Camilo Santana, eleito governador do Ceará conversou com editores do jornal O POVO em seu apartamento (Foto: Edimar Soares) |
Camilo
Santana entrou na política em 2000 como candidato, na época pelo PSB, à
prefeitura de Barbalha, no Cariri, a 553 km de Fortaleza. Perdeu, voltou a ser
derrotado quatro anos depois, em nova tentativa, já no PT, e, no momento em que
se prepara para tomar posse no cargo de governador do Estado, faz uso dos
episódios que sempre vai para as disputas sabendo que pode ganhar ou perder.
A
principal referência dele na vida pública é o pai, ex-deputado Eudoro Santana,
a quem viu ser retirado de casa por militares durante a ditadura, numa cena que
o marcou e ainda nos atuais passeia por sua memória. Outro referencial
importante para Camilo é o governador que sucederá, Cid Gomes, de quem foi
secretário de Desenvolvimento Agrário (primeira gestão) e Cidades (segunda).
Único
dos quatro filhos de Eudoro e dona Ermengarda a optar pela vida pública, admite
que enfrentou a resistência da avó, morta dois anos atrás, para trilhar o
caminho da política. Ela alertava para o risco de se expor a ataques na vida
particular, exatamente como diz ter sofrido nesta campanha.
Camilo
recebeu repórteres do jornal O POVO em seu apartamento, na manhã da última
quarta-feira, para conversa que tem seus trechos principais editados a seguir:
O
POVO - O senhor lembra do momento em que foi comunicado pelo governador de que
seria o candidato?
Camilo
Santana - Foi no sábado, pela manhã (28 de junho). Ele me ligou e disse que o
conjunto de partidos havia me indicado para representá-lo na disputa...
OP
- E disse “sim” de imediato?
Camilo
- Perguntei se estava à altura de cumprir a missão. Porque, realmente, era uma
coisa muito forte, até pelo fato de existirem vários outros candidatos se
colocando à disposição. É um desprendimento, porque não era alguém do partido
dele. Demonstração de que o projeto não é uma coisa só partidária ou só
individual.
OP
- No dia em que foi lançada sua candidatura, o senhor lembrou do dia em que
militares chegaram à sua casa para levar preso seu pai, Eudoro Santana, na
época da ditadura. De que forma esse episódio e a trajetória dele lhe marcaram?
Camilo
- Papai é, pra mim, um exemplo, uma referência de vida, de política. Papai era
funcionário da Petrobras, morava lá na Bahia, foi demitido na época da
ditadura, perseguido. Voltou a morar no Cariri porque meus avós conseguiram um
emprego para ele lá. Ele passou 15 ou foi 18 dias fora. Minha mãe estava
grávida. Lembro da volta dele. Aquilo tudo me marcou, tinha sete, oito anos.
OP
- O senhor consegue entender porque é o único dos quatro filhos que seguiu a
vocação política do pai?
Camilo
- A atuação política de cada um pode ser vista de várias formas. Meu irmão,
Tiago, contribui muito com a arte pela maneira como olha o mundo, como
fotógrafo. A minha irmã, apesar de morar fora do País, também. Claro que o ramo
mais árduo é esse, de seguir carreira pública, porque a política partidária é
muito desacreditada. Minha avó sempre dizia para eu não entrar nessa vida.
Dizia que iriam me chamar de ladrão. E eu dizia: “Vovó, se não existirem
pessoas dispostas a construir a diferença, como vamos mudar?”
OP
– O senhor falou da importância do Eudoro para a vida pública, mas a dona
Ermengarda, sua mãe, também tem sido relevante.
Camilo
– Claro, inclusive porque mamãe é mais política do que o papai. Ela foi
vice-prefeita de Barbalha, começou um trabalho importante de organização das
comunidades, das associações, de base mesmo. Apesar de ter resistido muito à
ideia de ser candidata. Chegou a chorar.
OP
– O governador Cid, quando eleito, trabalhou para atrair a oposição. O senhor
pretende conversar com o PMDB e com o resto da oposição?
