O Vice Governador Francisco Pinheiro é doutor em História Social pela Universidade Federal de Pernambuco. É especialista em História da Igreja na América Latina na PUC-SP. Foi presidente da Associação dos Docentes da UFC, vereador de Fortaleza e presidente do Diretório Municipal do Partido dos Trabalhadores por dois mandatos. Foi também Secretário da Regional IV na primeira gestão da prefeita Luizianne Lins.
Discreto ele é. Paciente também. Entre a discrição e a paciência, o professor Francisco Pinheiro foi acumulando forças dentro do governo Cid Gomes, especialmente junto ao governador, para chegar em 2010, no momento da definição sobre o palanque majoritário da aliança liderada por PSB e PT desde 2006, com chances de permanecer vice-governador.
Francisco Pinheiro evita ser uma peça decorativa dentro do governo. Sua agenda é movimentada, o que, inclusive, dificultou a própria entrevista que O POVO publicou esta semana, fruto de uma conversa que exigiu três momentos, em três dias, para ser finalizada.
Confira os trechos principais
O POVO: Qual a análise que o senhor faz do quadro político do momento, especialmente do ponto de vista do PT? Prof. Pinheiro: Há um processo de definição do quadro nacional que nos dá uma certa tranquilidade. Esta é, talvez, a eleição em que o PT, internamente, tenha tido mais tranquilidade, não há qualquer grande desentendimento em torno da indicação da Dilma (Rousseff, ex-ministra-chefe da Casa Civil), algo que, inclusive, muda um pouco a nossa característica. O PT sempre foi marcado por um debate muito forte em torno da escolha dos nossos candidatos e, em 2010, tivemos esse processo que, do meu ponto de vista, como militante há quase 25 anos, foi o mais tranquilo da história do partido.
O POVO: Quanto à escolha da ministra Dilma como candidata à sucessão de Lula, o senhor a considera boa? Prof. Pinheiro: Acho que, tecnicamente, é a pessoa que está no coração de tocar o governo (Lula). Ela teve papel importante na elaboração dos principais projetos. Desde quando era ministra das Minas e Energia a Dilma já demonstrou muita dedicação ao esforço de pensar o Brasil participando da discussão de uma das questões mais importantes e complexas do País que, sem dúvida, é o da matriz energética. Ela, hoje, conhece o governo por dentro, em termos da máquina pública, e também conhece o governo na sua exteriorização, por ser quem, dentro do governo, acompanha as obras públicas.
O POVO: A tranqüilidade interna nacional que o PT experimenta, conforme o senhor mesmo ressalta, não se registra quanto ao esforço de fechar a equação da aliança. Especialmente com o principal aliado, o PMDB, persistem problemas estaduais, inclusive no Ceará. Como será possível um entendimento final que seja feliz para todos os lados? Prof. Pinheiro: O PT já deliberou que a prioridade é a eleição nacional, o que implicará em termos de abrir mão de nossos interesses em alguns estados. É o que tem acontecido e não apenas em favor do PMDB. Por exemplo, no Piauí, que o PT governou durante oito anos, há um acordo quase fechado pelo qual o partido passa à vice e o PSB ocupa a cabeça de chapa. Dentro da visão de que fundamental é o projeto nacional.
O POVO: O Ceará, como fica dentro dessa equação? Prof. Pinheiro: Acho que as resoluções do partido deixam muito claro que nós, no Ceará, vamos repetir a aliança que construímos em 2006. A eleição de quatro anos atrás significou o início de um novo processo político no Ceará, conforme encara uma parcela significativa do PT. E, claro, esse processo político teve decorrências. Por exemplo, na política agrária tivemos uma mudança qualitativa de grande significado. Vou lançar apenas um dado: nós temos o maior processo de regularização fundiária do Brasil, onde pequenos produtores que detinham a posse da terra passaram a ter, também, a escritura. Na saúde, pra pegar outro exemplo, também nota-se uma mudança significativa. O Ceará é dividido em três macrorregiões de saúde, mas, apenas uma delas dispunha de hospital terciário, de alta complexidade, e era, justamente, Fortaleza. Pois neste governo estamos fechando as duas outras macrorregiões com a construção de hospitais terciários em Sobral, onde as obras começaram agora, e Juazeiro do Norte, que deve ser inaugurado ainda antes de junho. Na educação estamos construindo a maior rede de ensino profissionalizante do Brasil. Hoje já funcionam 60 e vamos terminar o governo com 127. O que eu quero mostrar? Que a continuidade da aliança não se dá apenas por interesses eleitorais, mas, também, em função de mudanças programáticas.
