O presidente voltou a criticar as medidas restritivas tomadas por governadores e prefeitos no combate ao coronavírus (Foto: Minervino Júnior) |
No
movimento mais incisivo até agora na sua postura de minimizar a dimensão da
Covid-19, o presidente Jair Bolsonaro decidiu fazer uma arriscada jogada
política. Em plena pandemia, com o país chegando à casa de 2 mil mortes e mais
de 30 mil infectados, o chefe do Executivo resolveu demitir seu ministro mais
popular, o então titular da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, e nomear para o posto
o oncologista Nelson Teich.
O
objetivo do comandante do Planalto é ter na função alguém que reze por sua
cartilha, o que Mandetta se recusava a fazer, ao defender o isolamento social
como forma de conter a disseminação do coronavírus e ao pregar cautela no uso
da hidroxicloroquina no combate à doença. Teich parece se enquadrar no perfil.
Na primeira entrevista como novo ministro da Saúde, disse que não pretende
fazer nenhuma mudança brusca no enfrentamento ao vírus, mas avisou que está “em
alinhamento completo” com Bolsonaro.
Mandetta
era elogiado por especialistas em razão de sua atuação técnica, baseada em
dados e nas recomendações da Organização Mundial da Saúde. Essa postura o levou
a ganhar os holofotes e a se tornar um ponto de segurança em meio à guerra
contra a Covid-19. A popularidade dele alcançou 76%, e ofuscou Bolsonaro, que
insiste em afrouxar o isolamento social e na reabertura do comércio para
movimentar a economia. A estratégia do chefe do Executivo, no entanto, é um
tiro no escuro, tendo em vista o resultado de outras nações que demoraram para
estabelecer uma quarentena ou flexibilizaram o isolamento, casos dos Estados
Unidos e da Itália, onde o impasse entre a saúde e a economia deixa um saldo de
milhares de mortes.
Ontem (17/04) Bolsonaro voltou a criticar as medidas restritivas e apontou como “exagero” as
decisões tomadas por governadores e prefeitos no combate ao coronavírus. “Em
nenhum momento fui consultado sobre medidas adotadas por grande parte de
governadores e prefeitos. Tenho certeza de que eles sabiam o que estavam
fazendo. O preço vai ser alto. Tinha que fazer alguma coisa? Tinham. Mas se,
porventura, exageraram, não bote essa conta no governo federal, não bote mais
essa conta nas costas do nosso sofrido povo brasileiro”, discursou.
Ele
declarou que Mandetta tinha uma visão voltada exclusivamente para a área de
saúde, sem avaliar os problemas econômicos. “Decisões sou obrigado a tomar,
porque sempre tenho dito, dado a minha formação militar: pior do que uma
decisão mal tomada é uma indecisão. Jamais pecarei por omissão”, ressaltou.
“Uma pessoa desempregada está mais propensa a sofrer problemas de saúde do que
uma outra empregada. E, desde o começo da pandemia, eu me dirigi a todos os
ministros e falei da vida e do emprego. É como um paciente que tem duas
doenças. A gente não pode abandonar uma e tratar exclusivamente outra”, frisou.
Ele
falou sobre o entendimento que teve com Teich. “O que conversei com doutor
Nelson: é que, gradativamente, temos de abrir o emprego no Brasil. Essa grande
massa de humildes não tem como ficar presa dentro de casa. E o que é pior,
quando voltar, não tem emprego. E o governo não tem como manter esse auxílio
emergencial ou outras ações por muito tempo”, destacou. “Estávamos praticamente
voando, no final do último trimestre. Tudo estava indo muito bem. O Brasil
tinha tudo para dar certo, num curto espaço de tempo. Esse dar certo agora
acontecerá, mas em um tempo mais ampliado.”
O
presidente afirmou que pretende enviar um projeto de lei ao Congresso para
tentar ampliar atividades comerciais consideradas essenciais. A intenção vai na
contramão do que decidiu o Supremo Tribunal Federal (STF). A Corte barrou
qualquer possibilidade da flexibilização da quarentena por meio de decreto. Os
ministros entenderam que governadores e prefeitos têm autonomia para decidir
sobre medidas sanitárias, mesmo que o governo federal não concorde.
Alinhamento
Ao
contrário de Mandetta, Nelson Teich demonstrou apoio às intenções de Bolsonaro.
Ele comentou que é preciso entender melhor a Covid-19 antes de estabelecer
qualquer medida de isolamento social como forma de prevenção à doença. Além
disso, frisou que “saúde e economia não competem entre si e são completamente
complementares”.
O
anúncio oficial de Teich como ministro da Saúde ocorreu no Palácio do Planalto.
Ao lado de Bolsonaro, ele agradeceu a oportunidade de assumir o ministério “em
um momento tão importante da saúde no país” e disse ser “uma honra estar aqui
para ajudar o país e as pessoas”. “O que é fundamental hoje? É que a gente
tenha informações cada vez maiores sobre o que acontece com as pessoas com cada
ação que é tomada. Como a gente tem pouca informação e tudo é muito confuso, a
gente começa a tratar ideia como se fosse fato e começa a trabalhar cada
decisão como se fosse um tudo ou nada. E não é nada disso”, enfatizou.Continua
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Em
entrevista à TV Record, Teich falou sobre isolamento social. “O que tenho
colocado é que discussões genéricas, tipo o vertical, o horizontal, são muito
superficiais. O fundamental seria que você tentasse entender, por exemplo,
quantos por cento da população estão infectados, quantos estão imunizados,
quanto é a transmissibilidade dessa doença”, disse. “Se não tem isso, a
discussão sobre o tipo de isolamento é mais uma discussão emocional, é uma
discussão de opiniões.”
Panelaços
pelo país
Enquanto
o presidente Jair Bolsonaro confirmava a demissão do ministro da Saúde, Luiz
Henrique Mandetta, ocorriam panelaços em diversas cidades. Em alguns lugares,
foram ouvidos também gritos de “Fora, Bolsonaro” e “Bolsonaro genocida”. Houve
registros de protestos em Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro, Paraíba,
Pernambuco, Ceará, Amazonas, Vitória, Minas Gerais. Na capital federal,
manifestações ocorreram nas Asas Sul e Norte, Águas Claras, Guará, Sudoeste,
Samambaia e Taguatinga. No Twitter, os nomes de Mandetta e o do novo ministro
da Saúde, Nelson Teich, lideraram os assuntos mais comentados durante a tarde.
Diversos usuários compartilharam registros de protestos de insatisfação com a
demissão de Luiz Henrique Mandetta.
#ForaBolsonaro
chega ao 2º lugar no Twitter mundial
A
demissão de Luiz Henrique Mandetta do cargo de ministro da Saúde em meio à
crise do coronavírus foi ruidosa nas redes sociais. Por volta das 18h de ontem,
críticos do governo emplacaram a campanha #ForaBolsonaro no segundo lugar dos
assuntos mais relevantes do mundo no Twitter. No ranking global, a expressão
“Ministro da Saúde” estava em sétimo lugar na lista, e “bozo”, como alguns
detratores do presidente Jair Bolsonaro se referem a ele, fechava a lista dos
10 termos mais relevantes no planeta. Uma hora antes, de acordo com a
ferramenta Trends24, “Mandetta” também havia chegado ao segundo lugar dos
trending topics mundiais. A hashtag #BolsonaroVirus também chegou a integrar a
lista, em quinto lugar.
Com
informações portal Correio Braziliense
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