Liga
Paulo Henrique Amorim, pergunta: “Você leu a entrevista de Sergio Moro no
Estadão?” Não li, mesmo porque não me aproximo da mídia nativa, a não ser que
alguém devidamente habilitado a tanto sugira a leitura desta ou daquela página,
a bem da minha edificação cultural.
Confio,
porém, em Paulo Henrique, o qual sentencia: “Pobre moço, incapaz de uma única,
pálida ideia”. Donde, não lerei, estou cansado de tolices sem conta, deste
besteirol desenfreado. Mais ainda, do crime cometido contra o Brasil, sem que
inúmeros brasileiros se deem conta. E aqui aproveito a oportunidade para
informar que me preparo para duas semanas fora do País, em busca de melhores
ares.
Pois
é, viver no país da casa-grande e da senzala me deixa exausto. Por exemplo: há
de ser extraordinário o esforço mental para qualificar o grau de insanidade
atingido pelos golpistas no poder. Sublinhe-se um dado fundamental: o Brasil
ostenta impavidamente juros de 14%, enquanto o país a praticar os maiores
depois do nosso é a Rússia de Putin, com 2,8%, enquanto a União Europeia tem
juros negativos. O que concluir?
Pretende-se
garantir o rentismo na sua versão mais desbragada, a felicidade dos fabricantes
de dinheiro em espécie em lugar de bens e serviços. É o triunfo de um punhado,
contra a desgraça da larga maioria, a começar pela mão de obra. Rasga-se não
somente a Constituição de 1988, mas também a CLT, que, pasmem caso não saibam,
foi inspirada na Carta del Lavoro, obra do jurista Alfredo Rocco a serviço de
Mussolini.
À
época em que Getúlio Vargas a pôs em vigor, significava um avanço excepcional
para o Brasil de então. O Estado mínimo que os golpistas no momento nos impõem
vai além do fascismo e joga ao lixo até a garantia dos trabalhadores
reconhecida pela ditadura totalitária do Duce.
Há
outra diferença, aliás, em relação ao regime mussoliniano: este era
nacionalista. O estado de exceção que hoje nos vitima é simplesmente
entreguista e loteia o País para vendê-lo a quem se apresentar, por via direta
ou por meio das privatizações.
A
casa-grande privilegia ao mesmo tempo os usurários indígenas e o capital
estrangeiro. Mais que sandice pura, é crime, como já disse, cometido contra a
soberania nacional e os interesses da maioria dos cidadãos, mesmo aqueles que
não têm consciência da cidadania.
Insanidade?
Depende do ponto de vista. A minoria rentista esfrega as mãos de deslumbrado
contentamento. Atiro-me, não sem ousadia, a evocar a piada do escorpião: em
meio ao dilúvio, pede carona à rã. “Não caio nesta – diz o batráquio –, você
vai me picar.” “Se fizer isso que você teme – retruca o escorpião –, eu me
afogo na enxurrada.”
O
argumento soa convincente e a travessia começa. Lá pelas tantas, o bicho mau
cede, porém, à sua natureza e dá a ferroada fatal. “Mas como? Assim morremos
ambos”, consegue suspirar a rã. “Pois é – comenta, soturno, o passageiro –, eu
não sei nadar, mas que fazer? Eu sou escorpião...”
Que
esperar dos planos tresloucados do governo da casa-grande? A curto prazo, a
maior crise da história, de consequências imprevisíveis e, certamente, de
imensa, irreparável gravidade. Às vezes, no olho do ciclone, o homem desafiado
encontra força e inteligência para escapar. De qualquer maneira, o risco é
espantoso, para todos, e expõe antes os vencedores contingentes do que os vencidos.
O
capítulo em andamento de um enredo, de início tragicômico e agora somente
trágico, nos empurra para o desastre ciclópico, a hecatombe material e moral,
geral e irrestrita. A contribuição da ignorância e da parvoíce verde-amarela a
tal desfecho é determinante. Escrevi no introito a esta peroração que não leio,
e menos ainda ouço e assisto aos jornalistas nativos em ação para poupar de
humores sombrios o percurso esticado entre o fígado e a alma.
Figuras
como Sergio Moro cabem à perfeição na moldura. Já li da lavra dele bobagens
inomináveis e não preciso ler outras. Trata-se de personagem exemplar, na sua
vaidade, provincianismo, empáfia. Cavalga, desassombrado, seu imensurável
narcisismo, obviamente parvo.
Publicado
originalmente no portal Carta Capital
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