Como
tudo que fez na pandemia deu errado, Bolsonaro tenta outra "estratégia" (Foto: Aurelio Alves) |
No início de outubro deste ano, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) vetou projeto que propunha a distribuição de absorventes para mulheres de baixa renda. O custo estimado da medida era de R$ 80 milhões. O argumento para rejeitá-la foi de que não havia caixa para bancar esse gasto. Era mentira, claro.
Como se vê agora, quando o governo quer gastar, encontra uma maneira, sobretudo se é a reeleição do presidente que está em jogo (e, a se confiar nas pesquisas, ela está). Nem que, para isso, tenha de apelar a pedaladas retóricas.
Se não há dinheiro, busca-se um modo de refazer o teto das despesas, alterando variáveis de cálculo e implodindo a Lei de Responsabilidade Fiscal, numa chicana à luz do dia a fim de pavimentar o caminho das urnas ano que vem pela via mais fácil.
A pretexto de custear o Auxílio Brasil de R$ 400, Bolsonaro criou o teto de Schrödinger, que está e não está lá. A lógica é mais ou menos a mesma adotada no Ministério do Meio Ambiente: não existe crime ambiental se não há fiscalização.
Assim, o governo não descumpre o teto se o teto for colocado mais acima, numa releitura criativa da regra do jogo fiscal. E daí se parte da equipe de Paulo Guedes (Economia) debandou ou se o ministro é apenas decorativo. Do "Posto-Ipiranga", aquele super-ministro da campanha que se pretendia mais autoridade do que o chefe do Executivo, não resta sequer o nome, apenas a caricatura.
Para Bolsonaro e cia., a palavra de ordem é lançar mão de tudo ao alcance para assegurar - o correto é dizer comprar - alguma popularidade até 2022. Contra a instabilidade política e o risco de impeachment, por exemplo, assinaram cheque em branco entregue nas mãos do centrão por meio de emendas parlamentares a gosto do freguês, cedendo controle de parte do orçamento público em favor do grupo do PP e de outras legendas de maior ou menor apetite.
Com o Auxílio Brasil dá-se o mesmo. Não é que o governo tenha sentado para discutir exaustivamente soluções fiscais para viabilizar com responsabilidade o programa e a parcela de R$ 400 até dezembro de 2022. É tudo improvisado.
O problema não é a justeza da iniciativa, tampouco existe dúvida de que a população mais vulnerável precisa de ajuda financeira em meio à pandemia de Covid, cujos danos seriam menores se o presidente houvesse se preocupado de fato com a saúde e com a economia.
Ocorre que, diferentemente do que diz, Bolsonaro não estava interessado nem na sobrevivência econômica das famílias, nem na imunização das pessoas. Ele deu de ombros para ambas - para não usar expressão mais chula.
O resultado é esse aí: 600 mil mortos e um país catando osso para ter o de comer, supermercado vendendo carne com bandeja vazia, peças de filé registradas com alarme antirroubo e por aí vai. Nem a saúde, nem a economia - esse pode ser o lema de reeleição do presidente.
Como tudo que fez na pandemia deu errado, e isso ficou claro durante a CPI e mais ainda no relatório que o acusou de nove crimes, Bolsonaro quer agora dinheiro a rodo para torrar no seu projeto para mais quatro anos. Pode até ter, mas as baixas vão se acumular. Apenas ontem quatro secretários (dois titulares e dois adjuntos) pediram demissão.
"Mas
o Guedes continua", se apressaram a dizer os apoiadores. Sim, continua,
mas numa versão desenxabida, um posto qualquer de beira de estrada, perdido no
meio de uma BR sem combustível e com uma placa de vende-se.
Publicado
originalmente no portal O Povo Online
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