Padre Mororó. O sacerdote já era engajado na causa republicana e se tornou secretário do Governo de Tristão Gonçalves.
Para reprimir o movimento, dom Pedro I recrutou o escocês Thomas John Cochrane, veterano das guerras contra Napoleão, que serviu como mercenário nos processos de independência de Chile, Peru, Brasil e Grécia.
Recife foi bombardeado e se rendeu em setembro de 1824. Parte da frota seguiu para Fortaleza, que se rendeu em 18 de outubro. O brigadeiro Francisco de Lima e Silva, o Barão de Barra Grande, tentou forçar a rendição incondicional dos revolucionário, que evitaria a execução sumária para as lideranças. Poucos aceitaram, e a maioria preferiu continuar a luta no interior. Vilas cearenses resistiram e foram incendiadas e saqueadas.
Cochrane notificou Tristão Gonçalves a se render. Membro da poderosa família Alencar, ele receberia anistia se o fizesse. Sem resposta, Cochrane colocou recompensa pela cabeça dele. Em 31 de outubro de 1824, Tristão foi emboscado e morto nas proximidades da vila de Santa Rosa, onde ficava a antiga cidade de Jaguaribara, inundada pelas águas da barragem do Castanhão.
Os principais líderes foram executados no Campo da Pólvora, atual Passeio Público: Padre Mororó e Pessoa Anta (os dois no mesmo dia), Francisco Miguel Pereira Ibiapina, Luiz Inácio de Azevedo, conhecido como Azevedo Bolão, e Feliciano José da Silva Carapinima. A execução deveria acontecer por enforcamento, mas foi convertida para fuzilamento. Em homenagem aos confederados, o Passeio Público é também chamado Praça dos Mártires.
Pereira Filgueiras morreu de malária enquanto era levado para ser julgado no Rio de Janeiro. Outras personagens foram enviadas para trabalhos forçados em Fernando de Noronha.
Coronel
Antônio Bezerra de Menezes foi um dos poucos que conseguiram ser perdoados. Por
intermédio de Conrado de Niemeyer, presidente da Comissão Militar nomeada para
julgar a rebelião, teve pena convertida em degredo e prisão perpétua para o
Maranhão. Ele acabou não cumprindo a sentença porque morreu na viagem
Com informações portal O Povo +
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