Donata Meirelles em ensaio para sua festa de aniversário (Foto: Instagram/Reprodução) |
Há
imagens que falam mais que mil palavras, é sabido. A fotografia da então
diretora da Vogue, Donata Meirelles, comemorando seu meio século de vida,
sentada em uma cadeira "Sinhá", cercada por negras, em pé,
caracterizadas como "baianas", é uma delas. Muitos foram os que ali
enxergaram (e se horrorizaram com) uma representação do Brasil Colônia e
escravocrata. Mais que isso, viram o enaltecimento da superioridade da senhora
de escravos, ante suas mucamas. Para Donata e os seus, um grande engano.
Tratava-se, na verdade, de uma referência ao Candomblé. E a cadeira era de uma
mãe de santo.
Argumentos
insuficientes para convencer a turba que se indignou nas redes sociais.
Condenada pelo tribunal virtual, Donata pediu desculpas. Não bastou. E não por
questões humanitárias. "É a economia, estúpido!", explicaria James
Carville, o famoso assessor de Bill Clinton. O escândalo tornou nocivo qualquer
vínculo à Vogue. Patrocinadores do Baile de Carnaval da revista, principal
evento anual da publicação, ameaçaram sair em debandada. Donata pediu demissão.
O Baile, que ocorreria no próximo dia 21, foi adiado. Passado o furdunço, o
caso merece uma reflexão.
A
sanha dita conservadora que varreu o País nos últimos meses deixou a impressão
que todos os pudores civilizatórios foram abandonados. Que vivemos,
descaradamente, tempos em que o desrespeito e o tripúdio da diferença
tornaram-se um novo credo.
Os
que se fiaram na chegada desta "nova velha era" subestimaram a
capacidade de reação dos que, aparentemente, tiveram a derrota como sina. Por
óbvio, o País segue cindido. O "caso Donata" explicita isso. E aos
que ignoram a 3ª Lei de Newton, lembro de um dos mais emocionantes trechos do
Monólogo do Veneno, do clássico "Gota D'Água" (1975), de Chico
Buarque e Paulo Pontes:
"Eles
pensam que a maré vai, mas nunca volta. Até agora eles estavam comandando o meu
destino e eu fui, fui... Fui recuando, recolhendo fúrias. Hoje eu sou onda
solta e tão forte quanto eles me imaginam fraca. Quando eles virem invertida a
correnteza, quero ver se eles resistem à surpresa, e quero saber como que eles
reagem à ressaca".
Publicado
originalmente no portal O Povo Online
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