Um dos focos da queimada na Amazônia no Estado de Rodonia (Foto: Corpo de Bombeiros-RO) |
Nesta
semana, os olhos do mundo se voltaram para a Amazônia, após um aumento
significativo do número de queimadas na região em relação aos últimos anos. Os
dados, somados à polêmica criada pelo governo, semanas atrás, em relação ao
desmatamento na região, fizeram com que a destruição da floresta se tornasse
uma preocupação não só no Brasil – onde o presidente Jair Bolsonaro chegou a
ser alvo de panelaços na sexta-feira.
Depois
de Noruega e Alemanha anunciarem, na semana passada, o corte dos recursos que
destinavam ao Fundo Amazônia, criado em 2008 para financiar ações de
preservação do bioma, o presidente francês, Emmanuel Macron, disse que a
floresta seria um dos temas da reunião do G7 neste fim de semana. O presidente
Bolsonaro reagiu à fala do francês, a quem acusou ter "mentalidade
colonialista", mas também agiu internamente, criando um gabinete para
conter a crise e anunciando o envio das Forças Armadas para combater o fogo nos
estados que solicitarem ajuda.
Ainda
assim, Bolsonaro procurou minimizar a gravidade da situação, ressaltando que o
número de queimadas na região este ano está dentro da média dos últimos 15
anos. O dado do presidente está correto, segundo o Instituto Nacional de
Pesquisa Espacial (Inpe), o órgão cujos dados foram questionados pelo governo,
o que provocou a demissão de seu presidente, Ricardo Galvão. No site do Inpe,
vê-se que a região, nos meses de julho, apresenta uma média de 34.431 focos de
queimada. Em julho passado, sétimo mês de governo Bolsonaro, foram registrados
30.922.
Sinais
preocupantes
O
problema, apontam especialistas em preservação ambiental, é que, quando se
compara com os últimos anos, o início do governo Bolsonaro mostra uma
preocupante tendência de elevação tanto das queimadas quanto do desmatamento.
Desde 2012 que a Amazônia não registrava tantos focos de incêndio em julho
quanto neste ano. Além disso, entre janeiro e 21 de agosto, o Inpe registrou
75.336 focos de incêndio no Brasil. O número é 84% maior que o observado no
mesmo período de 2018. E, em relação ao desmatamento, o Inpe também apresentou
uma tendência de aumento, justamente o que motivou a troca de comando do órgão.
Especialistas
ouvidos pelo Correio dizem que esses dados são o primeiro resultado da política
ambiental do governo Bolsonaro, que, por meio do afrouxamento da fiscalização,
estimula a degradação da vegetação. Pós-doutor em economia e meio ambiente e
professor da Universidade Federal do Pará (UFPA), André Cutrim diz que grupos
locais, que antes se sentiam intimidados com a fiscalização, agora pressionam a
fronteira florestal.
"Quando
o presidente visita a região e manda um recado para os fiscalizadores
ambientais, dizendo que eles, por exemplo, não podem queimar os tratores de
desmatamento mesmo que isso seja previsto por lei, há um recado para os grupos
locais também. Ele basicamente diz que, se houver desmatamento na região, não
haverá punição", afirma Cutrim. "Para essas pessoas, não há qualquer
tipo de perspectiva de punição", acrescenta.
Um
exemplo do que diz Cutrim ocorreu em 5 de agosto, quando fazendeiros paraenses
realizaram o "Dia do Fogo". Segundo foi noticiado na imprensa local,
os produtores disseram que coordenaram as queimadas para "mostrar ao
presidente" que querem trabalhar.
Crise
internacional
Os
sinais que o governo brasileiro envia à comunidade internacional é outra fonte
de preocupação. Quando se mostrou empenhado a reduzir os índices de
desmatamento, o governo brasileiro contou com o respeito e o apoio, inclusive
financeiro, de outros países. O Fundo Amazônia, criado em 2008 e cortado agora
por Alemanha e Noruega, ajudou o Brasil a alcançar o menor índice de
desmatamento anual de sua história quatro anos depois, em 2012.
O
receio dos ambientalistas é que o atual governo ponha a perder um trabalho de
décadas, realizado por vários governos. Desde 1988, quando o Inpe passou a
contabilizar os dados, o desmatamento anual oscilava muito. Nos anos 2000,
porém, esses números saíram de uma média de 18,2 mil km² desmatados por ano e
ultrapassaram a casa do 20 mil km², chegando a 27,8 mil km² em 2004.
"Houve,
então, pressão internacional. E começou a ter uma queda quando entraram os
mecanismos de gestão ambiental, como fiscalização, rastreabilidade da cadeia
bovina e conscientização do produtor agrícola, que entendeu ser possível
desenvolver ganhos econômicos sem derrubar a floresta", conta Cutrim.
A
partir de 2004, os dados do desmatamento começaram a cair ano após ano, até chegar,
em 2007, a 11,7 mil km². O número voltou a oscilar em 2008, ano em que se deu
início ao Fundo Amazônia. A tendência de queda foi retomada, até que se chegou,
em 2012, a 4,6 mil km². Desde 2015, porém, os números voltaram a crescer, e o
temor é que patamares muito altos de desmatamento voltem a ser registrados.
Enquanto
o desmatamento cresceu, em junho, 66%, no mês seguinte, esse percentual
aumentou para 278%, em comparação com o mesmo período de 2018, segundo o Inpe.
Foram esses dados – que o governo contesta, mas não apresenta outra medição –
que levaram à demissão de Galvão e a declarações polêmicas de Bolsonaro, como a
de culpar ONGs pelas críticas e a de dizer que a Alemanha podia pegar o
dinheiro do fundo para recuperar as próprias florestas.
Para
Luiz Marques, professor do Departamento de História da Universidade Estadual de
Campinas (Unicamp), tais argumentos não se sustentam. Segundo ele, a Europa
passou por um processo de desmatamento, mas "ao longo de três mil
anos". "Foi um processo lento e de expansão da civilização. Nós
destruímos a nossa em 50 anos. E com esses incêndios, é capaz que tenhamos
números maiores. As pessoas acham que isso não tem consequências para a água,
para a biodiversidade, a segurança alimentar? É preciso ser muito louco para
não entender um fato desses", diz.
A
crítica às ONGs também parecem infundadas, para Marques. "Você acha que
tem alguma possibilidade de o Greenpeace, por exemplo, estar pondo fogo na
floresta? Eles só não querem acreditar que têm responsabilidade sobre isso e
querem pôr a culpa em alguém", argumenta.
Encruzilhada
histórica
Segundo
Marques, a Amazônia hoje está ameaçada por "toda uma arquitetura econômica
que pretende dar lucros imediatos". "Ou nossa sociedade é capaz de
reverter esse processo, ou vai causar consequências graves para a humanidade.
Estamos em uma situação de encruzilhada histórica que vai definir o destino da
humanidade dos próximos milênios", garante.
Na
avaliação de Cutrim, hoje, a maior esperança da Amazônia parece vir da pressão
internacional. "Talvez isso mude com (a ação dos) países europeus.
Inclusive porque eles fazem pressão com sanções econômicas e, quando dói no
bolso, a postura melhora", analisa.
Com
informações portal Correio Brasiliense
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