Nas
redes sociais, tarde da noite de sexta-feira, jornalistas afinados com o
tucanato e militantes da esquerda extremada se esparramavam em elogios à capa
da “Veja”. Eu, que procuro manter distância sanitária da revista, aproximei-me
da capa. E só consegui enxergar um gesto de oportunismo barato.
A
“Veja” expõe a imagem – chocante, lamentável, triste – do rapaz preso pelo
pescoço num poste na zona sul carioca, e aproveita a cena não para refletir
sobre a tradição oligárquica brasileira, não para pensar sobre nossa história
de 300 anos de escravidão, ou sobre nossa elite que reclama de pobres nos
aviões e clama sempre pela resposta fácil do liberalismo de araque e da
violência de capatazes. Não. “Veja” usa a foto terrível em mais uma tentativa
para desgastar a imagem do Brasil; e também – que surpresa – para culpar o
“governo”. Que governo? Ah, não é preciso ser muito esperto pra descobrir…
Emoldurando
a foto triste, “Veja” berra em letras garrafais: “Civilização” e “Barbárie”. E
depois acrescenta a legenda malandra, velhaca: “A volta dos justiceiros,
criminosos impunes, colapso no transporte, caos aéreo. Onde está o Brasil
equilibrado, rico em petróleo, educado e viável que só o governo enxerga”.
Certamente,
o Brasil “equilibrado” não está nessa revista. “Veja” pratica o jornalismo da
barbárie, um jornalismo que escreve “estado” assim – com “E” minúsculo – numa
espécie de bravata liberal fora de época. “Veja” envenena o país todos os dias,
com blogueiros obtusos, asquerosos, que
falam para um Brasil pretensamente senhorial, como se ainda estivéssemos antes
da Revolução de 30.
Curioso,
também, ver a “Veja” falar em “barbárie” e em “criminosos impunes”. Logo essa
revista, tão próxima do bicheiro Cachoeira, pautada pelo bicheiro, amiga do
bicheiro. A tabelinha com Cachoeira é – sim – um exemplo perfeito desse Brasil
de criminosos impunes.
A
“Veja”, que tenta pegar carona na imagem do rapaz preso pelo pescoço, pratica
um jornalismo justiceiro – que invade quartos de hotel, “julga” e “condena” sem
provas, inventa fatos, publica grampos sem áudio, alardeia contas no exterior e
dólares em caixa de whisky. Tudo falso, falsificado. Um jornalismo que acredita
em boimate e Gilmar Mendes.
A
revista não tem moral para falar contra a “barbárie”, nem contra os “justiceiros”.
E não tem, precisamente, por praticar um jornalismo que é a própria encarnação
da barbárie, da falta de escrúpulos, um jornalismo justiceiro.
O
Brasil do lulismo tem muitos problemas. Isso é evidente. Mas não venha a “Veja”
querer apresentar a receita de “Civilização” ao Brasil. A receita da “Veja” é a
mesma que os EUA oferecem à Ucrânia.
Está
claro, por essa capa oportunista e velhaca, qual é a pauta dos setores que não
aceitam o Brasil um pouquinho mais avançado dos últimos anos: é jogar tudo no
“caos”, na “barbárie”, na insegurança. O Brasil é a jóia da coroa na América
Latina em 2014. Tão importante quanto a Ucrânia no leste europeu, tão
estratégico quanto a Síria no Oriente Médio.
Não
sejamos ingênuos. A velha imprensa brasileira – que se reúne com embaixadores
dos EUA às escondidas (isso desde 64, mas também em 2010 – como nos revelou o
Wikileaks) – é parte decisiva no jogo pesado que veremos em 2014.
A
oposição brasileira não tem programa. A economia não afunda como gostariam os
urubulinos. Portanto, é preciso produzir a pauta do caos. Esse é o caldo de
cultura em que podem prosperar candidaturas “justiceiras” que a “Veja”, os
mervais e outros quetais estão prontos a lançar.
Para
retomar o Estado brasileiro, eles pouco se lixam se o preço a pagar for a
ebulição social. Aécio e Eduardo não darão conta dessa pauta da “ordem contra a
barbárie”. A pauta do caos e do Brasil “inviável” (que está na capa da “Veja”)
é boa para aventuras autoritárias – semelhantes ao janismo de 1960.
Quem
pode encarnar esse figurino? Quem? O terreno vai sendo preparado…
Não
creio que o povo brasileiro – equilibrado, sim! E que trabalha duro para
construir um país “viável”, sim – não creio que a maioria de nosso povo
embarque na aventura da “ordem contra a barbárie” – proposta pela revista. Mas
a direita asquerosa e velhaca vai tentar.
O
roteiro está claro. É preciso estar atento. E não cair na esparrela de
acreditar que a “Veja” – de repente – converteu-se à “Civilização”.
A
“Veja” é a barbárie. No jornalismo, na política, na vida do brasileiro comum.
A
“Veja” – se pudesse – prenderia o pescoço do povo brasileiro no poste. Mas não
vai conseguir. Vai perder – de novo.
Publicado
originalmente no Blog Informações em Foco
Publicado
originalmente no Blog O Escrevinhador
Nenhum comentário:
Postar um comentário
A Administração do Blog de Altaneira recomenda:
Leia a postagem antes de comentar;
É livre a manifestação do pensamento desde que não abuse ou desvirtuem os objetivos do Blog.