A
versão dada na última segunda-feira (29/07) pelo presidente Jair Bolsonaro para
o desaparecimento do militante de esquerda Fernando Augusto de Santa Cruz
Oliveira, morto em 1974 durante o regime militar, provocou reação de juristas e
entidades ligadas à anistia e direitos humanos.
Pela manhã, Bolsonaro disse que
poderia "contar a verdade" sobre o caso. À tarde, em live numa rede
social, acrescentou que Oliveira - pai do presidente da Ordem dos Advogados do
Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz - teria sido morto pelos próprios colegas do
grupo Ação Popular (AP).
Um
dos autores do pedido de impeachment da presidente cassada Dilma Rousseff, o
jurista Miguel Reale Jr. afirmou que Bolsonaro "tem de prestar
contas" das suas afirmações à Comissão de Mortos e Desaparecidos
Políticos, órgão vinculado ao atual Ministério da Mulher, da Família e dos
Direitos Humanos. Ex-ministro da Justiça no governo Fernando Henrique Cardoso,
Reale Jr. foi o primeiro presidente da comissão, cargo que ocupou de 1995 a
2001.
"A
primeira obrigação que o presidente da República tem com o órgão é fornecer os
elementos que ele conhece sobre o desaparecimento do pai do presidente da
Ordem. Ele deve fazer isso para a responsabilização do Estado, e não para se
vangloriar ou antagonizar com um inimigo político", disse ele.
Ainda
segundo Reale, o presidente está "dando continuidade" ao confronto
que se estabeleceu na época da ditadura.
"Para
ele, não houve a Constituição de 1988 e a anistia. Bolsonaro continua em
guerra. O caso dele não é de impeachment, mas de interdição. É uma pessoa que a
cada dia prejudica a si próprio. Ele tem que ser protegido. A característica do
louco é essa: prejudicar a si mesmo."
Ex-secretário
de Direitos Humanos do Ministério da Justiça e autor da Lei dos Mortos e
Desaparecidos (que reconhece os desaparecidos como mortos e a responsabilidade
do Estado nessas mortes), José Gregori também avaliou que Bolsonaro deve
explicações à comissão.
"Bolsonaro
se insurgiu contra a lei que foi aceita pelas Forças Armadas. Ele está indo
contra uma lei que é uma decisão soberana da nação brasileira", disse o
ex-secretário. Para Gregori, enquanto o presidente falava "amenidades sem
sentido", isso era visto como folclórico. "Enquanto eram amenidades,
o Brasil estava rindo, mas agora é sério. É preciso que se tomem medidas
judiciais", afirmou ele, lembrando que Oliveira estava entre os primeiros
44 nomes reconhecidos de imediato como mortos durante o período do regime
militar.
Aliado
de Bolsonaro nas eleições do ano passado, o governador João Doria (PSDB), cujo
pai foi exilado político na época da ditadura, também criticou a fala do
presidente. "É inaceitável que um presidente da República se manifeste da
forma com que se manifestou. Foi uma declaração infeliz", afirmou Doria,
em evento no Palácio dos Bandeirantes. "Não posso silenciar diante desse
fato. Eu sou filho de um deputado federal cassado pelo golpe de 1964 e vivi o
exílio com meu pai, que perdeu quase tudo."
Em
nota, a Anistia Internacional fala em "declarações duras" de
Bolsonaro e pede que o País "assuma sua responsabilidade". "É
terrível que o filho de um desaparecido pelo regime militar tenha de ouvir do
presidente do Brasil, que deveria ser o defensor máximo do respeito e da
justiça no País, declarações tão duras", escreveu a diretora executiva da
entidade no Brasil, Jurema Werneck.
"O
Brasil deve assumir sua responsabilidade, e adotar todas as medidas necessárias
para que casos como esses sejam levados à Justiça. O direito à memória,
justiça, verdade e reparação das vítimas, sobreviventes e suas famílias deve
ser defendido e promovido pelo Estado Brasileiro e seus representantes."
Também
em nota, o Colégio Nacional de Defensores Públicos Gerais (Condege) diz que
"o respeito entre as instituições e às pessoas é a base da democracia e o
que legitima a própria existência da República"
Com
informações portal O Povo Online
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