Plenário do TSE por ocasião do julgamento da chapa Dilma/Temer (Foto: Divulgação) |
Drummond
tem um poema que se encaixa à perfeição ao momento político atual.
Ironicamente, chama-se “Quadrilha” e fala sobre uma corrente de amor não
correspondido. Mal iniciado ontem, o julgamento da chapa Dilma/Temer no
Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tem algo de farsesco, desde a razão alegada
pelo senador afastado Aécio Neves (“pra encher o saco do PT”), até as queixas
apresentadas pela chapa derrotada (abuso de poder econômico) e os argumentos de
Dilma e Temer para evitar a cassação (não sabíamos de nada).
Essa
farsa está tanto ligada ao papel cômico desempenhado pelo PSDB, cujo advogado,
José Eduardo Alckmin, faz agora um malabarismo para pedir a cassação de Dilma,
mas preservar Michel Temer; quanto nas querelas e mumunhas da defesa da
petista, que acabam se aproximando das de Temer na tentativa de impedir a
punição de inelegibilidade. Por caminhos tortuosos, a ex e o atual, que um dia
estiveram juntos mas depois se desentenderam, parecem reatar diante do juiz. A
política brasileira é novela mexicana.
Outro
contorcionismo está na origem do próprio processo e se relaciona à principal
acusação: abuso de poder político e econômico. Todos sabemos, a partir do que
têm dito os delatores e dos processos abertos no âmbito da Lava Jato, que a
chapa derrotada em 2014 teria recorrido aos mesmos expedientes ilícitos para
financiar sua campanha. Daí o sorriso amarelo do advogado do PSDB durante a
sessão que abriu o julgamento depois de paralisado em abril. De fato, é difícil
explicar por que Aécio se julgou prejudicado em 2014, sobretudo depois dos
grampos de suas conversas com Rodrigo Loures para barrar a Operação Lava Jato.
Como
no poema, Temer amava Dilma, que amava Lula, que amava Temer, que amava Eduardo
Cunha, que não amava ninguém - sequer Aécio. Dilma caiu da cadeira e foi para o
Rio Grande do Sul. Lula está perto de Curitiba. Cunha está preso. Aécio não
pode pisar em Minas. E Temer confia todas as fichas em Gilmar Mendes, que ainda
não tinha entrado na história.
Michel
Temer está sozinho. Aos poucos, foram sendo abatidos seus principais aliados,
de Romero Jucá a Eduardo Cunha, parceiros no processo de impeachment. Há duas
semanas foi Rodrigo Loures, um auxiliar e pau para toda obra do presidente.
Ontem, foi a vez de Henrique Eduardo Alves (PMDB), ex-ministro do Turismo preso
durante mais uma fase da Operação Lava Jato. Assim como Dilma Rousseff (PT) nos
estertores do seu governo, o peemedebista perdeu a blindagem que tinha quando
assumiu no lugar da petista. É um fim melancólico.
Veio
da Procuradoria-Geral da República e do Supremo Tribunal Federal a artilharia
que reduziu essa muralha defensiva do peemedebista a escombros. Juntem-se ao
fogo cerrado as ofensivas contra o Planalto no STF e no TSE, e o que se tem é
um mandatário impopular (cerca de 3% de aprovação, segundo pesquisa mais
recente) vivendo seus derradeiros momentos, mas insistindo numa estratégia já
testada por Dilma. Nas semanas que antecederam a sua destituição, a então
presidente converteu o palácio em um bunker, de onde se recusou a enxergar a
ruína em redor. Até que se viu sozinha, traída por ministros que lhe haviam
prometido ajuda, como Gilberto Kassab, que, ao lado de Aloísio Mercadante,
levou adiante aquela malfadada ideia que custaria o mandato da petista: e se a
gente reduzir o espaço do PMDB no governo? Deu no que deu.
Hoje,
Temer vale-se de maioria congressual para permanecer na cadeira de chefe do
Executivo. É pouco, mas, dentro da lógica de resistência palaciana, faz todo
sentido. Ainda que seja denunciado pela PGR, o presidente sabe que tem maioria
para barrar a abertura de ação penal no Supremo. Impedindo-a, evita também
tornar-se réu, o que talvez lhe garanta permanência no cargo até 31 de dezembro
de 2018. É pouco, mas um governante tão mal avaliado e sob risco permanente de
queda já não tem tantas expectativas senão sobreviver.
Publicado originalmente no portal O Povo Online
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