O POVO: Isso relativiza, até certo ponto, a discussão sobre a chapa majoritária a ser composta para 2010? Prof. Pinheiro: Não caberia a mim fazer.. Bom, há uma coisa que nós, militantes do PT, aprendemos a ter cuidado, adotando-se uma postura de coerência com o que partido definir. O PT está decidido até então, existe uma resolução clara nesse sentido, a manter a candidatura de vice-governador e lançar um nome para disputa do Senado.
O POVO: O PT tem sido um bom parceiro para o governador Cid Gomes? Prof. Pinheiro: Eu diria que houve alguns momentos de tensionamento, mas, olhando-se as resoluções do partido, todas elas apontaram para o apoio integral ao governo. Agora, claro, uma coisa é o que dizem as resoluções e outra a postura de figuras públicas que, às vezes, podem dizer algo que não corresponde ao que determina uma orientação partidária. É preciso ver isso.
O POVO: Ou seja, quem defende a ideia de candidatura própria do PT para o governo em 2010... Prof. Pinheiro: Está completamente fora da perspectiva real. A resolução do PT é no sentido claro de manter a aliança.
O POVO: O senhor vê alguma possibilidade de rompimento entre PSB e PT no Ceará, no horizonte que vislumbra para 2010? Prof. Pinheiro: Nenhum. Tanto pelo que o PSB representa para o projeto nacional como por tudo que disse antes em relação à ação programática do PT em termos estaduais.
O POVO: A saída recente da disputa presidencial do deputado Ciro Gomes, irmão do governador, facilita em quê os entendimentos políticos no Ceará? Aliás, na avaliação do senhor, facilita? Prof. Pinheiro: Primeiro, sempre deixei muito claro, no nosso ponto de vista, a pretensão do ex-governador Ciro Gomes era legítima. Essa é uma questão que diz respeito muito à vida interna do partido dele, o PSB, e o PT sempre exige dos partidos parceiros que respeitem suas decisões e internas, exatamente porque faz o mesmo nas situações contrárias.
O POVO: O senhor tem sido um bom vice? Prof. Pinheiro: (risos) Não poderia avaliar isso, seria uma pretensão minha. Se há algo que não faz parte da minha trajetória é ficar auto-avaliando, mas, de qualquer forma, diria que busquei cumprir aquilo que julgo que cabe a um vice fazer. Cumprir aquilo que é determinação, é acordo, a partir da aliança que fizemos, do que foi discutido.
O POVO: O senhor saberia recordar com detalhes a discussão que aconteceu, quatro anos atrás, que levou à sua indicação como candidato a vice na chapa liderada pelo então candidato Cid Gomes? Como se chegou ao seu nome? Prof. Pinheiro: Até então, eu não tinha qualquer relação, pessoal ou política, com o governador. O que lembro é que houve uma discussão interna e se decidiu que a Luizianne seria a pessoa a influenciar nisso, na escolha do vice. Eu, na época, era secretário da Regional IV e ela conversou comigo e perguntou: você topa? Disse que meu nome estava à disposição, que era militante do PT, se ele achava que eu tinha o perfil, então.. Minha corrente era contra, queria que eu fosse candidato a deputado estadual, e, ainda falando com ela, comuniquei que iria aos companheiros fazer uma consulta. Fizemos a discussão, encaminhei algumas coisas e, depois, para não influenciar nas definições, fui para a Espanha com minha família. Passei lá dez dias enquanto as coisas rolavam aqui. Estava meio cansado, era período de férias, tinha comprado uma passagem à prestação, eu e minha mulher, e fomos para Europa, Espanha e, também, Portugal. Quando voltei a situação estava encaminhada e fui comunicado de que o pessoal decidira pelo meu nome.
