Há
uma coisa que me gera estranheza na estrutura de funcionamento dos julgamentos
no Brasil, especialmente estes que acontecem nos últimos tempos sob os
holofotes e as luzes televisivas.
Algo que vi repetido e reafirmado ontem no
Superior Tribunal de Justiça (STJ), quando a 5ª Turma se reuniu, sob os olhares
curiosos do País, para decidir sobre um pedido de habeas corpus preventivo do
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no caso em que o TRF-4, de Porto
Alegre, está para lhe aplicar, em caráter conclusivo, uma sentença de 12 anos e
1 mês de prisão pela acusação de ser proprietário de um triplex do Guarujá, em
São Paulo, que teria sido adquirido com dinheiro desviado da Petrobras. Na verdade,
a confirmação de pena originalmente aplicada pelo juiz da 13ª Vara Federal do
Paraná, Sergio Moro.
Bom,
mas voltando à estranheza, que imaginei até outro dia que era fruto de uma
pessoal ignorância jurídica, de novo assisti, ontem, julgadores chegarem com
seus votos prontos. A sustentação oral do experiente advogado José Paulo
Sepúlveda Pertence, ministro aposentado e ex-presidente do Supremo Tribunal
Federal (STF), foi acompanhada com atenção pelos cinco ministros do STJ, mas,
na hora do voto de cada um, solenemente ignorada.
O que vale, no meu
entendimento, uma pergunta: de que serve abrir espaço para um profissional ir à
tribuna, se dirigir aos julgadores, tomar um tempo da seção, sem que aquilo
gere qualquer efeito prático? É impossível que aqueles argumentos sejam
considerados porque a resposta, logo depois, vem através de um voto previamente
elaborado.
Percebi
que não é uma dúvida necessariamente ligada ao desconhecimento jurídico quando,
após o julgamento do recurso do mesmo Lula à sentença de Moro lá no TRF-4, em
Porto Alegre, a ouvi manifesta pelo advogado britânico Geoffrey Robertson, que
atua em favor do petista em causas internacionais e foi autorizado a acompanhar
a sessão de Porto Alegre.
Um dos aspectos mais estranhos a ele, conforme expressou
alguns dias depois daquele evento, acontecido em 24 de janeiro, foi o fato de
os três desembargadores terem chegado já com suas decisões prontas e escritas.
Sem qualquer chance de revisão, tornando inócuo, na sua avaliação, o debate que
foi ali observado.
É
evidente que a experiência da banca de advogados que defende Lula, agora mais
reforçada com a presença de Sepúlveda Pertence, permite imaginar que não havia
da parte deles expectativa otimista sobre o que poderia acontecer ontem em
termos de reversão de uma tendência natural no caminho aberto pela decisão do
juiz Sergio Moro, que é de levar o petista à prisão.
Agora, como demonstrou
chocado um profissional de Direito que já atuou em vários países e conhece a
dinâmica natural desses momentos, acaba sendo ruim se perceber que o debate é
negligenciado. A situação acaba gerando desconforto para quem gostaria de maior
garantia quanto à aplicação de uma sentença que realmente considere com a força
devida, ou a fraqueza, todos os argumentos e contra-argumentos
apresentados.
O
caso que envolve Lula tem suas complexidades próprias, mas a reflexão sobre o
modelo de funcionamento da Justiça vai muito além dele. Ao próprio sistema
deveria interessar a aplicação de mudanças suficientes para afastar de todo o processo
qualquer sentimento de que há um mero jogo de cena por trás de um julgamento.
Qualquer que seja.
Publicado
originalmente no portal O Povo Online
Nenhum comentário:
Postar um comentário
A Administração do Blog de Altaneira recomenda:
Leia a postagem antes de comentar;
É livre a manifestação do pensamento desde que não abuse ou desvirtuem os objetivos do Blog.