A
expressão “tem cearense em todo lugar” ganha dimensão em um levantamento do
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea): 28.735 pessoas de alta
escolaridade emigraram do Ceará, entre 2005 e 2010. Considerando o número de
imigrantes de alta escolaridade (26.858), no mesmo período, o Estado perdeu
1.877 universitários, mestres, doutores, pós-doutores, enfim, inteligências.
A
pesquisa “A migração como fator de distribuição de pessoas com alta
escolaridade no território brasileiro” foi elaborada, por técnicos do Ipea, com
dados do Censo Demográfico 2010 – o último realizado pelo Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE). Os técnicos consideraram todas as pessoas
com 18 anos ou mais e que ingressaram na universidade ou já seguiam adiante. O jornal
POVO obteve os dados relativos ao Ceará.
Das
33 microrregiões cearenses definidas pelo IBGE, 22 tiveram saldo negativo em
relação à migração de pessoas de alta escolaridade; ou seja, perderam mais
qualificação do que ganharam. A microrregião de Fortaleza, que compreende nove
municípios, teve maior perda: 14.107 pessoas foram embora ao tempo em que
13.680 imigraram. Perdeu inteligências para Brasília até Porto Nacional
(município do Tocantins), e o prejuízo pode se tornar maior. “Sem a refinaria,
vai ter um impacto. Pessoas que iriam para Fortaleza não vêm mais”, calcula o
economista Herton Ellery Araújo, um dos autores da pesquisa do Ipea.
“Migração
é um processo espontâneo. Mas, quando você vê um lugar perdendo muita gente,
está acontecendo alguma disfunção. Ou é a violência, ou o mercado não está
absorvendo bem...”, atenta Herton. Qualidade de vida e salários altos atraem
tanto os jovens quanto os mais velhos. Perde-se tanto inovação quanto
experiência. “A pessoa de alta escolaridade busca conhecer mais os mercados.
Tem uma percepção de outros centros que podem dar maior oportunidade para ele”,
conclui.
Para
o professor e pesquisador Mauro Oliveira, articulista do jornal O POVO e idealizador
dos projetos Pirambu Digital e Aracati Digital, a área de Ciência e Tecnologia,
por exemplo, sofre a migração “em vários níveis: dos bairros pobres para os
bairros ricos, do Interior para a Capital, da Capital para o Centro-Sul e para
outros países”. Faltam políticas de valorização das inteligências locais e “a
percepção de quem tem mestrado e doutorado poder melhorar a sociedade”, soma.
“O
Ceará é o estado que mais envia alunos para os dois principais centros de
pesquisa tecnológica do Brasil, ITA e IME. Boa parte desses alunos vão e não
retornam porque não encontram, aqui, condições de trabalho e pesquisa”, dialoga
o economista Marcos Holanda. Ele defende mais infraestrutura e ousadia como
atrativos: “Não é só criar um parque tecnológico, tem que ter uma coisa mais
ambiciosa, oferecer bolsas de pesquisa diferenciadas”.
Estímulo
e apoio ao empreendedorismo podem ser caminhos de voltas, sugere o
diretor-presidente do Parque de Desenvolvimento Tecnológico da Universidade
Federal do Ceará (Padetec/UFC), Afrânio Craveiro: “A grande motivação é o
próprio Estado do Ceará. As pessoas não vão retornar se não tiverem condições
de desenvolver o trabalho aqui”. “Um dos problemas do Ceará e do Brasil é a
falta de incentivo à inovação, ao empreendedorismo”, concorda o professor José
de Paula Barros Neto, diretor do Centro de Tecnologia da UFC. “Precisamos criar
desafios, que é um dos motivadores das pessoas inteligentes. Criar meios para
que as pessoas se desenvolvam a partir de projetos impactantes e desafiadores”.
Os
caminhos da volta também passam pela cultura, aponta Mauro Oliveira. “Chico
Anysio dizia que, para fazer sucesso no Ceará, tem que fazer sucesso lá fora. A
questão cultural tem sido um elemento de fuga”, cita. Além disso, ele
acrescenta, “há falta de consciência, cada um cuida de si. O camarada, mesmo
tendo sido financiado pelo poder público, não está nem aí... Depois de
descobrir os talentos, tem que desenvolver a consciência da responsabilidade
social”.
Com
informações O Povo Online
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