O POVO: Diante desse cenário, com a aliança caminhando para ser reafirmada, hoje com a novidade da aproximação com o Cid, seria de imaginar como tendência natural que o senhor fosse novamente o vice na chapa para o governo. No entanto, há uma disputa aberta no PT. Por que? Prof. Pinheiro: Porque o PT é o PT. É um partido que tem essas coisas que, na verdade, acabam sendo fundamentais para que ele permaneça vivo. O que nos dá vitalidade é isso, é o desejo de debater à exaustão todas as questões e, tomada uma decisão, todos acatarem democraticamente.
O POVO: O senhor gostaria de permanecer vice? A intenção inicial é essa? Prof. Pinheiro: Hum, hum. Nós estamos trabalhando, como todos os pré-candidatos à vice (Valdemir Catanho, ex-secretário de Governo da gestão Luizianne Lins, e Joaquim Cartaxo, ex-secretário estadual de Cidades), no sentido de permanecer.
O POVO: Não incomoda ao senhor, de qualquer forma.. Prof. Pinheiro: Não, é natural. São legítimas as solicitações dos companheiros de partido, o que digo pra eles é que devemos fazer o debate.
O POVO: Com relação à postura da prefeita Luizianne Lins, que tinha sido a principal ``madrinha`` da sua indicação em 2006, como o senhor analisa? Lembremos que ela, segundo consta, trabalha o nome de Valdemir Catanho, que se desincompatibilizou para uma possível indicação à vice. Prof. Pinheiro: Até agora não tivemos nenhuma conversa em que a Luizianne tenha sido que não sou o candidato dela. Nós, inclusive, temos algumas conversas marcadas e quero mesmo ouvi-la porque somos, acima de tudo, muito amigos.
O POVO: Politicamente, houve algum distanciamento? Prof. Pinheiro: Não, a relação entre nós continua muito boa. A gente se telefona, costumo consultá-la sobre algumas coisas e se mais não fazemos é porque temos muitas atribuições. Ela tem muitas responsabilidades e eu, apesar de ter um cargo de vice, tenho muito trabalho.
O POVO: A aliança política que governa o Ceará, que em 2006 tinha PT, PSB, PCdoB, PMDB e outros partidos menores, mas excluía o PSDB, passou, no governo, a ser integrada também pelos tucanos. Como o senhor vê a possibilidade de para 2010 o palanque ter, também, o PSDB? Prof. Pinheiro: Não creio que haja uma formalização de aliança com o PSDB.
O POVO: Se isso acontecesse dificultaria a permanência do PT na aliança? Prof. Pinheiro: Nós temos resoluções que têm dito isso muito claramente. Agora, não acredito na possibilidade porque o governador Cid Gomes fez uma opção programática, não tenho nada contra as pessoas que fazem o PSDB, mas acho que temos programas um tanto quanto diversos. É só ver o programa que o PSDB executou no Ceará e este que temos executado aqui.
O POVO: Recentemente, porém, o senhor fez declarações elogiosas ao senador, e ex-governador, Tasso Jereissati. Houve algum constrangimento, alguma cobrança dentro do PT? Prof. Pinheiro: Não, não foi nem um elogio. A questão é que a forma como saiu na imprensa, faz parte da picardia... O que eu disse foi algo muito simples, que na democracia a oposição é muito importante, não existe democracia sem ela. Foi durante um evento no qual citei o Heitor (Férrer, deputado estadual do PDT e uma das poucas vozes de oposição ao governo Cid na Assembleia), que estava presente, e parabenizei, também, o senador (Tasso Jereissati) que tem feito oposição ao nosso governo. Ai, disse que achava importante, na democracia, ter oposição. No entanto, em alguns blogs, só destacaram a parte em que eu elogiava, como se eu tivesse feito uma homenagem ao senador Tasso Jereissati.
O POVO: Houve cobranças internas? Prof. Pinheiro: Não, houve alguns emails, de gente que tentou fazer um certo rebuliço, mas como eu não tenho rabo de palha, não tenho medo do que declaro, tenho sempre cuidado ao falar, não repercutiu.
Por Guálter George do Jornal O Povo
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