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30 de junho de 2017

"Colhendo os frutos" por Alberto Villas

Usufruíamos daquelas frondosas árvores durante muito tempo, nossa infância e juventude. Só na minha casa, havia uma parreira carregada de uvas Niágara todo fim de ano, uma ameixeira e duas laranjeiras. Na casa do vizinho, muitas bananeiras, um pé de jambo amarelo e uma goiabeira.

Na chácara de Dona Catarina, em Cataguases, muitos pés de carambolas, de jambo vermelho, de abil, muitos pés de pitanga, jabuticaba, caju, abacate e fruta do conde.

Fomos acostumados a comer frutas no pé, sem agrotóxico, sem veneno algum. Sequer lavávamos antes de colocar na boca. A goiaba vinha cheia de bichinhos brancos que espantávamos com um peteleco e quando iam parar na nossa boca, cuspíamos.

Subíamos nas árvores como se fôssemos macacos, pulando de galho em galho até o topo, onde estavam as jabuticabas maiores, sempre.

Os meus pais acostumaram os filhos a comer muita fruta. De manhã, não faltava na mesa o mamão com açúcar, a laranjada, e meu pai, metido que era, às vezes comprava melão espanhol nas Estâncias Califórnia, num tempo em que melão era só importado. 

A maçã e a pera também eram importadas. Vinham da Argentina, embrulhadas em um papel de seda azul com um perfume que ainda sinto até hoje.

Nossa infância foi coroada de frutas e mais frutas que, segundo a minha mãe, chegavam à mesa, graças a Deus. Mas havia um fantasma no ar, o da nódoa.

Dona Lali lavava nossas roupas com Rinso, uma novidade na época, um sabão em pó que, segundo a propaganda, deixava a roupa mais branca. A única recomendação que ela nos passava era essa: "Cuidado com a nódoa!"

Minha mãe repetia uma ladainha todos os dias: Caju dá nódoa, manga dá nódoa, jabuticaba dá nódoa. Ela tinha um verdadeiro pavor de roupa com nódoa que, para quem não sabe, é uma mancha que fica na roupa pra sempre.

Ainda não havia Google pra ela e por isso não sabíamos porque algumas frutas deixavam aquelas manchas horrendas nas nossas camisas brancas.

As antocianinas presentes nas frutas tendem a fixar-se nas fibras dos tecidos. Quando lhes é aplicado calor a nódoa torna-se mais profunda pois dá-se uma mudança química na sua composição que dificulta grandemente a remoção da nódoa.

Lembro-me bem da minha mãe no tanque tentando retirar nódoa das roupas. Ela colocava um copo de água sanitária Globo, misturada com água e sabão português. Chacoalhava, deixava de molho e depois colocava no sol pra quarar. Mas a nódoa não saia por nada.

Fiz uma pesquisa rápida e constatei que menino nenhum hoje com sete, oito anos,  sequer sabe o que é nódoa. Uma pena, porque em 2040 eles não vão ter uma história assim pra contar.

Publicada originalmente no portal Carta Capital

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