Jair
Bolsonaro (PSL) foi recebido por multidão em Fortaleza. Em todas as pesquisas,
o Nordeste é a região na qual ele se sai pior. Na CNI/Ibope divulgada ontem,
ele tem 7% na região no cenário com Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e 10% na
simulação sem o petista. Entre os nordestinos, fica atrás de Marina Silva
(Rede) e Ciro Gomes (PDT), além do próprio Lula. Mesmo assim, sobretudo em
capitais, tem apoiadores o bastante — e suficientemente mobilizados — para
promover atos como o de ontem.
Ele está em Fortaleza, território de Ciro,
porque precisa crescer na região. Desde 1989, quem vence no Nordeste vence no
Brasil. Mesmo mal nas pesquisas na região, ele deu demonstração de força no
Estado nordestino mais difícil para qualquer candidatura que não seja de Ciro
ou Lula. Como explicar esse apelo, essa capacidade de mobilizar,
particularmente jovens?
Para
entender Bolsonaro, é necessário compreender o momento que vive o Brasil. É
tempo de paixões e iras arrebatadoras, irracionais. De polarizações, caça às
bruxas, quase nenhuma disposição de diálogo. Nesse cenário exacerbadamente
emocional, cria-se o ecossistema anaeróbico no qual esse tipo de candidatura
pode proliferar. Num cenário de decisões tomadas pela racionalidade, jamais
alguém com tal perfil e semelhante discurso chegaria aos dois dígitos. Talvez
não saísse do traço. No panorama em que cá estamos, eis a situação do
postulante do PSL.
Só
uma coisa explica a força de Bolsonaro: o ódio. As pessoas estão com raiva,
querem gritar, escrever em caixa alta nas redes sociais. O pré-candidato do PSL
personifica como ninguém essa coisa revoltada, sem rumo ou lógica. Nada mais
emblemático do Brasil do que os haters — odiadores, em tradução livre. As
pessoas que ocupam os comentários no Facebook e afins para exalar manifestações
furiosas e sem critério. Bolsonaro é o candidato esculpido e acabado para
atender aos haters.
A
simpatia por ele é explicada por aquilo que ele combate. O PT passou 13 anos no
governo, essa geração se formou não conhecendo outro partido no poder. A
perpetuação nos cargos cobra seu preço, sempre cobrou. Um deles para os
petistas foi o desgaste profundo do partido e da própria esquerda. Então, muita
gente vota nele porque combate furiosamente qualquer inclinação progressista. (Quando
Lula foi eleito, Bolsonaro foi até a residência oficial fazer lobby, defender
indicações para cargos e disse que não tem problema nenhum com comunista...).
Ele
emerge, também, enquanto ganham força movimentos contra machismo, racismo e por
direitos das populações LGBTI. Apoiadores de Bolsonaro transitam entre os que
acham que tudo isso é chatice e “mimimi” até os que praticam diretamente as
opressões que esses grupos combatem. E Bolsonaro abraça esse discurso. Acha que
não existe privilégio, que seguranças de shopping não vigiam garotos negros
quando entram nas lojas, que mulheres não escutam todo tipo de absurdo —
assédio, em bom português — quando andam na rua ou vão a uma festa. Que gays
não são ofendidos, ridicularizados ou agredidos.
Afora
aqueles que Bolsonaro combate, a candidatura não oferece rigorosamente nada. Um
deserto de ideias, formulação. Está reunido nele o combo explosivo de
personalismo, autoritarismo, uso político da religião. Abraçou um pensamento
econômico liberal alguns meses atrás, ao perceber que é a moda entre os
conservadores tupiniquins. Pouco importa que seja o oposto do nacionalismo
estatista que ele próprio apregoou a vida toda. (Estão a um Google de distância
os elogios que fez quando Hugo Chávez chegou ao poder na Venezuela).
Em
educação, saúde, ciência e tecnologia, meio ambiente, Bolsonaro é de uma aridez
saariana. Cultura, meu Deus do céu. A entrevista coletiva de ontem teve tons de
galhofa. A força de Bolsonaro é incontestável e as questões que suscita vão
além da eleição. Ela é sintoma do estado de coisas, da mentalidade
estabelecida, do momento em que o Brasil está.
Publicado
originalmente no portal O Povo Online
Nenhum comentário:
Postar um comentário
A Administração do Blog de Altaneira recomenda:
Leia a postagem antes de comentar;
É livre a manifestação do pensamento desde que não abuse ou desvirtuem os objetivos do Blog.