O preço do litro do combustível atingiu o patamar de R$ 4 em 2018, no Brasil. Desde então, os últimos três anos foram de escalada. A realidade mexeu com a rotina dos consumidores, desde a substituição do combustível a mudanças de hábitos nas locomoções diárias e incitou até greve, como a dos caminhoneiros. O incômodo da população reverberou e baixar o preço do produto virou bandeira política, inclusive do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Um feito que ele ainda não conseguiu, mas tenta por meio de estratégias que se desencontram com outras áreas econômicas.
Bolsonaro desafiou os governadores, por exemplo, a zerar o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre gasolina e diesel em troca de fazer o mesmo com os tributos federais, que são o Programa de Integração Social (PIS), Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide).
E no cálculo para definir o preço final do combustível, entram as alíquotas desses impostos tanto nas esferas federal e estadual, além do custo da distribuição e revenda. Do dinheiro arrecadado, 75% são distribuídos para as unidades federativas, que repassam 25% para os municípios. Feita a partilha, as cidades destinam os gastos para setores como Saúde e Educação.
Para se ter ideia, se o plano fosse implantado, o impacto seria de R$ 2,8 bilhões no Ceará. O valor é da estimativa de arrecadação para esse ano com o ICMS, que é de R$ 14,06 bilhões. Isso gera um impasse entre esferas, pois mexe na receita de estados e municípios.
Para o professor Joseph David Vasconcelos, do Departamento de Teoria Econômica da Universidade Federal do Ceará (UFC), o primeiro ponto é analisar a questão fiscal do País para saber a viabilidade da medida.
"O déficit do Brasil encerrou o ano passado com R$ 95 bilhões. Ou seja, o governo gastou mais do que arrecadou. Já receitas que vêm do ICMS são algo em torno de R$ 25 bilhões. Não há, no entanto, condições de abdicar deste valor", calcula. "Para fazer isso, ele teria de dizer de onde cortaria essa dimensão de R$ 25 bilhões para neutralizar o efeito", complementa. Ele acrescenta que essa repercussão recai mais sobre os estados, que não têm poder de criação de moeda.
José Irineu de Carvalho, consultor de assuntos econômicos e financeiros da Associação dos Municípios do Estado do Ceará (Aprece), explica que áreas prioritárias, como Educação e Saúde recebem aporte de 25% e 15%, respectivamente. "(Zerar) Impactaria na redução dos repasses, mas não temos como quantificar detalhadamente. Para os municípios menores, o peso acaba sendo relativamente grande na arrecadação".
Vinte e três governadores já se declararam contra a proposta do presidente, em carta assinada na última segunda. O governador Camilo Santana (PT) está entre eles. Em resposta, Bolsonaro insistiu: "Desafio aqui, agora. Eu zero o (tributo) federal hoje, eles zeram o ICMS. Se topar, eu aceito", afirmou.
Vander Mendes Lucas, professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB), reitera que o impacto é maior para os municípios. "O segundo ponto é que o próprio Estado depende do imposto, temos estados que chegam a 80% da sua receita. O Governo Federal tem uma influência não só pela questão tributária, mas por ser proprietária da refinaria", pondera.
Procurada, a Secretaria de Estado da Fazenda (Sefaz) informou que endossa o conteúdo da carta e não fala mais sobre o assunto. Na segunda, a secretária da Fazenda, Fernanda Pacobahyba, comentou que "14 estados do Brasil estão em situação de calamidade fiscal". "Não queremos entrar para essa lista".
Com informações portal O Povo Online
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