A
coluna comentou ontem a ascensão do DEM como força dominante no governo Jair
Bolsonaro (PSL). Maior que ela só tem uma: os militares. De 13 ministros
escolhidos até agora, nada menos que cinco têm relação com as Forças Armadas.
Há dois generais: Augusto Heleno (Segurança Institucional) e Fernando Azevedo e
Silva (Defesa).
O astronauta Marcos Pontes (Ciência e Tecnologia) é
tenente-coronel da reserva da Força Aérea. Mantido no Ministério da
Transparência e Controladoria-Geral da União (CGU), Wagner de Campos Rosário é
graduado em Ciências Militares pela Academia das Agulhas Negras.
Ontem,
para o Ministério da Educação, foi anunciado o filósofo colombiano naturalizado
brasileiro Ricardo Vélez Rodríguez, professor da Escola de Comando e Estado
Maior do Exército.
Estas
são, até agora, as principais características da equipe de Bolsonaro: militares
e gente do DEM. Parece o Brasil dos anos 1980.
No
Facebook, o futuro ministro disse essa semana o que considera a primeira coisa
a ser feita na educação: "Em primeiro lugar que se limpe todo o entulho
marxista que tomou conta das propostas educacionais de não poucos funcionários
alojados no Ministério da Educação. Isso para início de conversa".
Discurso
que parece saído da Guerra Fria. Vamos deixar uma coisa clara: escola é lugar
de ideias. O marxismo é uma das correntes filosóficas mais importantes dos
últimos séculos. Não pode ser varrido de sistema educacional algum. Nem ele nem
o positivismo, a fenomenologia, o liberalismo, niilismo, estruturalismo,
existencialismo, pós-modernismo, física quântica. Tudo isso precisa estar nas
nossas escolas e universidades.
Questão
ideológica e o veto ao ministro
As
notícias - que não se confirmaram - da escolha de Mozart Neves Ramos para
ministro da Educação causou muito incômodo na bancada evangélica, conforme
mostrou a Folha de S.Paulo.
Não
se trata de perfil polêmico, em tese. Foi secretário da Educação de Pernambuco
no governo Jarbas Vasconcelos (MDB). Foi reitor da Universidade Federal de
Pernambuco (UFPE) e presidiu a Associação Nacional dos Dirigentes das
Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes). Não se trata de entidade
propriamente radical. Seria sugestão de Viviane Senna, com quem trabalha no
Instituto Ayrton Senna.
Mozart
é visto como moderado e alguém com trânsito entre a esquerda e a direita. Isso
aparentemente minou suas chances. O Brasil está de um jeito que pessoas com
trânsito, aceitas em diferentes espectros, são implodidas.
O
problema central com ele seria a falta de vínculos com o projeto Escola sem
Partido. Para muitos dos partidários de Bolsonaro, a única questão relevante na
educação é esta. Se as pessoas sabem ler, escrever, se fazem contas ou se a
universidade produz ciência, isso tudo é menor. Enxergam uma miragem e se
assombram com ela.
A
Folha publicou declaração reveladora do deputado federal Sóstenes Cavalcanti
(DEM-RJ), integrante da bancada evangélica. Queixoso da eventual escolha de
Mozart, ele disse: "Para nós, o novo governo pode errar em qualquer
ministério, menos no da Educação, que é uma questão ideológica para nós".
Muito
transparente e verdadeira a declaração de Sóstenes. O Escola sem Partido não é
um processo de desideologização. Não é ausência de ideologia. É ideológico, sim
senhor. Importante isso ficar claro.
E
não significa que seja ruim. Pelo contrário. Ideologia significa a defesa de
ideias, princípios. De um conjunto de concepções. É da essência da política.
Ruim é um monte de gente por aí que não acredita em coisa nenhuma e pode
defender qualquer coisa se for bem recompensado. O que tem de deputado que
apoiou o governo Lula, apoiou o governo Temer, apoiará o governo Bolsonaro e
qualquer outro que venha a seguir? Essa é a falta de ideologia. É bom? É não.
Talvez
pior que falta de ideologia só mesmo quem tem, mas quer fingir que não.
Publicado
originalmente no portal O Povo Online
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