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12 de junho de 2021

Na CPI da Covid especialistas culpam o governo pelo caos no país

 

O médico sanitarista Claudio Maierovitch e a cientista Natalia Pasternak foram ouvidos na CPI (Foto: Jefferson Rudy)

O Brasil poderia ter 75% menos mortes por covid-19 caso tivesse conduzido a crise de saúde pública de maneira uniforme, cumprido as medidas sanitárias, feito testagem em massa e comprado vacinas sem atraso. Essas conclusões, baseadas em estudos, foram consideradas por senadores da CPI da Covid como a principal contribuição dos especialistas ouvidos, ontem, pela comissão: o médico sanitarista Claudio Maierovitch, ex-presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa); e a cientista Natalia Pasternak, microbiologista da Universidade de São Paulo (USP). Na avaliação de parlamentares, os depoimentos sustentam que o governo foi omisso e tem responsabilidade sobre o elevado número de mortes no país, que chegou à marca de 484.235.

“Três de cada quatro mortes seriam evitadas se o Brasil estivesse na média mundial de controle da pandemia. Ou seja, quando atingirmos 500 mil mortes, 375 mil teriam sido evitadas”, afirmou Pasternak, citando um estudo do pesquisador Pedro Hallal, ex-reitor da Universidade Federal de Pelotas, que foi publicado na revista Lancet. A especialista definiu como “desastrosa” a adoção de uma política pública baseada em medicamentos sem eficácia comprovada contra a doença, em detrimento de campanha publicitária em massa para guiar a população a seguir as medidas sanitárias.

Os especialistas foram categóricos em refutar a prescrição de cloroquina, recomendada pelo presidente Jair Bolsonaro. “Ela nunca teve plausibilidade biológica para funcionar. O caminho pelo qual bloqueia a entrada do vírus na célula só funciona in vitro, em tubo de ensaio, porque nas células do trato respiratório, o caminho é outro. Então, nunca poderia ter funcionado”, explicou. Os estudos em tubo de ensaio são as análises em laboratórios. É o primeiro passo da pesquisa de medicamentos. Segundo Pasternak, menos de 10% de análises que passam no tubo de ensaio se confirmam e se transformam em medicamentos.

Ela ressaltou que “evidências anedóticas não são evidências científicas”. “Evidências anedóticas, (como) ‘ah, mas o meu vizinho, o meu cunhado, o meu tio tomou e se curou’, não são evidências científicas, não servem para a ciência, são apenas causos, histórias”, destacou.

A pesquisadora sustentou que o negacionismo à ciência “é uma mentira orquestrada pelo governo federal e pelo Ministério da Saúde”. “E essa mentira mata, porque leva pessoas a comportamentos irracionais, que não são baseados em ciência”, pontuou.

Para Maierovitch, o Brasil tinha a expertise necessária para lidar com a crise sanitária e não o fez porque preferiu politizar. “Assistimos estarrecidos a um desestímulo oficial para que um grande laboratório nacional assumisse a produção de vacinas”, criticou, numa referência ao Instituto Butantan, que fabrica a CoronaVac. Ele também definiu como “pífio” o plano de imunização.

De acordo com Maierovitch, antes da crise sanitária, o Brasil estava em nono lugar em agilidade nas respostas para alastramento de epidemias e mitigação de suas consequências, de acordo com o Índice Global de Segurança em Saúde de 2019, da Universidade Johns Hopkins. Ao longo da pandemia, porém, o que se viu foi “falta de uma atitude, de uma organização, de um planejamento do governo federal”.

Agora, num levantamento do Instituto Lowy, da Austrália, de janeiro de 2021, o Brasil aparece como o país com a pior resposta à covid-19, entre 98 nações pesquisadas. Um dos motivos para o país ter chegado a essa situação, segundo Maierovitch, deve-se ao fato de o Executivo federal ter apostado em imunidade de rebanho. “O governo se manteve na posição de produzir imunidade de rebanho para a nossa população, em vez de adotar as medidas reconhecidas pela ciência para enfrentar esta crise”, criticou. “Rebanho se aplica a animais, e somos tratados dessa forma.”

O vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), afirmou que o propósito da sessão foi ouvir a ciência. “Com as exposições públicas que ambos têm tido, tem servido para salvar a vida de muitos brasileiros. A grande contribuição foi ouvir dois renomados cientistas que apontam o caminho que deveria ter sido escolhido no enfrentamento à pandemia”, destacou.

O senador governista Jorginho Mello (PL-SC) elogiou os depoimentos, mas ressaltou que o tratamento dado por eles é político. “São, literalmente, adversários do governo Bolsonaro. Isso está claro nas manifestações deles à imprensa lendo algumas matérias com entrevistas dos dois”, enfatizou.

Frases de Natalia Pasternak:

"Não funciona em camundongos, não funciona em macacos e já sabemos que não funciona em humanos. A cloroquina já foi testada em tudo. A gente só não testou em emas porque elas fugiram”

"Quando aparece (Bolsonaro) sem máscara, desdenhando a pandemia, mostrando falta de empatia com o luto dos brasileiros, ele ilude as pessoas. Isso faz com que as pessoas assumam comportamento de risco"

"Usar esse negacionismo em políticas públicas não é falta de informação, é uma mentira e, no caso triste do Brasil, é uma mentira orquestrada pelo governo federal e pelo ministério da Saúde. E essa mentira mata”

"Só podemos deixar de usar (máscara) quando grande porção da população estiver vacinada e a curva nos disser que isso é seguro. (…) E quando tem o chefe da nação fingindo que esse momento chegou, isso confunde a população”

Frases de Claudio Maierovitch:

"Nós não somos rebanho. (...) Rebanho se aplica a animais. Acredito que a população brasileira tem sido tratada dessa forma ao se tentar produzir imunidade de rebanho às custas de vidas humanas"

"O plano de imunização que tivemos é um plano pífio. É um plano que não entra nos detalhes necessários para um plano de imunização que deve existir no país”

"Enquanto não tivermos uma proporção muito grande da população vacinada, temos de continuar tomando todos os cuidados, usando máscaras quando tivermos pessoas próximas ou em locais fechados”

"Alguma coisa aconteceu, algum vírus provavelmente não biológico, que acometeu pessoas (do gabinete paralelo) que tinham trajetória importante, mas enveredaram em oposição ao conhecimento científico”

Com informações portal Correio Braziliense

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