O constrangimento de jornalistas habituados a compor a defesa incondicional do governo golpista era visível (Foto: reprodução Facebook) |
Os
escândalos recentes opõem dois dos maiores poderes institucionalizados do
Brasil: o Executivo/Palácio do Planalto, e a Rede Globo. O
Planalto pode alegar ‘surpresa’, afinal irrigava farta e generosamente a mídia
desde o golpe que cassou Dilma Roussef .
A
eventual ‘surpresa’ do Planalto é falsa:
os Executivos do PT igualmente privilegiaram a grande mídia, que sempre os
perseguiu ou, no mínimo, os ignorou em seus aspectos positivos.
Os
únicos governos poupados pela Globo foram os dois mandatos de Fernando Henrique
Cardoso.
Por
que a Globo a deflagrar o contragolpe?
Fernando
Horta levantou uma boa hipótese: “A JBS é a terceira maior anunciante da Globo.
Sem o dinheiro da JBS a Globo não paga as contas do mês ”.
Pressionada
pela JBS — faturamento anual de quase duas centenas de bilhões de reais — a
Globo se dedicou a uma de suas especialidades: derrubar governos.
A
hipótese de Horta faz sentido, e aqui lanço outra: não foi em vão que Globo
vazou.
Preso
há meses, especula-se que uma eventual delação do ex-ministro da Economia e da
Casa Civil de Lula e Dilma, Antonio Palocci, envolverá o sistema bancário no
circuito de corrupção nacional.
A
Globo sofreria outra punhalada em seus cofres. Os bancos compõem um dos maiores
setores do bilionário mercado publicitário brasileiro.
Por
exemplo, em 2015 os bancos constaram entre os 30 maiores anunciantes da mídia
nacional, com relevância na primeira metade da classificação, na seguinte ordem
e montantes, na casa dos bilhões de reais:
5º
Caixa, R$ 1,9 bilhão;
9º
Banco do Brasil, R$ 1 bilhão;
12º
Itaú, R$ 964 milhões
14º
Bradesco, R$ 866 milhões.
A
minha hipótese: com o Temer na berlinda, Palocci se conterá. Quebraria, assim,
a sequência de prejuízos que o setor anunciante ligado à alimentação vem
sofrendo nos últimos meses.
A
JBS hoje é a uma das maiores, talvez mesmo a maior, produtora de proteína
animal no mundo, e recentemente teve prejuízos graves com a interdição, ainda
que temporária, do mercado internacional por conta de suspeitas de que algumas
de suas subsidiárias vendiam carne podre.
A
Globo, a mídia em geral, deixaria de lucrar tendo nas cordas do ringue dois de
seus grandes setores publicitários.
Entre
entregar os anéis e a Presidência, a Globo rifou esta.
Por
que a opção de escalar o seu braço impresso (jornal O Globo) para deflagar o
contragolpe?
Talvez
para amenizar o que poderia ser um ‘balão de ensaio’.
O
timing da Globo foi calculado. Optando pelo jornal, publicou na internet, e
apenas no início da noite de 17 de maio, o que seriam transcrições de gravações
de um empresário com o presidente golpista Michel Temer.
O
braço eletrônico, a emissora de TV Globo, veio a reboque, repercutindo a
denúncia no seu principal telejornal (o Jornal Nacional), e eram visíveis os
constrangimentos de jornalistas habituados a compor a defesa incondicional do
governo golpista e de suas medidas autoritárias, contrárias às necessidades
econômicas e sociais as mais variadas da maioria da população.
Até
então, a defesa de Temer pela Globo era tamanha que o presidente golpista Temer
sequer dedicou tempo a uma ‘entrevista exclusiva’, ao contrário do que fez com
outras emissoras: Bandeirantes, entrevista exclusiva com José Luiz Datena. SBT,
entrevista exclusiva com Ratinho (não se trata aqui de trocadilho, é o nome
artístico de Carlos Alberto Massa, apresentador de programa popular de
televisão situado naquilo que Muniz Sodré chama, de forma apropriada, de “a
comunicação do grotesco”).
Nenhum
governo pós-1989 — inclusive os de Lula e Dilma — ousou ao menos propor
formalmente uma reforma da legislação que rege a mídia.
Por
um lado, se mantém a concentração, nas mãos de 14 famílias por todo o país, dos
mais potentes meios de comunicação, sejam eletrônicos, sejam impressos.
Por
outro, persiste a anuência governamental, por omissão no enfrentamento legal e
por manter financeiramente essa mídia, em vez de estabelecer e fortalecer uma
rede pública de comunicação.
A
Globo já derrubou João Goulart, elegeu e derrubou Collor, tentou em vão
derrubar Lula, derrubou Dilma e agora derruba Temer.
Caso
não seja imposta uma reforma da mídia, o próximo governo se sustentará quando
tiver de enfrentá-la?
Publicado
originalmente no portal Vi o Mundo
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