Os eleitores ainda sem candidato podem definir o
próximo presidente do País. Ou da próxima. De acordo com o Datafolha, eles
chegam a 34% dos eleitores consultados na semana passada – em cinco dos nove
cenários de 2º turno testados pelo instituto sobre intenções de voto para a
corrida presidencial, atingem percentual maior que o do primeiro colocado.
Para
cientistas políticos e estudiosos ouvidos pelo jornal O POVO, trata-se de um exército
de desalentados, cidadãos brasileiros desiludidos para os quais os
pré-candidatos ao Planalto que se mostraram até agora – mais de uma dúzia – não
podem representá-los.
O
mesmo vale para o Congresso, malvisto por todos e sob desconfiança crescente de
uma fatia expressiva da população.
Nos
últimos dias, a reportagem foi às ruas procurar os rostos por trás de um dos
maiores índices de intenção de votos brancos, nulos ou sem candidatos já
registrados pelo Datafolha em suas séries históricas desde a
redemocratização.
Para
seis das pessoas com as quais jornal O POVO conversou, a falta de um postulante a
quatro meses das eleições não é mera indecisão.
Deve-se
a fatores que vão da percepção da corrupção à deterioração do cenário
econômico, passando por descrença nos políticos e dúvida acerca da capacidade
de o futuro presidente governar sem ceder ao fisiologismo da Câmara dos
Deputados e do Senado.
Esse
coquetel de desamparo, no entanto, inclui mais ingredientes além da usual dose
de confiança quando se trata de ir às urnas para escolher o governante da
nação.
Economista,
Mário Leitão, 37 anos, pede licença para dizer uma palavra mais áspera: “É
tanta sacanagem no dia-a-dia do brasileiro.
As
pessoas não suportam mais a política. Ainda não escolhi candidato por uma
dificuldade mesmo: desinteresse. E isso só fez piorar desde o impeachment.”
Segundo
ele, a destituição da presidente petista abriu uma caixa de Pandora.
Se
Mário ainda não encontrou “um candidato que represente a mudança”, o
comerciante Robério Feijó Ribeiro, 57, até andou pensando num postulante, mas
logo desistiu quando se informou um pouco mais sobre a vida do dito-cujo.
“E,
além disso, o presidente não vai governar sozinho. Depende do Senado, do
Congresso, que é politiqueiro. Então não adianta nada”, responde. Para ele, a
gestão Dilma também é um divisor de águas, mas para o pior: “A vida ficou muito
ruim desde a eleição da Dilma. Acho que os problemas começaram ali, com aquela
vitória. Perdi totalmente as esperanças”.
Cientista
político e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo,
Rodrigo Prando relativiza o peso dessa desesperança do eleitorado que se traduz
na falta de um candidato faltando tão pouco tempo para as convenções
partidárias.
Prando
afirma que há duas dimensões a considerar nesse fenômeno captado pelo Datafolha
e confirmado em eleições que foram realizadas recentemente em municípios
brasileiros nas quais o grau de abstenção foi muito alto.
A
primeira: “Não há um cenário definido, ou seja, os candidatos não foram
colocados. Muitos são balões de ensaios. E o eleitor não se preocupa tanto
antecipadamente, mas na véspera”, afirma o cientista.
O
segundo aspecto por trás do exército dos sem-voto, defende o pesquisador, se
explica por um fator subjetivo: o humor do brasileiro. “A política está
desacreditada e os políticos, desgastados”, analisa ele. “Fora isso, tem a Lava
Jato”, continua, “e esse quadro de descrédito acaba piorando o humor, que ainda
não está propenso a pensar no cálculo eleitoral”.
Professora
da Universidade Federal do Ceará (UFC) e integrante do Laboratório de Estudos
sobre Política, Eleições e Mídia (Lapem) da instituição, Monalisa Soares
adiciona ainda uma variável ao caldo: a potencial ausência da candidatura do
ex-presidente Lula (PT).
“A
prisão do Lula, mesmo tendo muita adesão do eleitorado mostrada no Datafolha,
coloca um cenário de instabilidade para o eleitor. Mesmo tendo preferência, as
pessoas vão percebendo que a candidatura é inviável”, afirma a professora.
Líder
das pesquisas de intenção de voto nos cenários em que seu nome é submetido ao
eleitor – derrota todos os adversários nas simulações de 2º turno –, o petista,
condenado a 12 anos de prisão por crimes investigados na Lava Jato, deve ter
sua postulação barrada pela Lei da Ficha Limpa.
Monalisa
assegura que é preciso ter cautela ainda para avaliar o “tamanho do impacto
desse desgaste do eleitor”, sentimento que está na base das justificativas de
muitas das pessoas que declararam ainda não ter escolhido um postulante.
Prando
concorda: é cedo ainda para qualquer análise de cenário. “O que pode acontecer
é que, com o quadro definido, os brancos e nulos diminuam”, diz. “Mas pode ser
também que, mesmo com os candidatos definidos, esses brancos e nulos
permaneçam. Vamos precisar esperar pra saber.”
Publicado
originalmente no portal O Povo Online
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