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7 de novembro de 2021

Após Bolsonaro revogar homenagem a 2 cientistas, outros 21 renunciam à indicação

Na carta os profissionais criticam ainda o "negacionismo em geral" e os cortes em verbas federais para o desenvolvimento da ciência (Foto: Evaristo Sá)

Após o presidente Jair Bolsonaro revogar a homenagem da Ordem Nacional do Mérito Científico a dois cientistas responsáveis por trabalhos que desagradaram ao governo, outros 21 profissionais que seriam agraciados com a honraria decidiram renunciar à indicação em solidariedade aos colegas.

"A homenagem oferecida por um governo federal que não apenas ignora a ciência, mas ativamente boicota as recomendações da epidemiologia e da saúde coletiva, não é condizente com nossas trajetórias científicas. Em solidariedade aos colegas que foram sumariamente excluídos da lista de agraciados, e condizentes com nossa postura ética, renunciamos coletivamente a essa indicação", diz a carta aberta.

A Ordem Nacional do Mérito Científico é uma honraria concedida todos os anos para homenagear pessoas que se dedicaram ao avanço da ciência no país. A escolha é feita a partir de indicações da área, que são depois votadas por um comitê, que tem nove integrantes: seis indicados pela sociedade civil e pelas universidades e outros três representando o governo.

Em 3 de novembro, um decreto assinado por Bolsonaro concedia a homenagem ao médico sanitarista Marcus Vinícius Guimarães de Lacerda, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), e à médica Adele Benzaken, ex-diretora do Departamento de HIV/Aids do Ministério da Saúde.

Lacerda foi responsável por um dos primeiros estudos a apontarem a ineficácia da cloroquina contra a covid-19. Os medicamentos são receitados dentro do que se convencionou de "tratamento precoce", embora sejam comprovadamente ineficazes para o combate do novo coronavírus. Bolsonaro é um dos defensores da cloroquina, apesar das evidências científicas contrárias.

Já Adele foi demitida do cargo em janeiro de 2019, após a publicação de uma cartilha sobre prevenção de doenças destinada a homens trans. Ela ocupava a função desde junho de 2016.

Após a repercussão sobre o trabalho feito por Lacerda e Adele, os dois tiveram a homenagem revogada por Bolsonaro. Um novo decreto foi editado em 5 de novembro, apenas dois dias depois do original.

Na carta, divulgada ontem (06/11), os 21 cientistas declaram sua "indignação, protesto e repúdio pela exclusão arbitrária dos colegas" e veem perseguição aos cientistas. Os signatários atuam em diferentes campos da ciência: biomédica, química, humanas, física, matemática, biológica e da terra. Também há personalidades nacionais.

"Tal exclusão, inaceitável sob todos os aspectos, torna-se ainda mais condenável por ter ocorrido em menos de 48 horas após a publicação inicial, em mais uma clara demonstração de perseguição a cientistas, configurando um novo passo do sistemático ataque à Ciência e Tecnologia por parte do governo vigente", diz a carta.

No documento, os profissionais criticam ainda o "negacionismo em geral" e os cortes em verbas federais para o desenvolvimento da ciência.

Os cientistas agradeceram às indicações feitas pela Academia Brasileira de Ciências e pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), entidades com assento no comitê que decide as homenagens da Ordem Nacional do Mérito Científico. Eles se dizem "extremamente honrados" com a possibilidade de serem agraciados, mas declinam à indicação devido à exclusão de Lacerda e Adele.

"Esse ato de renúncia, que nos entristece, expressa nossa indignação frente ao processo de destruição do sistema universitário e de Ciência e Tecnologia. Agimos conscientes no intuito de preservar as instituições universitárias e científicas brasileiras, na construção do processo civilizatório no Brasil", diz a carta.

Veja quem assina a carta de renúncia à homenagem:

Aldo Ângelo Moreira Lima (UFC)

Aldo José Gorgatti Zarbin (UFPR)

Alfredo Wagner Berno de Almeida (UEMA)

Anderson Stevens Leonidas Gomes (UFPE)

Angela De Luca Rebello Wagener (PUC-RJ)

Carlos Gustavo Tamm de Araujo Moreira (IMPA)

Cesar Gomes Victora (UFPel)

Claudio Landim (IMPA)

Fernando Garcia de Melo (UFRJ)

Fernando de Queiroz Cunha (USP)

João Candido Portinari (Projeto Portinari)

José Vicente Tavares dos Santos (UFRGS)

Luiz Antonio Martinelli (USP)

Maria Paula Cruz Schneider (UFPA)

Marília Oliveira Fonseca Goulart (UFAL)

Neusa Hamada (INPA)

Paulo Hilário Nascimento Saldiva (USP)

Paulo Sérgio Lacerda Beirão (UFMG)

Pedro Leite da Silva Dias (USP)

Regina Pekelmann Markus (USP)

Ronald Cintra Shellard (CBPF)

Com informações portal Correio Braziliense

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Um comentário:

  1. Nobre, digna e honrosa a atitude desses profissionais que abdicaram da referida honraria em solidariedade aos colegas e como forma de protesto ao negacionismo explícito do senhor presidente da República e seus fiéis ministros.

    Não há dúvidas de que, com Bolsonaro no poder, vive hoje o Brasil um dos períodos mais tristes e sombrios da sua história, marcado por grave retrocesso civilizacional e densas trevas.

    Após um período de mais de 30 anos de democracia, é lamentável ver o país mergulhar outra vez na escuridão de um regime obscurantista que se pretende despótico.

    Às vezes, porém, é preciso mergulhar na escuridão para se aprender a valorizar a luz.

    Espera-se que esse pesadelo acabe logo, para que o sol da democracia volte a brilhar outra vez sobre a nação.

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