A
“emenda constitucional” do “cidadão” Gilmar Mendes, noticiada em alguns
jornais, é um factóide e uma aberração. Factóide
porque não existe a menor possibilidade de que um “cidadão” – nem mesmo um
“supercidadão” como o Ministro, propor emenda à Constituição.
O
artigo 60 da Constituição Federal é claríssimo ao afirmar que só o presidente
da República, um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do
Senado Federal ou a metade das Assembleias Legislativas dos Estados o podem
fazer.
Gilmar
é muito poderoso, mas não tudo isso.
Juridicamente,
é apenas uma “cartinha” ao Senado, com o mesmo valor de uma que eu ou você
resolvêssemos escrever.
Politicamente,
claro, tem outro peso. É um “balão de ensaio” cavilosamente lançado por Michel
Temer para despertar a ambição de mando total dos parlamentares, que se
assenhorariam formalmente do Poder Executivo.
Essa,
a aberração.
A
proposta não tem o mínimo de realismo político, faz tanto sentido quanto a
possibilidade de que os eleitores escolhessem, se este fosse o candidato a
presidente, um traste como Temer ou o próprio Gilmar como presidente.
Fala
em “dissolução da Câmara dos Deputados” pelo Presidente, coisa com a qual
duvi-de-o-dó alguma maioria parlamentar venha a concordar, exceto se
estabelecida num processo de confronto por uma Constituinte eleita para uma
reforma política, distinta do Congresso Nacional.
Trata-se
de uma flor – e ainda com odor nauseante – do recesso parlamentar, como dizia,
nos anos 80, Thales Ramalho, o avô do “Centrão”.
A
“Emenda Gilmar” não existe, mas suas intenções, sim.
Não
é difícil imaginar o que daria um monstrengo destes: em 2014, ninguém menos que
Eduardo Cunha seria consagrado como Primeiro-Ministro, e fácil.
Corresponde
ao desejo da camada fisiológica da política de retirar do povo o poder de
escolher os governantes, entregando-o aos “homens çábios“.
O
mais trágico nisso é que estamos na dependência de um tipo abjeto como Gilmar para dizer o óbvio diante de
situações de arbítrio, como na proclamação do óbvio de que condução coercitiva
só pode ser feita quando o cidadão recusa o comparecimento espontâneo à
polícia.
Está
claro que não o faz por consciência jurídica, mas porque faz parte do seu
enfrentamento aos arroubos de poder policialesco do MP e da ala MM (Medíocres e
Maus) do próprio STF: Fachin, Barroso
e – não sabe sequer bem porque está ali
– Rosa Weber.
Pelo
poder – que ele deseja tanto quanto o trio mas sempre esteve mais perto dele
que qualquer um dos três – Gilmar Mendes
presta-se ao papel de autor da “cartinha de sugestões” ao Senado.
Segue
o exemplo de Temer: verba volant, scripta manent.
Fica
nela o registro eterno de seu golpismo, como ficou o de seu parceiro, o
ex-vice-decorativo.
Publicado
originalmente no portal Tijolaço
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