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1 de março de 2020

Bolsonaro e a tensão entre os poderes


O vídeo compartilhado por apoiadores do presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), convidando a atos pelo País deu origem a mais recente crise entre o capitão da reserva do Exército, o Poder Legislativo e o Supremo Tribunal Federal (STF), a mais alta corte do Poder Judiciário. Atacados no conteúdo, os dois Poderes serão alvos de protestos no dia 15 de março em todo o País.

A tensão escalou até o estopim não pela programação do ato, mas principalmente por Bolsonaro ter sido um dos que propagou a convocação via WhatsApp.

"Vamos mostrar que apoiamos Bolsonaro e rejeitamos os inimigos do Brasil. Somos, sim, capazes e temos um presidente trabalhador, incansável, cristão, patriota, capaz, justo e incorruptível", narra voz ao fundo, em vídeo repleto de imagens do presidente.

A revelação do compartilhamento foi assinada pela jornalista Vera Magalhães e veiculada no BR Político, do Estadão. Tão logo publicada, a matéria não tardou a render xingamentos a profissional pela militância bolsonarista nas redes sociais. E também pelo próprio chefe do Executivo Federal, que endureceu o tom durante live semanal - numa rotina que tem se estendido a jornalistas.

Mas, por que protestar em favor de Bolsonaro? E por que o Congresso entrará na mira dos atos? O vídeo e, posteriormente, a manifestação são resultado de um comentário do ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), General Heleno, que qualificou parlamentares de chantagistas durante transmissão ao vivo. O dispositivo confere ao Congresso mais poderes sobre o gasto público federal.

À época da votação que aprovou o texto na Câmara, 26 de março, o roteiro do episódio do compartilhamento ainda seria composto pela justificativa de Bolsonaro, instantes depois revelada mentirosa. Ele afirmou que, diferente do que Vera Magalhães noticiou, o compartilhamento do vídeo aconteceu em 2015. Período em que manifestantes foram às ruas pela deposição da então presidente Dilma Rousseff (PT).

Porém, grande parte das imagens do vídeo mostra Bolsonaro convalescendo na Santa Casa de Misericórdia em Juiz de Fora, Minas Gerais. Lá, onde iniciou recuperação após a facada sofrido durante a corrida presidencial. Se foi vítima do atentado em 2018, o vídeo não teria como ser de cinco anos atrás.

A soma do mais recente movimento do presidente às atitudes de confrontação adotadas desde que assumiu o posto fazem, até mesmo, jornais citarem abertamente o impedimento de Bolsonaro. Foi o que fez a Folha de S. Paulo. "Talvez só o temor de um processo de impeachment possa deter a perigosa aventura", se posicionou no último dia 26.

Juristas se dividiram sobre ter havido ou não crime de responsabilidade no compartilhamento do vídeo. A discussão é se o presidente atentou contra outros poderes, já que estava usando WhatsApp, um aplicativo particular de troca de mensagens. Outro ponto de interrogação é se o presidente caminha para ruptura com a institucionalidade democrática, isto é, se acena com o desejo de fechar o Congresso e a Suprema Corte.

Para o docente e cientista político pela Universidade de Mackenzie, Rodrigo Prando, não é para tanto. Ele explica que as condições que resultam no rompimento, na maioria das vezes, são de natureza objetiva e subjetiva.

"Deve se ter crise econômica muito forte, uma crise institucional em que os poderes da República não estejam funcionando, né? Enfim, pode ter uma escalada da violência na sociedade. Neste momento não assistimos estas condições objetivas", ele elenca.

E diz: "Nem há uma crise econômica severa nem há uma escalada da violência. E os poderes da República, Executivo, Legislativo e Judiciário, com todos os problemas ainda estão funcionando. Eles têm servido de contrapeso e de freios, especialmente, em relação ao Poder Executivo".

Sobre as condições subjetivas, o professor diz não serem suficientes para um avanço autoritário. Mesmo com a ineficácia, Prando acredita haver no atual governo "indivíduos e grupos que desejariam, sim, uma ruptura institucional."

Magno Karl, cientista político, entende que por mais fora da normalidade que seja o movimento presidencial, Bolsonaro apela às ruas por estar ciente da própria fragilidade nas casas legislativas. Ele remonta o início do desgaste, o orçamento impositivo, para dizer que a própria base de Bolsonaro na Câmara não sabia no que estava voltando.

"São movimentos de natureza autoritária, fora da normalidade do que é desejável num ambiente democrático. Mas não chamaria de ambiente golpista, mas sim de tentativa autoritária e fora da normalidade", define Karl.

Prando interpreta que até aqui as instituições, sobretudo as lideradas por Rodrigo Maia (Câmara) e Davi Alcolumbre (Senado), ainda não deram resposta à altura dos arroubos do presidente. Sem citar Bolsonaro, Maia escreveu em rede social que "criar tensão institucional não ajuda o País a evoluir. Somos nós, autoridades, que temos de dar o exemplo de respeito às instituições e à ordem constitucional".

"A grande questão é que por enquanto ninguém conseguiu passar do discurso, para uma ação mais concreta que venha a colocar limites no presidente da República", pontua Prando.

Com informações portal O Povo Online

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