Camilo
– Nós temos um lado. Fomos eleitos por um lado. Quando falo de unir o Ceará,
falo do ponto de vista de todos os cearenses. Faremos um governo de muito
diálogo com setores da sociedade. Isso não quer dizer que não vá dialogar com
os outros partidos.
OP
– Houve uma fissura na antiga base do governo, com a saída do PMDB. O senhor
está preparado para ter uma oposição maior?
Camilo
– Oposição é importante. Até para se fazer uma autoavaliação. Espero que seja
uma oposição responsável, propositiva. Não oposição raivosa por conta da
derrota eleitoral. Oposição é parte da democracia. Não na perspectiva de
disputa de poder ou espaço, mas na busca do melhor pro Ceará.
OP
– O senhor falou, após eleito, em retomar o diálogo com os policiais. Na
opinião do senhor, vai ser mais fácil do que seria para o governador Cid Gomes
retomar esse diálogo, em função do desgaste que houve?
Camilo
– É um novo governo. E, repeti isso diversas vezes, o papel da Polícia é
garantir a segurança do povo do. Vou saber respeitar, dialogar. Agora, não vou
admitir que não se garanta cumprir a missão que o povo espera.
OP
– Há reclamações quanto a punições que têm ocorrido em relação a policiais. O
senhor fala que não vai transigir em relação a garantir a segurança da
população. Há margem para rever as punições?
Camilo
– Em todas as áreas há excessos, desvios. Vamos exigir que a lei, a hierarquia,
a disciplina sejam cumpridas. Isso não quer dizer que não vamos dialogar.
OP – Outro desafio será pacificar o PT. Houve
segmentos importantes, dos quais faz parte a ex-prefeita Luizianne Lins, que
não reconheceram a candidatura como candidatura do PT. Como o senhor pretende
atuar?
Camilo
– Eu não gosto muito de falar do passado, mas a minha decepção é que essa parte
do PT não pensou no projeto político. Todo mundo sabe quem é Camilo, todo mundo
sabe de minha história. Fui militante com a Luizianne na universidade. Acho que
a política e a vida partidária não podem ser feitas em nome ou de uma tendência
ou de interesses individuais. Quando foi decidido que o Elmano (de Freitas)
seria candidato (a prefeito de Fortaleza, em 2012), respeitei, fui pra
campanha. Isso é ético dentro da política. Mas vamos falar de futuro.
OP – O senhor vai tomar alguma iniciativa, ou
já tomou?
Camilo
– Eu liguei para a Luizianne quando ela foi eleita. Para parabenizá-la. Pedi o
apoio no segundo turno. Não tenho problema. Espero que o partido, como me deu
apoio na decisão do diretório estadual, possa também dar o suporte necessário
(no governo).
OP
– Como o senhor se sente com o PT, no âmbito municipal, fazendo oposição à
gestão Roberto Cláudio?
Camilo
– Tem vários municípios do Ceará onde o PT é oposição ao Pros, onde o PT briga
com o PMDB. Essa coisa é muito específica. Vamos trabalhar essa questão ainda.
OP – O fato de estar assim hoje não quer dizer
que vai estar assim em 2016?
Camilo
– Só daqui a dois anos. O prefeito Roberto Cláudio me apoiou, apoiou a
presidenta Dilma. Isso não é importante para o projeto do PT nacional? Não
existiu uma campanha, talvez, no Brasil que fosse mais vinculado o governador,
o prefeito da Capital e a presidenta Dilma do que a nossa aqui.
OP
– Vou comparar o estilo mais pessoal. O senhor diria que os fotógrafos vão
sentir falta do estilo Cid Gomes, com o senhor? Como no mergulho que ele deu
nos braços da multidão durante a festa do primeiro turno? O senhor é mais
contido que ele.
Camilo
– Isso é bom... Pode ser que eu surpreenda mais ainda (risos).
Publicado originalmente no portal O Povo Online
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