13 de janeiro de 2018

"Bolsonaro 2018, Ciro 2002" por Érico Firmo


Jair Bolsonaro (PSC-RJ) fez daqueles atos capazes de destruir uma candidatura. Pelo menos foi assim no passado. O Brasil se acostumou a ouvir absurdos. Até há pouco tempo, candidatos tinham discurso e imagem medidos, calculado por publicitários. Como esquecer da construção do “Lulinha paz e amor” por Duda Mendonça, da Carta ao Povo Brasileiro? Bolsonaro, por outro lado, cresceu com disparates. Acostumou seu eleitor a absurdos e assim ganhou projeção. Conteúdo bizarro costuma ter plateia em alguns ambientes online.

A questão é se Bolsonaro poderá seguir falando o que bem entender ou se há um limite de tolerância. Questionado sobre os gastos com auxílio-moradia, apesar de possuir residência própria em Brasília, o deputado que quer ser presidente respondeu à repórter de forma grosseira, agressiva. De maneira que pretendeu ofender. “Como eu estava solteiro naquela época, esse dinheiro de auxílio-moradia eu usava pra comer gente, tá satisfeita agora ou não? Você tá satisfeita agora?”. Ele respondeu assim a uma mulher. Não sei se falaria desse modo caso o entrevistador fosse um homem.

Por menos que isso, candidato com chances reais de vitória já despencou miseravelmente. Estou a pensar em Ciro Gomes em 2002. Ele chegou a ganhar ares de quase favorito em determinado momento. Foi destruído por uma fala grosseira, machista, agressiva. Ao lado de sua então esposa, Patrícia Pillar, ele foi questionado por jornalista sobre qual o papel dela na campanha. Pergunta fácil, feita para o candidato deitar e rolar. Podia falar do grande trabalho dela, do papel cultural, da inteligência. Saiu-se com esta: “A minha companheira tem um dos papéis mais importantes, que é dormir comigo. Dormir comigo é um papel fundamental”.

Ciro não é burro e logo percebeu o clima de constrangimento, diante de algumas dezenas de jornalistas. Tentou remendar: “Evidentemente eu estou brincando. Essa minha companheira tem uma longa tradição de manejar assuntos sociais, tem muita inteligência, muita sensibilidade”. O desastre estava feito. Isso somado a uma briga ao vivo com ouvinte de rádio minou sua candidatura. Criou imagem de desequilíbrio, tudo que não se quer de um presidente.

Bolsonaro foi pior ainda. Se não consegue responder com tranquilidade a questionamento simples sobre suas verbas parlamentares, como não reagirá às cobranças muito mais contundentes e rotineiras a que se submete um presidente?

Em outros tempos, Bolsonaro já seria praticamente um ex-candidato. Esse tipo de postura deu o apoio que tem, mas freia seu crescimento. A evolução patrimonial põe em questão a imagem de integridade que tenta alardear. Além do que, candidatos com ideias extremas costumam não ter sucesso eleitoral.

Nos últimos 16 anos, porém, o Brasil mudou demais. Talvez tenha perdido um pouco da noção do que é absurdo, do que é bizarro.

Publicado originalmente no portal O Povo Online

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