A sede da Fiesp, na Paulista, aglutinou os patos do impeachment em torno do pensamento mágico do fora Dilma, mas "a retomada" virou pataquada (Foto: Everton Amaro) |
Depois
das exibições do pato na Avenida Paulista para “animar” o impeachment de Dilma
Rousseff, a Fiesp descobriu quem está pagando as façanhas do próprio anatídeo.
No popular, as empresas brasileiras estão pagando o pato. Assim o demonstra o
excelente e certeiro estudo do Departamento de Competitividade e Tecnologia da
federação que congrega os industriais paulistas.
Já
na abertura, o estudo desfia as razões das graves dificuldades financeiras
vividas pelas empresas: “A
melhora da confiança que vimos com a mudança de governo não está se
transformando em melhor desempenho da economia. A expectativa de crescimento do
PIB está caindo, tanto para este ano quanto para o próximo. Para 2016, o
mercado esperava que o PIB fosse crescer -3,17%, mas agora já espera -3,44%.
Para 2017, a expectativa de crescimento passou de 1,34% para 0,96%”.
As
reiteradas decepções das expectativas e as frustrações da confiança, diz o
documento, “se devem ao desempenho ainda muito ruim de variáveis como vendas no
varejo, com queda de 6,6% nos 12 meses encerrados em setembro, e produção
industrial, que diminuiu 7,9%, nos 12 meses encerrados em outubro”.
A derrocada nas vendas do comércio e na
produção industrial, prossegue o estudo, “se deve ao desempenho ainda muito
ruim de variáveis como a taxa real de juros básica, que passou de 3,5% ao ano
em janeiro para mais de 9% em novembro. Isso
acontece porque a inflação está caindo, enquanto a Selic só diminuiu 0,25 ponto
porcentual. O crédito às empresas caiu 12,8% nos 12 meses encerrados em outubro
e o crédito às famílias, 3,4%. Os investimentos declinaram 13,5% nos 12 meses
encerrados em setembro”.
Segue
o enterro: além de seus efeitos negativos sobre o investimento, “a alta na
Selic tem efeito perverso sobre o spread e a inadimplência, que, desde janeiro
de 2014, aumentou 33%, enquanto o spread cresceu 81%, ou seja, mais do dobro. A
partir de 2015, os bancos começaram a aumentar os spreads para se provisionar
contra a inadimplência, que, até então, era estável. O aumento dos spreads
causou o próprio crescimento da inadimplência, concretizando uma espécie de
profecia autorrealizável”.
Tradução
livre: as decisões “racionais” do ponto de vista microeconômico prestam
homenagem às falácias de composição que infestam os modelos macroeconômicos. O
que parece bom para o ‘agente individual’, seja ele empresa, banco ou
consumidor, é danoso para o conjunto da economia.
As investigações da Fiesp chegam a conclusões
semelhantes àquelas que apresentamos há poucas semanas. Dizíamos então: em
fevereiro de 2013, o Boletim Focus, que reúne as projeções dos “principais
economistas do mercado”, previa crescimento do PIB de quase 4% ao ano para
2014, 2015 e 2016.
Após
o crescimento de 0,5% em 2014, a economia do País caminha para o segundo ano
consecutivo de retração de quase 4%.
O
desempenho pífio de 2014 instigou o “consenso” em torno das políticas
econômicas que deveriam ser adotadas tempestivamente. Depois de conceder
isenções fiscais para grandes grupos econômicos – a turma do pato –, a política
econômica brasileira deu um choque de tarifas, dobrou a taxa de juros e
perpetrou um ajuste fiscal que concentrou cortes em investimentos públicos.
O
mergulho depressivo iniciado entre o crepúsculo de 2014 e a aurora de 2015 pode
ser apresentado como um exemplo do fenômeno que as teorias da complexidade
chamam de “realimentação positiva” ou, no popular, “quanto mais cai, mais
afunda”.
A
interação entre o choque de tarifas, a subida da taxa de juros, a
desvalorização do real e o corte dos investimentos públicos determinaram a
elevação da inflação em simultâneo à contração do nível de atividade e daí à
restrição do crédito. O encolhimento do circuito de formação da renda levou,
inexoravelmente, à derrocada da arrecadação pública.
A
combinação entre choques negativos de oferta e seus efeitos sobre a renda
agregada da economia suscitou um processo de “realimentação positiva” decorrente
das reações de autoproteção das empresas, bancos e consumidores, estes
ameaçados pelo desemprego.
As
fábricas se encharcam de capacidade ociosa. Endividadas em reais e em moeda
estrangeira, as empresas são constrangidas a ajustar seus balanços diante das
perspectivas de queda da demanda e do salto no serviço da dívida.
Para
cada uma delas era racional dispensar trabalhadores, funcionários, assim como,
diante da sobra de capacidade, procrastinar investimentos que geram demanda e
empregos em outras empresas. Para cada banco individualmente era recomendável
subir o custo do crédito e racionar a oferta de novos empréstimos.
Os
consumidores, bem, os consumidores reduzem os gastos. Uns estão desempregados e
outros, com medo do desemprego. Assim, o comércio capota, não vende e reduz as
encomendas aos fornecedores, que acumulam estoques e cortam ainda mais a
produção.
As
demissões disparam. A arrecadação míngua, sugada pelo redemoinho da atividade
econômica em declínio. Isso, enquanto a dívida pública cresce sob o impacto dos
juros reais e engorda ainda mais os cabedais do rentismo caboclo.
Pedidos
de “paciência” ou “controle da ansiedade”, em meio a celebrações de economistas
pela queda do salário real, chocam-se com a realidade da vida das pessoas de
carne e osso e denunciam a dissonância da narrativa da retomada da confiança
com os movimentos da economia concreta.
A
confiança do empresário é a demanda e a do trabalhador, seu emprego. Ao redor
do globo, governos buscam:
“1.
Dinamizar suas economias com baixas taxas de juro.
2.
Parcerias com a iniciativa privada na coordenação e promoção de investimentos
em inovações, à procura de protagonismo na nova revolução industrial.
3.
Programas maiores e de longa duração na melhora da infraestrutura pública, os
quais, nas palavras da The Economist, “dariam às empresas privadas uma maior
confiança sobre a demanda futura e tornariam mais provável uma recuperação
sustentada”.
A
mídia brasileira espargiu a convicção da rápida recuperação do crescimento
econômico, pois a confiança havia sido restabelecida e o hiato do produto
ampliado. A crise purgaria rapidamente os excessos decorrentes dos “estímulos
artificiais”
Publicado
originalmente no portal Carta Capital
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