Cada dia da semana, em um bairro diferente, as feiras livres de frutas e verduras persistem como comércio forte na área de hortifrúti (Foto: Tatiana Fortes) |
"Antes
eu pensava que feira livre era só porque vendia barato, mas não é. É porque a
feira é livre mesmo, não tem porta de saída e nem de entrada". Essa é a
lição de quem trabalha há mais de 50 anos em feiras livres pelos bairros de
Fortaleza. Todos os dias, às cinco horas da manhã, seu Manoel Alves da Rocha,
74, vai a uma feira diferente preparar os produtos. Quando era dono de barraca,
a saga se iniciava ainda mais cedo. Enquanto debulhava o feijão que saía
fresquinho da baja, ele explicava que a negociação nesses locais é feita de
muitos elementos.
Além
do frescor dos produtos, variedade, preço baixo e capacidade de negociação, a
sociabilidade é outro fator definidor daquele ambiente. Todos os dias, por
volta das duas da madrugada, os feirantes chegam à Ceasa em busca de novos
produtos. Geralmente a partir das 6h30min as bancas já estão supercoloridas com
pimentões, tomates, batatas e cenouras.
Mais
que expor, o processo de venda nas feiras depende um tanto da sedução. Há algo
de sinestésico na compra. Provar a manga cortada na hora, apalpar os limões e
sentir a casca mais lisa, o perfume do cheiro-verde.
Raquel
Carvalho, 31, cirurgiã dentista, é presença confirmada todas as quartas-feiras
no Bairro de Fátima. Na esquina das ruas Dom Sebastião Leme com Carlos Ribeiro,
as bancas ocupam os dois lados da via e os feirantes já a conhecem. "Eu
sempre venho aqui porque acho os produtos mais frescos. Como tem esse hábito de
trazer da Ceasa sempre, eles já fazem essa pré-seleção da qualidade",
avalia.
Conforme
ela, o preço final também é mais em conta, apesar de haver fixação de valores
em alguns itens. "No supermercado eu compro o tomate a R$ 7,98 o quilo.
Aqui, eu consigo comprar a R$ 4. Mas, às vezes, há ofertas no supermercado em
que a cebola chega a R$ 1 o quilo, e aqui continua R$ 4", pondera.
Ver
dona Margarida Reis passeando na feira com a sacolinha debaixo do braço também
é sinal de saúde. "Só deixo de vir se tiver doente". Enquanto
pechinchava o preço da espiga de milho, ela contou ao O POVO que não revelaria
a idade, mas deixou escapar que os anos vividos são muitos. Os amigos feirantes
especulam que já passa dos 80.
Por
falar em pechincha, seu Manoel diz que essa é justamente outra das vantagens
neste tipo de comércio. "É que supermercado ninguém sabe nem quem é o
dono. Aqui, se quiser brigar com o feirante você briga", sorri.
Além
dos hortifrutis mais consumidos, muitas pessoas também frequentam os
estabelecimentos para encontrar produtos regionais. Todas as quintas-feiras é o
dia da feira do Mucuripe. No local, as bancadas resguardavam também murici,
sapoti e tamarindo. Com venda herdada da mãe, Maísa Barbosa, 47, escolheu
comercializar produtos característicos da terra como o queijo coalho, a paçoca
e a carne de sol.
Além
de decorar a barraca com toalhas quadriculadas, ela aposta na excelência do
atendimento com o uso de aventais e máquina de cartão de crédito. Uma das
únicas a fazer este tipo de venda no local. "Se todos os feirantes
aceitassem, atrairia muito mais gente", aposta.
João
Lima é cozinheiro, trabalha como articulador de gastronomia e também é presença
garantida em feiras pela Cidade. Conforme ele, a tradição é o principal
atrativo. "Na feira a gente consegue valorizar a origem real do
produto".
Conforme
ele, além do processo de negociação, a ida à feira é um resgate da cultura
alimentar de um povo. "Você tem a oportunidade de conversar com o
feirante, de aprender uma dica ou outra de como faz aquele determinado produto,
se um feijão está bom pra cozinhar, se coloca só maxixe ou se o quiabo vai
junto. Então, para mim, a feira não é só comprar o produto. É entender um
contexto da realidade do nosso campo e do nosso povo".
Com
informações portal O Povo Online
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