João Semedo, de Cabo Verde, e Júlio Cambanco, de Guiné-Bissau, estudam na Unilab, em Redenção (Foto: Chico Alencar) |
Com
o olhar de quem vem de fora, o que é silencioso por aqui se torna evidente. “O
brasileiro tem preconceito com ele mesmo, imagina com os africanos”. Vindo de
Guiné-Bissau, Júlio Cambanco, 25, mora há quase três anos em Redenção, a cidade
que se regozija pelo pioneirismo contra a escravidão nos tempos em que o País
era um Império. Na cidade a 63 km de Fortaleza, o trabalho escravo foi
oficialmente abolido no primeiro dia de 1883 - à frente, inclusive, da Data
Magna do Estado, que completa 131 anos hoje. Os resquícios de discriminação,
entretanto, ainda são presentes.
Sede
do Campus da Liberdade, que tem quatro cursos de graduação da Universidade da
Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab), Redenção recebe
alunos de seis nacionalidades africanas. Júlio estuda Administração Pública.
Antes de chegar, conta, não acreditava que as pessoas olhassem diferente por
causa da cor da pele. “Nunca tinha passado pela minha cabeça que há preconceito
no mundo. Quando eu cheguei aqui, eu vi”.
Até
hoje, Júlio não entende o porquê de esse preconceito existir. Mas ele existe
porque as pessoas negam a possibilidade da familiarização com a diversidade -
João Semedo, 26, tenta explicar (por mais que não seja justificável). Ele veio
de Cabo Verde para cursar Bacharelado em Humanidades.
“O preconceito está
interiorizado no brasileiro”. E essa discriminação aparece quando um africano
leva mais tempo que o normal para ser atendido no hospital, uma mulher briga
com o filho que se aproxima de um negro na rua ou a criança confessa que a mãe
“não gosta de vocês” - são os exemplos que os dois citam.
O
preconceito só existe para negar um conhecimento maior sobre o mundo, reflete
João. É uma barreira que precisa ser quebrada. Um primeiro passo, aponta Júlio,
é ter tolerância com a intolerância - “para que os outros possam nos
reconhecer”. Mudar um pensamento que se constrói desde que o Brasil é Brasil e
desmistificar um conceito que se impõe são desafios, eles comentam. “Um dia,
isso vai mudar”, vislumbra o guineense.
Além
de estudar, os dois jovens querem mostrar que é possível ser igual com
diferenças. “A gente tem de perceber isso como um objetivo também para
construir esse tipo de resistência”, vê João. Tudo depende de um conjunto de
ações: educação, leis e a aplicação delas. “Uma coisa é juntar as pessoas, que
nós chamamos de multiculturalidade, e outra coisa é a interculturalidade”,
diferencia Júlio. Interagir é conhecer quem é o outro. “Somos irmãos”.
Com
informações O Povo Online
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