Um
homem não se casa com uma mulher, mas com uma família e, portanto, com um
universo de diferenças que devem ser administradas com muito cuidado para que
haja entendimento. Da mesma forma é um prefeito municipal quando se propõe a
administrar um município. A candidatura, a campanha, a eleição... tudo isso é
pautado em cima das avultadas fortunas a serem administradas. Mas, normalmente,
os prefeitos esquecem que estão adquirindo para sua responsabilidade um
município que já detém uma história, um povo, um patrimônio.
O
primeiro patrimônio de um município, célula mater da nação, é o povo. O povo e
tudo o que o povo tem. Porque município enquanto entidade, sem povo, não
existe. Como exemplo, podemos citar as cidades abandonadas do mundo por falta
de gente. Cococi, nos Inhamuns, é um exemplo clássico e próximo da nossa
realidade.
Ao
povo pertence as crenças, os valores, a identidade do município e até o recurso
financeiro que existe. O povo é que produz riqueza. Prefeito entra sem dinheiro
e deveria assim sair. Pois é um funcionário e, assim sendo, não deveria levar
do seu trabalho nada para casa, a não ser trabalho, coisa que o funcionário
quando se propõe à função já sabe que levará.
Todo
aglomerado de pessoas se inicia ao lado de água. Necessariamente foi assim
desde sempre porque a água é um bem necessário à vida. Com Altaneira não foi
diferente. O aglomerado de pessoas e depois de casas surgiu ao lado de um lago.
A Lagoa que ainda hoje existe.
Aonde
tem gente tem fé, tem crença, tem devoção. Assim nomeou-se a Lagoa Santa Tereza
e depois, se alastrando a devoção, fizeram-na padroeira. Então,
pertence ao povo a escolha de santa Tereza como padroeira e sua festa em âmbito
municipal para afirmação da fé.
Pois
bem! Todos os prefeitos de Altaneira, desde o primeiro, quando chegou ao Centro
Administrativo Municipal (que tem o nome trocado de quando em quando) já
encontrou a Lagoa de Santa Tereza e já encontrou a fé na Santa Padroeira. No
entanto, a modernidade, a presença do “Estado Laico” na terra em que o poder
público grita: “L’État, c’est moi”, entendeu que deveria deixar de fazer a
festa social que desde sempre seguiu paralelamente os festejos religiosos à
padroeira. Não tendo sido aceito nos seus desejos imediatos, fica a dica para
assim que puder.
Quanto
a Lagoa de Santa Tereza, abraçada por gerações e gerações de alunos das escolas
18 de Dezembro e Santa Tereza, causa apoiada por professores de biologia que
sempre deram os créditos da falta de cuidados da Lagoa à administração pública
daquela época, da qual era oposição, mas que hoje na situação nada desenvolve
em favor da causa. E não vejo resolução em se dizer que há projetos, porque
qualquer projeto antes de ser desenvolvido é somente um projeto e, por isso, é
nada! De boca só beijo e papel aceita tudo.
Muito
me alegra, no entanto, em saber que Altaneira, atualmente, é um município que
não tem problema financeiro ou de qualquer outra ordem.
Haja
vista as preocupações a que está dedicado o poder público, dividido nas duas
casas: executiva e legislativa, pois quando a preocupação do município está em
mudar o dia da feira-livre, atitude que não fará de Altaneira a primeira
economia no Ceará; desvalorizar a festa da padroeira, atitude que não dará a
Altaneira a economia que viabilizará a resolução dos problemas na saúde, na
educação e nos demais setores; mudar nome de prédio público, sem pensar antes
em reforma-lo adequadamente, e descobrindo um santo para cobri outro; demolir
monumentos da cidade, em vez de reutiliza-los de maneira criativa... quando o
poder público se dedica a isso, pode acreditar: alguma coisa está errada. Ou
perdeu-se no compromisso ou nunca se teve!
A
Caixa D’água da Altaneira Antiga, há muito tempo deixou de ser útil. Mas,
“coincidentemente” ela passou a ser história no dia que deixou de ser útil.
Porque é assim que a história se faz.
O
Coliseu, na Itália não foi feito para ser um monumento cultural que
representaria a Itália no mundo, nasceu um teatro de apresentações ao ar livre
e depois se tornou monumento histórico. Assim, a Caixa D’agua da Altaneira
Antiga, teve o seu tempo de utilidade, e depois virou patrimônio histórico.
Será
que o caso Caixa D’água, não seria visto de outra forma se a administração
municipal estivesse voltada para a valorização do seu povo? A Caixa D’água é
mais velha do que três quartos dos que compõem a administração. Será que não há
uma voz dentro desse grupo que possa ser ouvida em torno da valorização da
história local?
Se
há justificativa no recurso para demolir, há também justificativa do mesmo
recurso para recuperar (aproveitando aqui o discurso de que a Caixa D’água
ameaça desabar).
O
debate sobre demolir a Caixa D’água está dividido em dois campos: de um lado os
que apoiam a decisão unilateral, mas não versam sobre o mal causado pelo
monumento, dando como única solução para o caso a demolição total e a
construção de outra coisa qualquer muito mal desenhada como as obras que temos
visto ultimamente; enquanto do outro lado estão os que defendem o monumento como
patrimônio local e que podem dá ao referido monumento uma serventia cultural.
A
solução do caso não está em nenhum dos lados do debate. A solução está no chefe
do palácio sem nome que poderá, pela sua atitude, qualificar culturalmente o
seu próprio governo.
Francisco
Adriano de Sousa é professor, escritor e poeta, atualmente atua como Diretor
Regional de Patrimônio da
Academia de Letras do Brasil Seccional
Regional Cariri-Oeste.
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