Conhecido
como o tempo de extravasar, o Carnaval se transformou no palco natural para as
manifestações políticas e sociais que se avolumam no Brasil de agora. Em
fantasias e marchinhas; no sambódromo ou na rua, a política pauta a festa e
enseja protestos nos principais polos carnavalescos do País.
No
Rio de Janeiro, uma das cidades-símbolo do Carnaval brasileiro, pelo menos
cinco das 13 escolas de samba do grupo especial vão levar para a avenida
enredos com algum tipo de manifestação política. A mais ousada delas é a
Paraíso de Tuiuti que, no contexto da reforma trabalhista, questiona se a
escravidão acabou, de fato, no País. Uma das alegorias da agremiação é formada
por um vampiro vestido de terno e de faixa presidencial ladeado de sacos de
dinheiro e carteiras de trabalho, em alusão ao presidente Michel Temer (MDB).
O
prefeito Marcelo Crivella (PRB) também é alvo de críticas em enredos como a da
Mangueira, que reivindica o direito de continuar a festa carnavalesca mesmo sem
dinheiro público. Crivella anunciou que vai reduzir as verbas destinadas às
escolas de samba, o que afetou os ensaios técnicos e gerou protestos dos
grupos.
Para
o historiador André Diniz, compositor da Vila Isabel, os acontecimentos trazem
de volta a visão crítica que era comum no Carnaval carioca desde as primeiras
manifestações e foi se perdendo à medida que as festas dependiam de apoios
políticos. “As escolas de samba tinham compromisso com a agenda política. Isso
foi abandonado por mais de 20 anos”, comenta.
Em
São Paulo, a decisão do prefeito João Dória (PSDB) de criar um decreto que
determina horários e trajetos dos blocos paulistas também causou tensão entre
os foliões. Pelo menos cinco blocos excluídos do circuito se organizam para
levar a festa para as ruas mesmo sem a autorização da Prefeitura. O prefeito
também foi alvo de críticas em marchinhas de Carnaval. Na música deste ano do
Bloco do Fuá, Doria é chamado de “prefake” (do inglês, falso).
No
último fim de semana, o Bloco do Baixo Augusta também foi marcado por protestos
contra atitudes machistas, racistas e LGBTfóbicas, além de reunir, ao longo do
desfile, gritos de “fora, Temer”.
A
cientista política Paula Vieira, do Laboratório de Estudos sobre Política,
Eleições e Mídia (UFC), defende que o tensionamento político que o Brasil passa
deixa ainda mais evidentes essas manifestações em festas como o Carnaval.
“Antes, as discussões não tinham tanto essa polarização, as discussões políticas
eram menos evidentes. Hoje, está mais demarcado seja pró ou contra o Lula, seja
pró ou contra o Judiciário”, exemplifica a pesquisadora.
Ela
analisa ainda que, em se tratando de uma festa popular, é natural que ela traga
alguns elementos que fazem parte da discussão do momento. “É um bom termômetro
para ver a opinião pública”, acrescenta.
O
historiador André Diniz dialoga ao dizer que o Carnaval, em essência, toca em
questões políticas e sociais, no contexto carioca, mas também em outros espaços
brasileiros. “Se tem uma coisa séria no Brasil é o Carnaval”.
Psicóloga
e integrante do bloco cearense Damas Cortejam, que trata da temática feminista,
Sâmara Gurgel entende a festa como espaço para a crítica e para deslocamento de
visões. Para ela, a festa permite o diálogo. “O Carnaval pode ser espaço também
para falar e mostrar posição. Acredito nisso”, define.
Com
informações portal O Povo Online
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