Deputado Ronaldo Fonseca discursa na Tribuna da Câmara com a Constituição em uma mão e a Bíblia na outra (Foto: Divulgação) |
Dois
projetos de lei que, entre outros pontos tratam da definição do conceito
de família, prometem esquentar a discussão no Congresso Nacional. Pelo nome que
receberam, muito parecidos – um Estatuto da Família e o outro Estatuto das
Famílias - as propostas parecem ser iguais, mas na prática são completamente
diferentes. A primeira é mais conservadora enquanto a segunda é mais
progressista.
A
que tramita na Câmara (PL 6.583/13) é o Estatuto da Família, relatada pelo
deputado Ronaldo Fonseca (PROS-DF), define família como o núcleo formado a
partir da união entre homem e mulher, por meio de casamento, união estável ou
comunidade formada pelos pais e seus descendentes. A definição é a mesma que
está no Artigo 226 da Constituição Federal. Já o Projeto de Lei Suplementar
(PLS) 470/13, o Estatuto das Famílias, que tramita no Senado, reconhece a
relação homoafetiva como entidade familiar ao rever o instituto da união
estável e amplia sua conceituação.
No
relatório do projeto do Estatuto da Família, que será entregue na segunda-feira
(17/11) à comissão especial que analisa a proposta na Câmara, Fonseca, que também
integra a bancada evangélica, promete acirrar a polêmica. “Eu estou colocando
no relatório a proibição da adoção [por casais do mesmo sexo]. Se o Artigo 227
(da Constituição Federal) diz que a família é para proteger a criança, como é
que dois homens, duas mulheres que são homossexuais que dizem ser pais, querem
adotar? Adotar para satisfazer a eles ou a criança? A adoção é para contemplar
o direito da criança, não do adotante”, justifica. O direito de adoção por
homossexuais foi reconhecido pelo Superior Tribunal de Justiça em votação
unânime em abril de 2010.
Desde
fevereiro, a página da Câmara tem uma enquete que pergunta se os internautas
concordam com a definição de família como núcleo formado a partir da união
entre homem e mulher. A enquete já recebeu mais de 4 milhões de votos. Até o
fechamento desta reportagem, o resultado estava praticamente empatado com 49,52
% dos votos para sim e 50,16% para não e 0,32 % dos internautas disseram não
ter opinião formada sobre o tema.
Ronaldo
Fonseca nega que a divisão reflita o pensamento da sociedade brasileira.
“Aquela enquete deve ser vista apenas pela força de mobilização e não de
opinião. Uma [mesma] pessoa pode votar várias vezes, inclusive os ativistas
homossexuais têm escritório só pra fazer isso, mas é interessante ver que a
sociedade está mobilizada”, disse.
Sem
citar fonte, o deputado diz ainda que há pesquisas que apontam que a sociedade
brasileira, na sua maioria, quer que o conceito de família tradicional seja
mantido. “Não é questão de perseguição, é que na proteção especial do Estado
para a família em que está configurada a integridade da família, o Estado não
pode simplesmente reconhecer que dois homens querem viver como família. Que
história é essa? Dois marmanjos? Qualquer pessoa que se junta agora é família?
Se duas mulheres querem fazer sexo, que façam, mas que não busquem a proteção
do Estado”, diz.
Deputados
que rechaçam a proposta tentarão protelar ao máximo a votação prevista para o
fim deste mês. Se aprovada, ela segue para o Senado. Nomes na Câmara, como o de
Erika Kokay (PT-DF) e Jean Wyllys (PSOL-RJ), vêm sendo voz e ouvido de
movimentos atingidos pela proposta defendida por Fonseca.
Presidente
da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais
(ABLGBTT), Carlos Magno Silva, mantém um diálogo permanente com esses
parlamentares e afirma que a votação este ano poderia significar uma derrota
para a população LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e transgêneros).
A
formatação do Congresso Nacional a partir do ano que vem também não é
favorável. Enquanto a bancada evangélica cresceu, muitos parlamentares que
levantavam a bandeira dos direitos humanos como prioridade não foram reeleitos.
“A
gente nunca teve um quadro de representação tão conservador. Estamos tentando
contato com os deputados para constituir uma Frente Parlamentar pelos Direitos
LGBT forte e atuante porque a próxima legislatura vai ser de muito embate, de
muita disputa política. Este setor [evangélicos] tem se organizado para impedir
qualquer avanço no reconhecimento de direitos humanos”, afirmou Carlos Magno.
No
caso de um grupo misto, a ex-ministra da Cultura, Marta Suplicy (PT-SP), que
está de volta ao Senado, e a senadora Lídice da Mata (PSB-BA) devem ser procuradas.
Magno
disse ainda que não existe uma estratégia definida de atuação, mas afirmou que
vão encontrar uma forma de evitar que a proposta mais conservadora avance.
“Isso é um retrocesso. Vai na contramão de tudo que já avançamos no Brasil e em
outros países. Não existe só um formato de família. Existem vários formatos de
família”, criticou, elencando conquistas do movimento como o direito à adoção e
ao casamento.
A
união de casais do mesmo sexo foi reconhecida em maio de 2011 pelo Supremo
Tribunal Federal (STF). Dois anos depois, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ)
aprovou uma resolução proibindo que os cartórios do país se recusarem a
celebrar casamentos civis de casais do mesmo sexo ou de converter em casamento
a união estável homoafetiva.
Magno
defende o texto que tramita no Senado, a PLS 470/13. Chamada de Estatuto das
Famílias – no plural-, é menos conservadora. O texto reconhece a relação
homoafetiva como entidade familiar ao rever o instituto da união estável,
amplia sua conceituação, sem que ela fique restrita à ligação formal entre
homem e mulher. A mesma proposta retira toda a parte de família do Código Civil
e a coloca em um estatuto próprio. Também polêmica, a matéria aguarda votação
do parecer favorável do senador João Capiberibe (PSB-AP) na Comissão de
Direitos Humanos (CDH) da Casa.
Com
informações Agência Brasil
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