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24 de outubro de 2023

Seca na Amazônia é considerada a mais severa desde o início das medições, em 1902

O baixo volume de chuvas aliado à seca transforma o conjunto natural amazônico (Foto: Cadu Gomes)

O Amazonas está em situação de emergência. A estiagem prolongada na região está causando os menores índices de baixa nos rios da história. De acordo com o Boletim de Estiagem de 2023, divulgado pelo governo amazonense neste mês, 59 municípios do estado se encontram em estado de emergência, 1 em alerta e dois municípios estão em estado de normalidade.

O grande número de cidades em situação de vulnerabilidade se dá pelo pouco volume de água dos rios da bacia do Amazonas. Nesta segunda-feira (23/10), o nível do Rio Negro, principal afluente do Solimões, atingiu a marca de 12,89 metros, nível mais baixo da história. A seca extrema deste ano é considerada a mais severa desde o início das medições, em 1902.

O baixo volume de chuvas aliado à seca transforma o conjunto natural amazônico. De acordo com o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), nos meses de junho, julho e agosto o volume de chuva em toda a região da Amazônia ficou abaixo da média. Em Manaus foram registrados 130,9 milímetros (mm), sendo que a média é de 202,2 mm.

A seca se configura como um potencial fator para a chegada de inúmeros problemas, mas, segundo especialistas era aguardada. “Agosto, setembro e outubro são meses tradicionalmente secos. Isso é explicado pelo chamado 'verão amazônico', uma época do ano bastante peculiar na Região Norte do Brasil, principalmente na área onde está localizada a Floresta Amazônica. Além da estiagem das chuvas, ele é caracterizado pelo surgimento das chamadas 'praias' dos rios e pelas altas temperaturas, que podem ultrapassar os 36º C”, afirma o geógrafo da Universidade Federal do Rio de Janeiro, William Passos.

Porém, este ano, a situação se agravou. “O ‘verão amazônico’ vem sendo acompanhado pela combinação entre temperaturas anormalmente altas das águas do Atlântico norte e a ocorrência do fenômeno El Niño. Com isso, a estiagem se estabeleceu muito mais rapidamente e a seca está muito mais grave que o normal”, diz Passos.

“Para a fauna e flora amazônica, uma região rica em biodiversidade, isso pode significar um aumento da mortalidade muito acima da média habitual, com impactos sobre o tamanho das populações de espécies animal e vegetal”, analisa o estudioso.

 A morte de botos e tucuxis no lago Tefé são um exemplo claro dos impactos imediatos que as condições extremas de temperatura causam nos animais amazônicos. “A seca histórica que o estado do Amazonas vem enfrentando explicam os registros elevados de mortalidade destas duas espécies de golfinhos de água doce. Importante acrescentar que a seca tem gerado também aumento das queimadas, que, por sua vez, ampliam ainda mais a mortalidade da fauna e da flora locais”, finaliza.

Segundo Ayan Fleischmann, engenheiro ambiental, hidrólogo e pesquisador titular do Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, a baixa no nível dos rios amazônicos se une às queimadas e ao aumento da temperatura das águas, causando um ambiente inóspito para os animais que as habitam e prejudicando toda a biodiversidade do bioma.

“Temos a seca, que implica na redução do nível dos rios, mas a gente tem a temperatura do ar recorde. Isso, diretamente relacionado a esse processo de aquecimento global e essa temperatura do ar recorde, também está relacionado a uma temperatura da água recorde que a gente vem observando aqui no lago Tefé e em outros lagos em que temos feito medições, o que implica grandes mudanças no ecossistema aquático e nos animais que estão ali”, argumenta.

Líder do Grupo de Pesquisa em Geociências e Dinâmicas Ambientais na Amazônia, Ayan afirmou, ainda, que o El Niño não é o único fator climático responsável pela seca prolongada e pela proliferação de queimadas na Amazônia.

“As queimadas, sejam elas naturais ou impostas pelo homem, são favorecidas por um ambiente seco. Porque está quente e seco, se proliferam queimadas, fica mais fácil da queimada se espalhar. O El Niño, junto com o Atlântico Tropical Norte quente, e é importante salientar que não é só o El Niño. Não estamos ainda no ponto auge do El Niño como estivemos em outros anos. O Atlântico tem um papel muito importante nesse momento de seca e então esse mecanismo climático que está acontecendo leva uma seca extrema, à redução das chuvas, ao aumento da temperatura do ar e à diminuição da umidade relativa do ar, e isso favorece as queimadas a se proliferarem”, ressaltou.

O hidrólogo lembrou, ainda, que os impactos dessas catástrofes ambientais afetam não só a biodiversidade amazônica, mas também as comunidades ribeirinhas que vivem nesse ambiente. “Isso que a gente está vivendo não é uma crise ambiental, apenas. É uma crise ambiental, sanitária, mas também humanitária na Amazônia. As comunidades estão isoladas e milhares delas com acesso muito precário à alimentação, à água potável, a medicamentos e a combustível. E essas comunidades têm que ser assistidas. É o momento agora de resposta a esse desastre. Tem que levar cestas básicas, água e medicamentos para as comunidades que estão isoladas, mas tem que trabalhar com prevenção para os próximos anos”, defendeu.

Nos primeiros 20 dias de outubro, 3.060 focos de incêndio foram identificados no estado do Amazonas. As cidades de Lábrea e Boca do Acre lideram em número de focos, com 398 e 294, respectivamente. O número de casos nos municípios avançou cerca de 197% e 315% em comparação ao mesmo período do ano passado, e preocupa autoridades.

A relação e dependência entre os fatores de seca e queimadas se alastram pelo estado amazonense e chegam a impactar as metrópoles, como a nuvem de fumaça que cobriu a cidade de Manaus na quarta-feira (11/10). A capital chegou a registrar uma das piores qualidade de ar do mundo, de acordo com World Air Quality Index, índice que afirmou que o ar da cidade era muito prejudicial à saúde.

Respostas das autoridades

A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, ao lado de Waldez Goés, do Desenvolvimento e Integração Regional, relatou que, diante da seca e queimadas motivadas por pecuaristas que estão acontecendo no Amazonas, uma série de medidas estão sendo tomadas em várias frentes. “O Ministério do Meio Ambiente está atuando em vários estados. No Amazonas, temos cerca de 300 brigadistas que ficarão à disposição do estado, além de especialistas que ajudarão nas ações de planejamento de combate ao fogo”.

“É uma situação de extrema gravidade porque há cruzamento de três fatores: grande estiagem provocada pelo El Niño; matéria orgânica em grande quantidade ressecada; ateamento de fogo em propriedade particulares e dentro de áreas públicas de forma criminosa”, ressalta a ministra. Ela reforça que não existe fogo natural e que é preciso que as pessoas parem de queimar o pasto na região. Marina reiterou que a orientação é atuar em equipes conjuntas com os estados no combate ao problema.

Flávio Dino, ministro da Justiça e Segurança Pública, anunciou em suas redes sociais que irá enviar agentes da Força Nacional ao Amazonas, atendendo à orientação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a pedido do governador do Amazonas, Wilson Lima (União-AM). “Vamos mobilizar mais efetivo da Força Nacional para reforçar as nossas equipes que já estão lá combatendo incêndios florestais”, publicou.

O vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) é líder de uma comitiva que visa definir medidas de enfrentamento ao período de estiagem que bate recordes históricos no estado. A razão da seca que o local enfrenta tem consequências sociais e econômicas. As medidas visam recuperar a possibilidade de navegação nos rios do estado, além do combate às queimadas e ajuda à população mais afetada pelo problema.

Com informações portal Correio Braziliense

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