Ex-ministro Palocci em depoimento na Justiça Federal |
Pela
própria natureza, delações premiadas devem ser olhadas com reserva.
Isoladamente, pouco significam. Precisam estar amparadas em elementos que as
confirmem, caso contrário não valem — ou não deveriam valer. Prova testemunhal
costuma ser chamada de “prostituta das provas”. Porém, no caso das delações, há
particularidade. Muitas vezes, o testemunho é acusação e confissão de culpa ao
mesmo tempo. Quando o relato incrimina o autor, convenhamos, ele cresce em
credibilidade. Não passa a ser o bastante para condenar ninguém. Mas, ganha
força como evidência. A verdade pode vir das “prostitutas”.
Como
em todos os casos, o relato do casal Mônica Mourão e João Santana precisa de
comprovação. Porém, se uma fração do que foi dito se confirmar, será o
suficiente para demolir Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. Por tabela,
o PT. É, até agora, a mais detalhada narrativa envolvendo os dois últimos
presidentes brasileiros eleitos.
A
versão contada pelos publicitários, a se confirmar, compromete Lula e mais
ainda Dilma. A ex-presidente, afastada do Palácio do Planalto há um ano e um
dia, atravessou o processo de impeachment e as investigações da Lava Jato com
relativamente poucos indícios que a comprometessem diretamente. Até agora, nada
nem de longe tão grave havia surgido contra ela.
Há
longo caminho até que haja elementos para confirmar se os relatos são
verdadeiros ou mentirosos. Precisarão demonstrar evidências. A partir daí, o
Ministério Público verá se há elementos para oferecer denúncia. Se houver, a
Justiça decidirá se há consistência para receber a acusação. E, então, Dilma
poderá fazer sua defesa. O que se conhece até agora é pouco além de palavras.
Palavras,
todavia, contundentes. Os relatos são detalhados. São verossímeis. Como se viu
no caso de Renato Duque, há sabidamente muito de verdade na história. Lula
confirmou grande parte do que o ex-diretor da Petrobras havia relatado sobre o
encontro num hangar do aeroporto de Congonhas. Divergiram sobre o ex-presidente
ter chegado ao ponto de pedir a eliminação de provas. Mas, está comprovado que
Duque não inventou uma narrativa do começo ao fim. Se nem tudo que disse é
verdade, ele pegou fatos verdadeiros e misturou com mentiras para incriminar
Lula.
Da
mesma maneira, há elementos concretos no relato do casal de marqueteiros, por
exemplo, sobre informações repassadas pelo então ministro da Justiça José
Eduardo Cardozo a Dilma acerca da Lava Jato. Nem tudo coincide, mas parte já
está confirmada. Cardozo afirma que só ficava sabendo das ações quando as
etapas eram desencadeadas. Mas reconheceu que, “em casos excepcionais”, era
avisado um pouco antes. Ainda contou que relatar a Dilma “era o seu dever como
ministro da Justiça”, mas ressalta que sempre dentro da legalidade, no
entendimento dele.
O
mesmo relato de que Cardozo informava previamente a Dilma sobre os passos da
força-tarefa foi feito por Delcídio do Amaral, que foi líder da então
presidente no Senado. Sobre o ex-ministro dizer que não ficava sabendo
antecipadamente da maioria dos casos, vale lembrar que, quando Alexandre de
Moraes estava no cargo, a Polícia Federal negou publicamente que informasse
previamente seus passos. Isso foi um dia depois de o então ministro da Justiça,
hoje no Supremo Tribunal Federal (STF), ter dito “esta semana vai ter mais”
sobre as operações. Um dia após a fala de Moraes, a Lava Jato prendeu Antonio
Palocci (PT).
Enfim,
há verossimilhança, ao menos, nas delações. Os relatos são seguros, naturais.
Convencem. Não significa que são verdadeiros. Se forem falsos, mostram que os
marqueteiros que conceberam as campanhas de eleição e reeleição de Dilma são
bons mentirosos.
Citei
Palocci acima de passagem. A informação de que ele teria decidido fazer delação
premiada tem potencial para incendiar o meio político e além. Ele conhece os
segredos das engrenagens dos governos de Lula e Dilma. Coordenou campanhas,
gerenciou governos. A depender do que fale, tem credenciais como poucos para
inviabilizar o PT e seus expoentes. Teria dito dispor de informações que
sustentariam “mais um ano de Lava Jato”. E isso não se restringe à sigla.
Palocci era homem de relações institucionais do lulismo. Com outros governos e
outros poderes. Com Judiciário, com empresariado. Nos primeiros anos da era
petista, foi o fiador da responsabilidade na economia, queridinho do mercado.
A
depender do que fale, pode comprometer muito mais que os companheiros de
partido.
Publicado originalmente no portal O Povo Online
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