Visita oferece muitas lições a Bolsonaro (Foto: JIM WATSON/AFP) |
A
diplomacia tem sido talvez a área mais controversa do governo Jair Bolsonaro
(PSL), e olha que a disputa é acirradíssima. Causou muita, mas muita polêmica
mesmo a decisão do Brasil de liberar visto de entrada no País para visitantes
de Estados Unidos, Japão, Austrália e Canadá. A posição não exige
reciprocidade. Porém, muito mais complicada foi outra decisão que, essa sim,
exigiu reciprocidade. O Brasil recebeu um aceno e abrirá mão de algo que é
importante para os exportadores. Cria problema econômico em nome de uma certeza
que, se concretizada, não terá a mesma relevância.
O
Brasil pediu apoio para ingressar na Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE). Donald Trump ofereceu, mas, em troca pediu
que o Brasil abrisse mão do status de país emergente na Organização Mundial do
Comércio (OMC). Essa condição garante uma série de privilégios aos países nas
negociações internacionais. Sabe quem tem status de emergente? China. Quem
mais? Coreia do Sul. Outro? Índia. Desde Barack Obama, a Casa Branca quer rever
essa condição. Agora, o Brasil abrirá mão dela, de forma gradual, em troca de
quase nada. O Brasil deixará a condição de emergente. A China não. Faz sentido
para você?
O
que o Brasil terá em troca? Não, não é a vaga na OCDE. Os Estados Unidos não
decidem isso sozinho. A Casa Branca não vetará, dará apoio. Mas, isso não
garante nada. Se fosse a vaga certa, a troca já não seria vantajosa. Mas, nem
isso é.
Por
mais pragmatismo
De
volta à isenção do visto, algo mais palpável para a maioria da população. Sobre
essa posição, acho que ela faz sentido. Verdade que rompe uma tradição da
diplomacia no Brasil, e não apenas. É uma tradição diplomática no mundo.
A
política do ministro Ernesto Araújo já sinaliza o abandono de outros princípios
que norteiam a diplomacia brasileira desde o barão do Rio Branco. Outros mais
devem ser rasgados.
Porém,
não acho despropositada a isenção do visto. A reciprocidade é um princípio de
altivez. Algo imprescindível. Porém, se começa a jogar contra, torna-se burrice.
O setor do turismo acredita que pode se favorecer da vinda dos turistas. A
eventual isenção de vistos desses países não tem servido de pressão para que
eles também liberem vistos e cria empecilho para a atração de turistas ao
Brasil. O País ocupa posição ridícula, frente ao potencial, no ranking mundial
do turismo. Então, observando pragmaticamente, do ponto de vista dos
resultados, acho que faz sentido a isenção de visto. Embora, do ponto de vista
do brio, possa soar humilhação.
O
problema é que esse pragmatismo não tem sido a regra na diplomacia brasileira.
De jeito nenhum. Pelo contrário, há ideologização de muitas posições. A questão
OMC/OCDE é um exemplo. Outro é a anunciada transferência da embaixada
brasileira em Israel de Tel-Aviv para Jerusalém. Na contramão de toda a
comunidade internacional, fora a Casa Branca. A que interesses atende, fora o
lobby da bancada evangélica? Em que isso contempla economicamente os interesses
brasileiros? Pelo contrário, desagrada mercado consumidor árabe, algumas vezes
maior que o israelense. Em que isso interessa aos problemas da população
brasileira?
Entendo
que o Brasil deve agir de forma pragmática e de olho nos seus interesses.
Porém, o gesto soou mesmo como isso e mais como sinal de gentileza, se não
subserviência, à Casa Branca.
A
diplomacia brasileira tem agido com instintos, com o fígado e sinais de
amadorismo. Lida com a diplomacia mais profissional do mundo. Tenho dúvidas se
os sinais serão retribuídos. Se não serão percebidos como deslumbre.
Trump
até disse que pensa em facilitar vistos para brasileiros. Não disse liberar,
mas facilitar. Algo improvável diante de sua política. Porém, observe o que ele
disse: "Também estamos pensando em facilitar os vistos, mas o comércio que
temos com o Brasil não é tão bom como deveria ser. Temos de trabalhar para que
seja o melhor possível".
Ou
seja o Brasil entregou de bandeja algo com o que o Estados Unidos diz pensar
oferecer menos, mas em troca de algo. E, convenhamos, algo que nem sei se os
Estados Unidos valorizam tanto.
Bolsonaro
está deslumbrado com os Estados Unidos. Poderia tirar algumas lições. O
profissionalismo da diplomacia, por exemplo.
Publicado
originalmente no portal O Povo Online
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