A
Câmara dos Deputados tentará votar na semana que vem se aceita ou não a
denúncia contra o presidente Michel Temer (PMDB). Caso acatada, ele será
preventivamente afastado do cargo.
O curioso é que o governo tem pressa para
votar, enquanto a oposição quer adiar a decisão. Portanto, o governo quer
colocar a denúncia contra Temer na pauta; a oposição quer evitar isso.
Como
em quase tudo no Brasil nos últimos dois anos e meio, parece que o mundo está
de pernas para o ar. Mas, ao menos dessa vez, o motivo é simples: hoje, a base
governista tem votos para barrar a denúncia. Então, quer encerrar logo o
assunto para não ter perigo de surgir fato novo capaz de complicar ainda mais o
governo. Já a oposição quer adiar a definição e tentará prolongar o desgaste do
presidente, sob a ameaça da denúncia. Por isso, a provável estratégia será, na
semana que vem, tentar evitar que a votação tenha quórum mínimo.
O
fato novo mais desgastante para o governo neste recesso partiu da própria
Esplanada dos Ministérios. O aumento de imposto sobre combustíveis, que se
encontrava barrado pela Justiça, contrariou uma das principais bandeiras das
forças econômicas que sustentaram a chegada de Temer ao poder. A população
sentiu o impacto negativo de imediato, mais que em qualquer outra iniciativa
desse governo.
A
oposição, como sói acontecer, tenta tirar proveito. Usa a alta de impostos para
mostrar que o propalado ajuste fiscal não se tornou realidade — o que é
inegável. Assim, tenta enfraquecer o governo e atrair simpatizantes para a tese
de que a permanência de Temer não é boa para ninguém, salvo para o próprio
presidente.
A
base governista está incomodada com a estratégia e acusa a oposição de querer
confundir as coisas. Diz que não dá para misturar a denúncia da Procuradoria
Geral da República com alta de impostos. Afinal, argumentam, a situação da
economia e as ações governamentais não são motivo para afastar presidente. E
estão certos. Não fosse o óbvio sofisma.
De
fato, o que a Câmara terá de decidir é se a denúncia contra Temer deve ou não
ter andamento no Supremo Tribunal Federal (STF). O assunto deveria se
restringir ao que está na ação. Isso, porém, nunca acontece. Não é assim nem no
Supremo, que dirá no Legislativo, político por essência. Ocorre que o próprio
governo tratou de meter a economia na conversa.
Quando
é para se defender, a propaganda e o discurso pró-Temer fala de fim da crise,
de criação de empregos, da aprovação da reforma trabalhista, do encaminhamento
da reforma da Previdência, da volta do País aos trilhos. Se isso vale à favor,
não dá para reclamar de quando é usado contra. Não pode querer incluir temas
econômicos na discussão quando é conveniente e querer excluir quando atrapalha.
O velho sofisma que pauta a política da forma mais desavergonhada.
Essa
mistura já ocorreu no ano passado, no impeachment de Dilma Rousseff (PT).
Muitos dos discursos de parlamentares pelo afastamento da presidente
reconheciam não haver crime de responsabilidade, mas apontavam o descalabro
econômico como fator para a insustentabilidade de sua permanência. Quem usou
argumento econômico para minar Dilma hoje está no poder.
Beto
Barata/PR
Beto
Barata/PR
O
ARRODEIO É LIGEIRO
Tem
sido em tudo muito curioso observar as argumentações contra e a favor do
afastamento de Temer. O Brasil vive a inusitada situação de possibilidade de
afastamento de um presidente que, menos de um ano antes, apoiou o impeachment
da antecessora. Os lados mudaram. Quem era a favor da destituição hoje é contra
e quem era contra está a favor. Personagens mudaram de lado, mas discursos não.
Na
sessão da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, por exemplo,
deputados hoje de oposição usaram o mesmo argumento dos atuais governistas ao
aceitar a abertura de pedido de impeachment contra Dilma Rousseff. Na discussão
sobre admissibilidade, o argumento era de que ali não era feito julgamento de
mérito ou definição de culpa, nem havia necessidade ainda de provas. O único
requisito, naquele momento, era de condições mínimas para a denúncia tramitar e
ir a julgamento.
Naquela
época como agora, o argumento é verdadeiro. Foi usado contra Dilma em abril do
ano passado e agora é contra Temer. O discurso só mudou o lado. Aliás: ainda é
usado pela oposição contra o governo, ainda que tenha havido troca de papéis
entre governistas e opositores.
Naquela
época como agora, o argumento é verdadeiro. Apenas é usado ou ignorado conforme
a conveniência.
O
mundo dá voltas e o arrodeio é ligeiro.
Publicado originalmente no portal O Povo Online
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