Em
mais uma declaração a não ser dita, de modo involuntário ou não, o presidente
Bolsonaro chamou o Nordeste de "Paraíba" e desferiu uma tacada contra
o governador do Maranhão, o comunista Flávio Dino. Para Dino, melhor
impossível. Para o presidente, um arranhão em plena região onde não demonstra
tanto traquejo assim e ainda lida com recall positivo do PT. O incômodo causado
pelo capitão estava embutido no tratamento pejorativo associado ao termo
"Paraíba" enquanto persona do migrante de baixa qualificação
profissional que vai daqui para o Rio de Janeiro. Tivesse criticado a própria
existência de Nordeste, aí sim, teríamos um bom debate. Discutir o que raios
vem a ser Nordeste, na perspectiva de que cada estado merece atenção própria
por serem dotados de identidade também única, seria um bom começo.
Lesse
o presidente o ensaio do professor emérito da Universidade Federal do Ceará
(UFC), Eduardo Diatahy Bezerra de Menezes, publicado na edição de 2010 do
Anuário do Ceará, poderia discutir, seja para discordar ou ratificar o conceito
à luz das anotações acadêmicas. Diatahy fala de um Nordeste histórico, sob viés
negativo. Um matulão de estereótipos. O professor não vê identidade neste
Nordeste ao qual fomos levados a naturalizar. Fala de como o conceito de
identidade é algo das ciências formais, das lógicas e das matemáticas.
"Formal porque eu não tenho um objeto real. A teoria é formal porque lida
com a forma como opera o pensamento. Você pode dizer que "dois é igual a
dois", que "A é igual a A". Na soma aritmética, você não pode
dizer que dois mais três é igual a quatro", comentara em Páginas Azuis do
O POVO a Henrique Araújo e Plínio Bortolotti, cinco anos depois do ensaio.
Para
o professor, a identidade funciona como princípio puramente formal. Mas sua
introdução no campo da história, da antropologia, da cultura provém de uma
concepção nazista, uma alofobia, medo do diferente, criando uma mesmidade que ele
define como "um absurdo, um paralogismo horroroso, dizendo mentiras e
besteiras, e todo mundo passa a repetir isso, porque quer mostrar que está up
to date". Ainda em 2015, dizia Diatahy que num congresso de sociólogos,
60% das manifestações falavam em identidades de todo tipo, inclusive disso que
chamam de "identidades nômades". "Se é identidade, como pode ser
nômade e como podem ser plurais?".
O
que caracteriza, então, uma região? Para Diatahy, o fator determinante é a
memória coletiva. "A memória é o grande acervo, tanto individual quanto
societário. É o estoque simbólico de cada época. Você tem dezenas de adjetivos
para caracterizar uma cultura e um povo. Configuração, perfil, singularidade
caráter, etc. Mas identidade vem de idem, em latim - o mesmo. Você permanece o
mesmo? Não. É como dizia Heráclito: ninguém toma banho duas vezes no mesmo rio.
A singularidade de um povo, de uma cultura, é contrastiva...".
Então
haveria uma distinção marcante do Nordeste em relação ao restante do País?
Respondia o professor: "Até os anos 1920, não existia essa noção (de
Nordeste). Isso começa na seca de 1919, quando São Paulo estava montando, desde
o início do século, a sua hegemonia sobre o resto do País. A maior cidade e o
maior acervo cultural do Brasil era a Corte, o Rio de Janeiro. A partir de
1900, os paulistas criam um neobandeirantismo. Daí em diante, isso começa a se
estruturar como ideologia". Prossegue: "A eles se juntou Gilberto
(Freyre), que, por sua vaidade, inventa, em 1925, uns simpósios muito reacionários.
Gilberto era um mentiroso emérito (risos), mas de um talento extraordinário e
de uma cultura monumental porque passou sua vida lendo (risos). Em 1925,
Gilberto publica uma edição do centenário do Diário de Pernambuco, sobre o
Nordeste, porque ele queria impor o predomínio de Pernambuco. Quer dizer, há
uma construção ideológica e política dessas noções. Depois, os dispositivos
dominantes estabeleceram o novo perfil e nos tornarmos nordestinados."
Diatahy
arremata: "Qualquer porcaria que se produza no eixo Rio-São Paulo é
nacional. Quando é aqui, é provinciano, é regional e local. É nesse sentido que
eu digo que a gente mora na fronteira da Tchecoslováquia, que nem existe
mais".
Tivesse
o presidente da República mexido neste vespeiro histórico, estaríamos nós a
debater alguns andares mais altos o que vem a ser Nordeste, uma coisa amorfa na
vida real, a existir apenas na poesia e na busca por recursos do BNB - até pela
Bahia, que no fundo é só Bahia mesmo. Mas não, caiu no estereótipo rasteiro.
Tão raso quanto a reação imediata, bem intencionada, mas tacanha. Não faltou
hashtag para foto de terra rachada, velhinhos pobres a capinar com enxada,
saquinhos de farinha e de feijão, cajuzinhos e até foto de cangaceira, sempre
com cactos ao fundo. Tudo aquilo que reforça o estereótipo primário que
estariam a execrar. Nada de ciência em laboratórios, agronegócio vigoroso na
fruticultura, medicina de ponta, cases na B3 ou na Nasdaq. Reparou? De boa
intenção o "Nordeste" está cheio.
Publicado
originalmente no portal O Povo Online
Bolsonaro sempre foi conhecido por falar bobagens sem pensar primeiro nas repercussões que estas palavras bobas causa. Que ele tem magoas da região nordeste por ter perdido pra seu adversário nas eleições passadas isso qualquer hum que tivesse no seu lugar agiria da mesma forma só que não falaria pra não causar estas noticias bobas. Lula quando presidente nunca foi aceito pelo a região sul do país mais ele experto como sempre foi nunca deixou demostrar a sua magoa para com a região.
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